O activista Rafael Marques acusou hoje o Governo e o Presidente angolano (cargo para que não foi eleito e que ocupa por inerência de ser Presidente do MPLA) de “terrorismo de Estado” e de atentarem contra a soberania do povo, considerando que a repressão não resolve a crise económico-social em Angola.
Questionado sobre as últimas detenções de cidadãos acusados de terrorismo e outros crimes, Rafael Marques afirma que “os maiores terroristas em Angola são aqueles que estão no Governo, nos transportes, em cargos ministeriais que são os responsáveis pela actual crise socioeconómica, começando pelo próprio Presidente da República [general João Lourenço]. Isto é que é terrorismo do Estado, desvirtuar a nação, destratar da soberania do povo no país”.
Em entrevista à Lusa, Rafael Marques disse que o caso das últimas detenções em Angola “é sintomático de que o Presidente da República quer resolver a crise económica e social do país com repressão”.
“Mas, é preciso entender que as balas não alimentarão a população”, acrescentou.
Sobre as consequências dos tumultos de finais de Julho, na sequência de greve dos taxistas, que resultaram em pelo menos 30 mortos e mais de 200 feridos, Rafael Marques considerou que a postura das autoridades agrava ainda mais o ódio da população.
O Governo “pode matar centenas ou milhares de cidadãos, só vai agravar o fosso e o ódio entre a população e o Governo, alias, nesse caso, especificamente, o Presidente da República”, notou o activista.
“Porque até agora não ouvimos falar em detenção de agentes da Polícia que disparou indiscriminadamente, de forma cobarde, contra cidadãos que corriam na direcção contrária que foram atingidos pelas costas, isto é crime e não ouvimos falar disso”, criticou.
De acordo com o activista, o Governo de Angola (igualmente dirigido pelo general João Lourenço) precisa de medidas sérias, de reformas, de diminuir o despesismo público e “acabar com a promoção da incompetência e da roubalheira”.
“Há fome a empurrar cada vez mais pessoas à procura de lixo para sobreviverem”, apontou, mas também “é preciso reconhecer que o Presidente (…) já deixou de governar (…), o que tem aqui é a manutenção do poder e isso é muito triste”.
A maior parte dos líderes das associações dos taxistas, cooperativas de taxistas, associações de moto taxistas e de lotadores foram detidos nas últimas semanas pelo Serviço de Investigação Criminal (SIC) por suspeita dos crimes de associação criminosa, incitação à violência, atentado contra a segurança nos transportes e terrorismo, “consubstanciados em fortes indícios do seu envolvimento na promoção dos actos de vandalismo e arruaça contra bens e serviços públicos e privados”, protagonizados entre 28 e 30 de Julho.
Dois cidadãos russos e mais dois angolanos, incluindo um jornalista, foram ainda detidos em Luanda, sob suspeita dos crimes de associação criminosa, falsificação de documentos, terrorismo e financiamento ao terrorismo.
Para o também director do portal de notícias Makaangola, só unidos os angolanos conseguirão encontrar soluções pacíficas e efectivas para “remover os indivíduos que estão a levar Angola para o abismo”, lamentando a falta de uma defesa clara, sobretudo no seio da classe dos taxistas, após as últimas detenções.
Ainda segundo Rafael Marques, existem inclusive pessoas dentro do MPLA (partido no poder há 50 anos) que entendem ser necessário “haver mudanças, gerar pressão para (…) que haja uma causa comum que permita os angolanos juntarem-se não para fazer confusão, mas para defenderem a sua soberania”. E recordou que a soberania, à luz da Constituição angolana, reside no povo.
“Essas prisões são para fragmentar mais as pessoas, mas isso não deve impor o medo e é extraordinário que, agora, os taxistas não venham em defesa dos seus líderes, porque falta liderança. Por isso é que neste país elimina-se a inteligência para que a mediocridade esteja sempre em cima, nas instituições do poder, na sociedade civil, na oposição e a mediocridade comande a manutenção do povo no obscurantismo”, concluiu.