Temos (mesmo) de fazer (mais) alguma coisa

O texto desta edição retrata a revolta de um amigo autóctone, que, num belo dia de cacimbo, me bateu à porta, dizendo: “Porra tens de fazer mais alguma coisa, já não aguento esta merda”.

Por William Tonet

Referia-se ao país e ao acantonamento a que estava votado. Sem poder abrir a empresa por mais de duas horas, partilhou a frustração de não poder importar, tendo dinheiro nos bancos comerciais, não o tem livre, por o BNA não os transformar em moeda de transacção comercial, sem cunha partidocrata.

“O camarada tem cartão do partido”, perguntou-me a gerente de um banco, ao que acenei negativamente. Porra William, disse-me ela, acrescentando: “Seria mais fácil se fosse membro do MPLA”.

O homem não queria acreditar, na partidarização do Estado, mas virando ao lado, vê a vergonhosa actuação da TPA, na transmissão do VII (17, 18, 19, 20.08) congresso do MPLA, poucas razões tinha para condenar a funcionária bancária. Estamos no fim da picada e não há voltas a dar, num território sem referência de lideranças democráticas acutilantes, capazes de darem um basta a anarquia institucional.

Assistir ao papel degradante, no congresso de um partido político, dos presidentes dos tribunais, Supremo e Constitucional, da Procuradoria-Geral da República, dos juízes, dos chefes de todos os ramos do Estado Maior das Forças Armadas, dos directores do SIC (Serviços de Investigação Criminal) e dos Serviços Secretos do Estado, curvarem-se ante o líder do MPLA, denota – no mínimo – subserviência e falta de independência dos órgãos de soberania.

É isso que alimenta a frustração do meu amigo, forçado a despedir trabalhadores e não saber quando declarar falência, agora com a aprovação do novo pacote da comunicação social, colonialmente elaborada pelo MPLA, para impedir a publicação e denúncias sobre os roubos institucionais, por parte do que resta da imprensa livre. Cobardemente, os dirigentes do partido no poder, querem nomear jornalistas por decreto e colocar à frente de órgãos reguladores agentes que estiveram envolvidos nos assassinatos do 27 de Maio de 1977, como Wadjimbi de Carvalho. Ora, quem tem a experiência de assassinatos, não lhe custa enterrar os jornalistas que o regime pretender, hoje.

Por tudo isso, a face amarrotada do meu amigo, carrega as rugas da frustração de milhares de angolanos, despidos até de esperança, igualmente fartos da maldade governativa e incompetência da gestão da coisa pública.

É importante rememorar o que disse no dia 18 de Dezembro de 2015, o presidente José Eduardo dos Santos, na mensagem de ano novo: “Povo angolano acordou tarde” no concernente à diversificação da economia. Não! Quem acordou tarde, foi o Titular do Poder Executivo, pois constatar isso 40 anos depois é doloso, por a diversificação ser inerente a qualquer gestão e organização, que não pode ficar refém de uma riqueza só.

Seria bom, o líder assumir os erros da sua governação e não distribuir culpas.

Os cristãos dizem não poder a culpa morrer solteira, principalmente, quando alguém dirige o país, desde Setembro de 1979.

A história não mente, quem mente é quem conta estórias. Angola, enquanto província ultramarina de Portugal, até 1973, era auto-suficiente, face à diversificação da economia: 2º produtor mundial de Café Arábico; 1º produtor mundial de Banana, através da província de Benguela, nos municípios da Ganda, Cubal, Cavaco e Tchongoroy. Só nesta região produzia-se tanta banana que alimentou, designadamente a Bélgica, Espanha e a Metrópole (Portugal) para além das colónias da época Cabo-Verde, Moçambique, Guiné-Bissau e Sã Tomé e Príncipe; 1º produtor africano de Arroz através das regiões do (Luso) Moxico, Cacolo Manaquimbundo na Lunda Sul, Kanzar no Nordeste Lunda Norte e Bié.

Ainda no Leste de Angola, nas localidades de Luaco, Malude e Kossa, a “Diamang” (Companhia de Diamantes de Angola) tinha mais 80 mil cabeças de gado, desde bovino, suíno, lanígero e caprino, com uma abundante produção de ovos, leite, queijo e manteiga.

Na região da Baixa de Kassangue, havia a maior zona de produção de algodão, com a fábrica da Cotonang, que transformava o algodão, para além de produzir, óleo de soja, sabão e bagaço.

Na região de Moçamedes (actual Namibe) nas localidades do Tombwa, Lucira e Bentiaba, havia grandes extensões de salga de peixe onde se produzia, também enormes quantidades de “farinha de peixe”, exportada para a China e o Japão.

Face aos exemplos acima, achamos ter havido um equivoco ou alguém não forneceu os dados ao Presidente da República, quanto aos trilhos da diversificação herdados, pelo regime, provando não ter sido o povo a acordar tarde.

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One Thought to “Temos (mesmo) de fazer (mais) alguma coisa”

  1. Anonimus

    Caro William Tonet, no final da sua dissertação o amigo (desculpa tratá-lo por amigo), errou. Porquê? A menos que seja verdade a afirmação de que o chefe seja santomense, neste caso seria necessário fornecer toda a informação ao chefe. Porque qualquer angolano sabe que antes da independência, já havia diversificação da economia em Angola.
    Pergunto… Será que o chefe endeusado sabe que até 1974 o Huambo era o celeiro do milho que era consumido no território e também exportado, havendo sempre stock dentro do território? Será que o chefe endeusado, sabe que Angola produzia açúcar em quantidade para alimentar o território e havia stock para exportação? Será que o chefe endeusado sabe que o peixe pescado nos mares de Angola, chegavam o mais recôndito dos lugares de Angola, fresco e em condições para consumo ao invés do congelado?
    São apenas alguns exemplos, à par dos citados pelo caro Wiilliam.
    Que Deus abençoe a nossa Angola e conceda perdão aos que maltratam o seu povo que se tornou medroso e delator.

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