O Centro Agro-florestal da Quinta Portugal, projecto da cooperação portuguesa em Timor-Leste, está a ajudar a pesquisar e a desenvolver no país a produção de café, considerado um dos melhores do mundo, orgânico e resistente às alterações climáticas. Em Angola a produção de café deve crescer anualmente 1,5% até 2025 e 90% do total é feita por pequenos produtores familiares.
Na Quinta Portugal foram plantados cerca de cinco hectares de pés de café, três de arábica e dois de robusta, que são utilizadas não com o objectivo de vender café mas para produzir novas plantas, treinar a equipa em processamentos de café e fazer experiências em processamentos.
“Nos últimos cinco anos temo-nos focado na produção de café de especialidade, cafés de altíssima qualidade, mais valorizados no mercado, e o trabalho que fazemos é para transferir conhecimento para os produtores. Todas as técnicas que testamos, passamos para os agricultores” timorenses, disse à Lusa o coordenador do projecto, o agrónomo Hugo Trindade.
O objectivo do Centro Agro-florestal da Quinta Portugal “não é fazer receitas ou lucro da produção do café” mas sim passar aos agricultores timorenses “o resultado do trabalho de pesquisa e desenvolvimento”, sublinhou o coordenador do projecto, agrónomo especializado em culturas tropicais.
Segundo dados da Associação de Café de Timor-Leste (ACT), entre 25% e 30% da população timorense depende economicamente do café, o primeiro produto agrícola exportado e o mais importante a seguir ao petróleo e ao gás.
“Hoje, fruto de projectos como o nosso, já existem agricultores, pequenos agricultores, que implementam práticas melhoradas e que se assemelham às fazendas do passado, mas na generalidade ainda têm fracos recursos técnicos e conhecimentos e isso faz com que seja difícil fazer a mudança, que se espera possa acontecer”, salientou o agrónomo.
Questionado sobre a razão pela qual o café de Timor-Leste é considerado um dos melhores do mundo, o agrónomo explicou que é um dos “mais sustentáveis”.
“Muitos países produtores de café estão a começar a ter problemas com as alterações climáticas e desmatações para fazer a monocultura do café. Em Timor-Leste isso não acontece, primeiro fruto do clima que o país tem, depois fruto das características do solo, são solos de montanha, pouco férteis, e a cultura do café só pode crescer aqui debaixo de um coberto florestal”, disse.
“Então o café cresce em sistemas agro-florestais que garantem a sustentabilidade, a biodiversidade, a conservação da água e dos solos e nesse sentido o café de Timor é o maior do mundo”, salientou Hugo Trindade.
As características de alguns locais, de altitudes elevadas, também do híbrido de Timor, que é a variedade que domina as plantações, faz com que seja um café diferente, raro e de muita alta qualidade”, disse.
O coordenador do projecto de cooperação portuguesa afirmou que “muito do café que se produz já é de altíssima qualidade”, mas que ainda há práticas, que “fazem com que o café seja um mero café comercial”.
Sobre a desmotivação dos timorenses para o cultivo do café, o agrónomo explicou estar relacionada com as “baixas produções, a falta de investimento, de acompanhamento e de implementação real das políticas e planos”.
Tudo aquilo faz com que o “agricultor não veja a produção de café como uma cultura que mereça investimento e traga retorno”, disse.
Hugo Trindade explicou que a produção de café em Timor-Leste sempre foi baseada em pequenas plantações e que muitas foram criadas por “imposição das administrações” portuguesas, mas que as pessoas não eram capacitadas para o fazer.
Esta foi uma questão também abordada pelo vice-presidente da Associação de Café de Timor-Leste, Afonso de Oliveira, que em entrevista recente á Lusa lamentou a falta de investimento do Governo no sector.
O OURO NEGRO DE ANGOLA
A produção de café angolano deve crescer anualmente 1,5% até 2025 e 90% do total é feita por pequenos produtores familiares. Para nos ajudar a fazer o que, há 50 anos, faziam os portugueses, a União Europeia tem disponibilizado milhões de euros para reforçar o desenvolvimento da cadeia de valor do café.
Para o alcance deste crescimento, todos os actores do processo necessitam ter uma “visão estratégica comum”, porque Angola “tem argumentos para produzir cadeia de valor neste segmento”.
Sobre o assunto foi elaborado um estudo desenvolvido pela Aliança Europeia sobre Conhecimento Agrícola para o Desenvolvimento (Agrinatura) em colaboração com o Governo do MPLA e financiado pela Unidade de Segurança Alimentar, Nutrição e Desenvolvimento Rural da União Europeia.
Realizado em Setembro de 2019, nas províncias do Uíge, Cuanza Norte, Cuanza Sul e Huambo, a análise funcional do estudo refere que dos 24.785 produtores do café, 23.345 são pequenos agricultores familiares e os demais são produtores comerciais.
Segundo Bernardo Piazzardi, investigador da Agrinatura que apresentou a componente funcional do estudo, Angola conta com 15 unidades de descasque de café, localizadas nas unidades produtoras, mas apenas 50% das suas capacidades estão em funcionamento.
As quatro províncias angolanas, que constituíram objecto de estudo, dado o volume da sua produção cafeícola, compreendem uma área total de 79.721 hectares, mas, observou o especialista, Angola colhe apenas 38.878 hectares de café.
Para Bernardo Piazzardi, problemas de financiamento e baixo retorno económico contribuem para que Angola explore apenas 50% do seu potencial do café. As áreas de observação representam 75% de plantas antigas e o restante plantas novas, defendendo aposta na inovação.
Entre os principais constrangimentos na cadeia de valor do café angolano, no domínio da produção o estudo aponta a existência de plantas antigas, o sistema manual de produção, falta de assistência financeira, entre outras.
Matéria-prima de baixa qualidade, fragilidade dos fornecedores, infra-estruturas e serviços em condições deficientes constituem também alguns dos constrangimentos no domínio da transformação.
Para o então secretário de Estado da Agricultura e Pecuária angolano, José Carlos Bettencourt, os resultados preliminares do estudo, financiado pela União Europeia, “estão em linha com as expectativas das autoridades” do país, admitindo a necessidade de “maior apoio” aos pequenos agricultores.
União Europeia financia a (in)competência
Entretanto, a União Europeia (UE) disponibilizou 12 milhões de euros para reforçar o Programa de Apoio à Produção, Diversificação das Exportações e Substituição das Importações (Prodesi) angolano, principalmente para o desenvolvimento da cadeia de valor do café.
A informação foi transmitida na altura, em Luanda, pelo embaixador da União Europeia em Angola, Tomas Ulicny, na abertura de um ‘workshop’ de apresentação e validação dos resultados preliminares sobre o estudo da cadeia de valor do café em Angola.
Ao longo de cinco anos da sua implementação, o estudo pretende “melhorar o crescimento” e o “contributo” da cadeia de valor do café na diversificação da economia angolana, através do “reforço da capacidade” de instituições como o Instituto Nacional do Café de Angola e a Agência de Investimento Privado e Promoção das Exportações de Angola.
Enquanto província ultramarina de Portugal, até 1973, Angola era auto-suficiente, face à diversificação da economia. Não tenhamos receio de aprender com quem sabe mais e fez melhor, muito melhor. Só assim poderemos ensinar a quem sabe menos.
Angola era o segundo produtor mundial de café Arábico; primeiro produtor mundial de bananas, através da província de Benguela, nos municípios da Ganda, Cubal, Cavaco e Tchongoroy. Só nesta região produzia-se tanta banana que alimentou, designadamente a Bélgica, Espanha e a Metrópole (Portugal) para além das colónias da época Cabo-Verde, Moçambique, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe.
Era igualmente o primeiro produtor africano de arroz através das regiões do (Luso) Moxico, Cacolo Manaquimbundo na Lunda Sul, Kanzar no Nordeste Lunda Norte e Bié.
Ainda no Leste, nas localidades de Luaco, Malude e Kossa, a “Diamang” (Companhia de Diamantes de Angola) tinha mais 80 mil cabeças de gado, desde bovino, suíno, lanígero e caprino, com uma abundante produção de ovos, leite, queijo e manteiga.
Na região da Baixa de Cassangue, havia a maior zona de produção de algodão, com a fábrica da Cotonang, que transformava o algodão, para além de produzir, óleo de soja, sabão e bagaço.
Na região de Moçâmedes, nas localidades do Tombwa, Lucira e Bentiaba, havia grandes extensões de salga de peixe onde se produzia, também enormes quantidades de “farinha de peixe”, exportada para a China e o Japão.
Em 2019, o ministro da Agricultura e Florestas, António de Assis, procedeu no município do Mungo (Huambo), ao lançamento do Programa de Revitalização da Cultura do Café Arábica no sector familiar, com o objectivo de contribuir para as estratégias de combate à pobreza e, ao mesmo tempo, garantir a segurança e a qualidade alimentar.
Decorrido na aldeia de Beteleme, a 157 quilómetros da cidade do Huambo, o acto, testemunhado pela então governadora do planalto central, Joana Lina, ficou marcado pela distribuição de 15 mil mudas de café arábica a 30 famílias camponesas desta localidade, que possui três mil moradores que têm a agricultura como fonte de sustento. Quanto não vale o simbolismo!
O programa iria beneficiar, numa primeira fase, os municípios do Bailundo, Chicala-Cholohanga, Londuimbali, Huambo e Mungo, com a selecção de 30 famílias camponesas de cada uma das localidades, num total de 150, com vista a evitar a monocultura e a criar sustentabilidade dos sistemas de produção no país.
Na época colonial, estes municípios eram capazes de produzir 1.600 toneladas de café comercial, cultivadas numa extensão de cinco mil hectares. Desde então, sob a égide sempre do mesmo partido, o MPLA, e ao fim de 49 anos de governação e, sobretudo, de 22 anos de paz total, ainda continuamos a não fazer o que os colonos portugueses faziam antes da independência.
Na ocasião, o ministro António de Assis disse tratar-se de um projecto de “extrema importância”, sobretudo quanto ao aumento do rendimento económico-financeiro das famílias, daí a razão de os camponeses cuidarem bem das plantas, para que elas possam dar os frutos desejados.
Um excelente conselho de alguém que, por ser Licenciado em Ciência Agrárias, pelo Instituto Superior de Ciências Agrárias de Havana, na especialidade de produção vegetal, em 1981; ter o curso sobre o cultivo e mecanização da cultura de cana-de-açúcar tirado nos EUA em 1985 e também o curso de Análise e Gestão de Projectos Agro-industriais, concluído em 1983 no CIFAG (Portugal), deve saber bem o que diz e, se o deixarem, o que faz ou poderá fazer.
“A partir deste momento, as famílias que beneficiaram de uma muda de café devem ter em conta que receberam mais um filho. Então, precisam de saber se esse filho precisa de alguma coisa ou de correcção para crescer de forma saudável e a família sentir o orgulho de ter um membro capaz de resolver os seus problemas”, elucidou.
Deste modo, o governante pediu aos camponeses para estarem mais unidos e coesos, para fazer face aos desafios da diversificação económica e combate à pobreza, pois que o café é uma cultura de rendimento que, além de aumentar a possibilidade de as famílias ganharem mais dinheiro, pode potenciar o sector industrial.
Noutra parte da sua intervenção, o ministro da Agricultura e Florestas realçou que os técnicos do Instituto de Desenvolvimento Agrário (IDA) devem estar bem capacitados, para melhor contribuírem para a eficiência e eficácia do programa de desenvolvimento rural, numa altura em que o país se debate com a falta de fertilizantes.
António Francisco de Assis lembrou que Angola precisa, anualmente, em média, 170 mil toneladas de fertilizantes ou, no mínimo, 75 mil, para fazer face às necessidades do sector, daí a razão de estes profissionais serem mais patriotas, responsáveis, dedicados e rigorosos na gestão dos meios postos à disposição, para tornar a agricultura na base da economia nacional.
O ministro referiu que eles têm a missão de transmitir conhecimentos técnicos aos camponeses, a fim de aumentar a produção das principais culturas que concorrem para a redução da pobreza, sobretudo agora com a implementação do programa de revitalização do café.
Actualmente, a produção é incipiente, dominada por empresas agrícolas familiares com plantações de baixa produtividade e dificuldades de acesso ao mercado. Trata-se de um café robusto, devido à existência de zonas do país com características propícias ao desenvolvimento desta espécie: Bengo, Cabinda, Cuanzas Sul e Norte, bem como o Uíge, enquanto o café arábica aparece em pequenas quantidades em Benguela, Bié e Huambo.