AGRADAR A GREGOS, TROIANOS E… ANGOLANOS

Em Angola não há Dia Mundial da Liberdade de Imprensa que nos valha. E não há porque aos jornalistas restam duas opções: serem domados ou serem… domados. Se criticamos o MPLA os camaradas acusam-nos de sermos da UNITA. Se criticamos a UNITA, os maninhos acusam-nos de sermos do MPLA.

Por Norberto Hossi

Na verdade todos os dias vemos toda a espécie de altos dignitários do regime, quiçá até mesmo o Presidente João Lourenço, a dizer que são a favor do direito universal à liberdade de expressão. Vemos igual comportamento por parte da UNITA.

Se calhar, com a hipocrisia típica e atávica que caracteriza os donos da verdade em Angola (donos que militam no MPLA e na UNITA), até veremos alguns dos carrascos a recordar que os jornalistas têm sido assassinados, mutilados, detidos, despedidos e por aí fora por exercerem, em consciência, a liberdade de expressão à qual, em teoria, têm direito.

Aliás, estamos mais uma vez à espera de ver muitos dos malandros do regime político angolano (MPLA, UNITA & Cª.) que amordaçam os jornalistas aparecerem na ribalta com a bandeira da liberdade de expressão. Se calhar até João Lourenço e Adalberto da Costa Júnior serão vistos na ribalta com a bandeira desta causa.

E se até agora o principal barómetro da liberdade de Imprensa era o número de jornalistas mortos no cumprimento do dever, hoje junta-se-lhe uma outra variante para a qual Angola dá um notório e inédito contributo: os jornalistas mercadoria.

E até veremos alguns dos algozes da liberdade de expressão (desde os donos dos jornalistas aos donos dos donos dos jornalistas) citar o artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos: “Toda pessoa tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras”.

Há alguns anos, o então secretário-geral da ONU defendeu uma tese que se tornou suicida no caso angolano. Kofi Annan disse que os jornalistas “deveriam ser agentes da mudança”.

Eles tentaram, eles tentam, eles continuarão a tentar, o que aliás sempre fizerem, mudar a sociedade para melhor. Acontece que o seu conceito de sociedade melhor não é igual ao dos donos do reino (José Eduardo dos Santos ontem, João Lourenço hoje), ou dos que pretendem vir a ser os donos. E a resposta não se faz esperar: Jornalista bom é jornalista no desempregado ou amputado da coluna vertebral e, por isso, tapete do Poder.

Angola é o país africano de língua portuguesa com pior classificação no índice de liberdade de imprensa da Freedom House, enquanto Cabo Verde é líder na África Subsariana, seguido de São Tomé e Príncipe.

Quando João Lourenço tomou conta do reino, o relatório “Liberdade de Imprensa 2017”, daquela organização com sede em Washington, nos EUA, mostrava que entre os 50 países e territórios investigados no continente, Angola ficou na 37ª posição, com 73 pontos numa escala de 0 (melhor) a 100 (pior), e no grupo dos países não-livres em matéria de liberdade de expressão e de imprensa. A nível mundial, Angola ficou na 159ª posição, num universo de 199 países e territórios analisados.

Por seu turno, Moçambique e Guiné-Bissau estão no grupo dos países parcialmente livres. O país do Índico ocupa a 13ª posição no continente e a 96ª a nível mundial, com 48 pontos na escala de 0 (melhor) a 100 (pior). A Guiné-Bissau surge mais abaixo no índice, no lugar 28 em África e 128 a nível global, com uma pontuação de 59.

Cabo Verde e São Tomé e Príncipe surgem nos dois primeiros lugares do índice de África, respectivamente, e ambos integram o grupo de países livres, tanto a nível da liberdade de expressão como de imprensa. Com 27 pontos na mesma escala, Cabo Verde ocupa a 48ª posição a nível mundial. São Tomé e Príncipe, que é segundo em África, situa-se no 53º lugar a nível global, e com 28 pontos.

A seguir aos dois arquipélagos lusófonos, nos primeiros cinco lugares do continente africano surgem as ilhas Maurícias, Namíbia e Gana. No fim da lista, estão Gâmbia, Guiné-Equatorial e Eritreia.

A Freedom House revelou então que nos 50 países e territórios da África Subsariana, num total de mil milhões de pessoas, apenas seis por cento vivem em países considerados livres, tanto quanto à liberdade de expressão como de imprensa.

Mais de metade, 54 por cento, vive em países parcialmente livres e 40 por cento em Estados ou territórios não-livres. Os investigadores exemplificam que em cada 100 africanos ao sul do Sahara, apenas um desfruta da liberdade de imprensa.

Com o título “Liberdade de imprensa sofre com líderes que se agarram ao poder”, o relatório da Freedom House considera que a maioria dos países da região registou um declínio da liberdade de imprensa em 2017, devido à agitação política, supressão ou adiamento de eleições e uma maior repressão por parte dos líderes políticos.

Em termos gerais, “somente 13 por cento da população mundial gozava de uma imprensa livre, ou seja de um ambiente em que a imprensa faz uma forte cobertura dos factos, a segurança é garantida, a influência do Estado no sector é mínima e os meios de comunicação não estão sujeitos a onerosas pressões jurídicas e económicas”.

Ainda de acordo com o relatório daquela organização, 42 por cento da população mundial tem uma imprensa parcialmente livre, enquanto 45 por cento vive em países onde a imprensa não é livre.

No dia 19 de Março de 2015 o então Ministro da Justiça de Angola, Rui Jorge Carneiro Mangueira, afirmou perante o Conselho dos Direitos Humanos das Nações Unidas que o seu Governo considerava a liberdade de expressão como um direito fundamental desde que não viole a reputação do cidadão.

Angola tinha sido confrontada perante o Conselho de Direitos Humanos da ONU sobre a liberdade de expressão, de manifestação e restrições a activistas.

Angola “considera que a liberdade de expressão é um direito fundamental (…) desde que esta não viole o respeito à honra, ao bom nome, à reputação, à imagem e à vida privada do cidadão”, disse Rui Mangueira.

De acordo com o ministro, esta restrição pretende proteger os cidadãos lesados e não deve ser interpretada como uma limitação da liberdade de expressão.

“A limitação prevista na lei visa somente proteger o interesse dos cidadãos ofendidos (…) daí que não se pode interpretar como intenção do Governo violar ou restringir o direito à liberdade de expressão”, argumentou.

Em declarações à imprensa, o governante indicou que a liberdade de expressão e o direito de manifestação e de reunião são cumpridos no âmbito da legislação.

O ministro disse ainda que o recurso ao sistema judicial acontece quando situações ultrapassam as leis. “O sistema judicial é chamado a tratar de todas estas questões sempre que elas ultrapassam as leis (…) sempre serão tratadas pelo sistema judicial, que é um sistema independente e credível”.

Segundo Rui Mangueira, sempre que alguém é detido, há uma instrução preparatória e uma instrução contraditória. Caso se apure a responsabilidade do autor da ofensa, o caso é levado a tribunal.

“A calúnia e a difamação estão tipificadas na lei e os magistrados judiciais devem apenas obediência à lei e nós sujeitamos todas estas questões ao impulso das partes lesadas”, disse o então ministro de Justiça angolano sem dar mais pormenores.

O governante reafirmou ainda o compromisso do Governo na cooperação com os mecanismos Internacionais dos direitos humanos e indicou que Angola estava a analisar a parceria sobre a Iniciativa de Transparência na Indústria Extractiva (EITI) e daria a conhecer aos membros das Nações Unidas a sua posição logo que esteja concluída.

Nesse mesmo dia, 19 de Março de 2015, a Federação Internacional das Ligas dos Direitos do Homem (FIDH) denunciou que activistas dos direitos humanos e jornalistas angolanos estavam a sofrer uma pressão crescente por parte do regime do Presidente José Eduardo dos Santos.

Visivelmente a FIDH não percebe nada da matéria e ainda não compreendeu que, afinal, o regime angolano (seja o de Eduardo dos Santos ou de João Lourenço) é uma das democracias mais avançadas do mundo, rivalizando essencialmente com a Coreia do Norte.

Aliás, todos sabemos – e não é um exclusivo do regime angolano – um bom jornalista é um jornalista… morto ou, em alternativa, comprado.

E então os dos órgãos do regime? Com esses é diferente. Desde logo porque não são jornalistas mas, apenas isso, sipaios e mercenários ao serviço de tudo aquilo que os dólares compram. Ontem diziam que os jacarés eram vegetarianos, hoje garantem que não temos jacarés.

“Esta situação deve cessar e as autoridades angolanas devem aceitar as vozes dissidentes” declarou a FIDH que, com a associação angolana Justiça, Paz e Democracia (AJPD), publicou um relatório que acusava o regime angolano de assédio judicial e administrativo, intimidações e ameaças.

Nesta matéria, todos os que se atrevem a mostrar que pensam de forma diferente da formatada pelos cânones da educação patriótica sabem que – como manda a lei suprema do MPLA (que se sobrepõe à Constituição) – todos são culpados até prova em contrário. Prova essa que nunca existe.

Dizer o que se pensa ser a verdade é a melhor qualidade dos Jornalistas. Em Angola esta tese tem algumas nuances. Para o MPLA, a verdade só é mesmo verdade se for a sua verdade. Já para a UNITA, a verdade só é mesmo verdade se for a… sua verdade…

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