Em 27 de Junho de 2025, a República Democrática do Congo (RDC) e o Ruanda assinaram um acordo de paz em Washington, D.C., saudado por muitos como o início de uma era mais estável na África Central. Após décadas de conflito que devastaram comunidades e prejudicaram o comércio regional, este acordo promete interromper o apoio transfronteiriço a grupos armados e lançar as bases para uma integração económica.
Por Christopher Burke (*)
Por trás das declarações comemorativas existe uma realidade muito clara. O acordo não trata apenas de paz, mas de quem controlará e lucrará com a imensa riqueza mineral do leste do Congo. Os Estados Unidos, que intermediaram o acordo com apoio do Catar, não esconderam sua ambição de garantir acesso confiável a minerais críticos — recursos cada vez mais vitais para as indústrias globais em transição para energia limpa.
Implicações para Angola
O Corredor do Lobito está no centro dessa estratégia. Apoiado pelos EUA, o projecto ferroviário e portuário canalizará cobalto, cobre e lítio das minas congolesas, passando pela Zâmbia até a costa atlântica de Angola. O corredor tem um potencial enorme para Angola: modernizar a infra-estrutura, atrair investimentos e posicionar o país como uma rota de exportação fundamental para minerais estratégicos. Isso também levanta questões cruciais sobre soberania, transparência e quem, em última análise, se beneficiará quando potências externas buscam seus próprios interesses.
Garantir que projectos de infra-estrutura dessa escala incorporem padrões claros de Governança Ambiental, Social e Corporativa (ESG) é essencial para Angola. Ao exigir compromissos ESG fortes, Angola pode ajudar a garantir que os investimentos estrangeiros apoiem o desenvolvimento sustentável, respeitem as comunidades e protejam o meio ambiente para as gerações futuras.
Era transnacional
Movida por objectivos económicos e de segurança, a abordagem de Washington mudou decisivamente da assistência ao desenvolvimento tradicional para parcerias transnacionais. No início deste ano, o governo dos EUA encerrou a maioria das operações da USAID e redireccionou recursos para acordos que servem às prioridades americanas. O acordo entre Congo e Ruanda reflecte essa mudança: minerais e logística em troca de garantias de paz e apoio diplomático.
A China continua a expandir sua presença no continente por meio de empréstimos para infra-estrutura e investimentos em mineração. Empresas chinesas na RDC construíram estradas, financiaram instalações de processamento e garantiram contratos de longo prazo com mínimas exigências políticas. Embora esses projectos tragam riscos associados a dívidas e impactos ambientais, Pequim tem demonstrado uma intenção estratégica consistente.
Para evitar repetir padrões passados de extracção sem desenvolvimento, Angola deve garantir que quaisquer novos acordos ou parcerias incluam obrigações ESG aplicáveis. Esses requisitos ajudarão a alinhar o investimento estrangeiro aos planos de desenvolvimento nacional e proteger os interesses locais.
Lições para a negociação
A mensagem é clara para Angola e outros países africanos. Quer estejam negociando com Washington, Pequim ou outros parceiros emergentes, os governos africanos devem abordar as negociações com clareza e cautela. Nenhum actor externo é puramente benevolente. Cada um busca seus próprios interesses, com preocupação limitada para as comunidades locais.
O acordo no Congo sublinha a necessidade de instituições fortes para prevenir a corrupção, garantir contratos justos e priorizar a agregação de valor local em vez da simples exportação de minerais brutos. Para Angola, isso é uma oportunidade de exigir condições que gerem empregos, desenvolvam habilidades e fortaleçam a soberania, ao invés de servir apenas como ponto de trânsito nas cadeias de suprimentos alheias. Integrar princípios ESG nas negociações contratuais pode fortalecer salvaguardas institucionais, promover a responsabilização e reduzir os riscos de corrupção, além de impulsionar o processamento local e o desenvolvimento das cadeias de valor.
O mundo multipolar de hoje já não se define por uma única rivalidade. Angola e seus pares podem aproveitar a concorrência entre Estados Unidos, China, União Europeia e Estados do Golfo para obter melhores resultados. Estruturas regionais como a Área de Livre Comércio Continental Africana (AfCFTA) oferecem poder de negociação colectiva; no entanto, o sucesso exige transparência interna, vigilância contra a captura por elites e uma visão clara de como a riqueza mineral pode servir ao desenvolvimento nacional.
O factor BRICS
O grupo BRICS, originalmente formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, expandiu-se recentemente para incluir novos estados-membros e está promovendo bancos de desenvolvimento alternativos e sistemas de pagamento projectados para reduzir a dependência do dólar norte-americano. Para os países africanos, o BRICS oferece acesso a capital, mercados e tecnologia com menos condições políticas explícitas do que muitos credores ocidentais.
Embora a flexibilidade do financiamento do BRICS seja atraente, Angola deve ser proactiva ao estabelecer expectativas claras. É essencial incorporar padrões ESG sólidos para evitar que projectos causem danos ambientais, deslocamento de comunidades ou enfraqueçam a governança local. Angola está bem posicionada para ampliar suas parcerias e reduzir a dependência de qualquer potência externa única. Mas a diversificação por si só não basta. É necessário negociar com cuidado para garantir que os acordos com membros do BRICS se alinhem à estratégia de desenvolvimento de longo prazo de Angola e não substituam uma forma de dependência por outra.
Um maior engajamento com os países do BRICS também destaca a importância de manter altos padrões de transparência, responsabilidade e benefício local. Embora o BRICS enfatize os princípios de não-interferência e cooperação Sul–Sul, Angola precisa de instituições robustas e estratégias bem definidas para transformar os laços diplomáticos em resultados de desenvolvimento sustentável. Isso inclui fazer cumprir requisitos de conteúdo local, apoiar a transferência de tecnologia e garantir uma divisão justa das receitas em todos os acordos minerais e de infra-estrutura, independentemente do parceiro estrangeiro envolvido.
Um momento para acção estratégica
O acordo entre a RDC e o Ruanda demonstrou o que é possível quando rivais regionais se sentam à mesa de negociações e revela a rapidez com que potências estrangeiras podem remodelar economias locais para atender a ambições globais. A lição para Angola não é apenas celebrar investimentos em infra-estrutura, mas construir a capacidade de negociar, monitorar e fazer cumprir acordos que protejam os interesses de longo prazo do país.
O desenvolvimento verdadeiro exige a integração de princípios ESG para garantir transparência, inclusão social e protecção ambiental. Um desenvolvimento genuinamente inclusivo e sustentável exige 1) coragem para fazer perguntas difíceis, 2) vontade política e disciplina para manter a supervisão e 3) determinação suficiente para garantir que a posição estratégica de Angola beneficie em primeiro lugar seu próprio povo.