Sobre as hipocrisias do MPLA em nada mais surpreendem, logo, a surpresa direcciona-se àquela que se julga representante leal do povo, a UNITA, que muito cobra de quem está no poder sem a si mesma se cobrar quando se imiscui em maus lençóis. Daí que, para Francisco Dengue, professor e escritor, os políticos do Galo Negro e os do partido dos camaradas são farinha do mesmo saco.
Por Domingos Miúdo
O desabafo surge em função das informações que tratam sobre a aquisição de viaturas luxuosas e caríssimas para os deputados, divulgadas na primeira semana de Janeiro de 2024.
O pronunciamento da UNITA, que diz ser uma situação recorrente e normal, engraçou Francisco Dengue. Para o escritor, uma negação do Galo Negro a este luxo seria um acto solidário com o sofrimento do povo, sobretudo se obrigasse a converter os milhares de Kwanzas investidos em outras acções mais emergentes e que afectam a população. “Claro que dizem ser de lei receber tal bens, mas eles podem tomar uma posição contrária, só que infelizmente, são todos gananciosos iguais aos políticos do MPLA”, salientou.
Ciente de que se trata de uma lei intrínseca à Assembleia Nacional conferida aos deputados o direito ao usufruto de uma viatura protocolar e outra de uso pessoal no decurso do mandato, Samuel Francisco, estudante finalista de Direito, disse ser uma medida desajustada e desumana sobretudo, uma vez que o Estado angolano alega estar em crise financeira e os deputados, máximos e legítimos representantes do povo, nada fazem para impedir, contestar ou repudiar a referida medida.
“Sinceramente, esse é mais um daqueles casos similar aos do passado que vêm certamente nos mostrar, que a governação política e administrativa do Estado angolano é de interesse ou fins particulares e não colectivos como vê acusado em sentido formal”, lamentou.
António Branda, operador logístico, declarou ao Folha 8 que se trata de um círculo narcótico em que o dinheiro do país é a droga num contexto em que somente eles são os consumidores.
“Na qualidade de defensores do povo teriam de estar na posição de abstinência. Só isso, mostra-me que cada um ali está a favor dos interesses próprios e da sua família e não do povo”, rematou.
Para o economista, António Gomes, os carros da legislatura passada ainda dariam para este ano, em vez de se “esbanjar o dinheiro enquanto o país afunda”.
Em “contra-ofensiva”, o Grupo Parlamentar UNITA (GPU) atirou-se contra aquilo que chama de “desinformação” e “especulações”, que “visam unicamente desviar a atenção dos angolanos das questões relevantes de interesse nacional”.
Na lista destes assuntos, a UNITA incluiu aquilo que classifica como “atentados graves à Constituição perpetrados pelo Presidente da República, a insustentabilidade da Dívida Pública e a corrupção, assim como anular as fortes críticas que o público em geral estava a dirigir ao Sr. Presidente da República pelo escândalo das férias nas Ilhas Seychelles, em desconformidade com a realidade da pobreza e de um Orçamento Geral do Estado deficitário”.
O maior partido na oposição sugeriu que as informações sobre o processo de aquisição e distribuição das viaturas deveriam ser solicitadas ao Conselho de Administração da Assembleia Nacional, que, segundo a UNITA, procedeu à entrega das viaturas na primeira semana de Dezembro de 2023.