O partido português IL (Iniciativa Liberal) pediu hoje a audição urgente do ministro dos Negócios Estrangeiros, João Cravinho, e do director de serviços do departamento da África Subsariana sobre a “situação cada vez mais grave” em Moçambique depois das eleições autárquicas.
Num requerimento parlamentar da IL pode ler-se que “Portugal não pode deixar de expressar a sua preocupação para com os episódios de violência em Moçambique nem para com as irregularidades eleitorais observadas. Ressalvando os laços naturais de Portugal e Moçambique, tal como dos seus povos”.
Segundo a IL, “perante a situação cada vez mais grave com que Moçambique se depara” é necessária uma audição urgente do ministro João Gomes Cravinho e do director de Serviços do Departamento da África Subsariana, João Martins de Carvalho, “com vista a esclarecer este cenário e as possíveis consequências para o povo moçambicano e para a grande comunidade portuguesa no país”.
A proposta dos liberais é que a audição parlamentar, feita em simultâneo, decorra à porta fechada tendo em conta “o nível de classificação ou sensibilidade dos assuntos em questão” com o objectivo que o Governo “possa partilhar a informação que tem recolhida dos factos via rede diplomática”, bem como “os planos de contingência que possam ter para a população portuguesa em caso de uma escalada de violência”.
No requerimento, a IL refere que após a divulgação dos resultados das eleições autárquicas realizadas em 11 de Outubro em Moçambique houve vários “relatos de irregularidades no processo”, o que levou “candidatos e cidadãos a protestar os resultados em várias localidades do país”.
“De acordo com vários cidadãos moçambicanos e inúmeros relatos na imprensa, principalmente internacional, onde se inclui a portuguesa, as forças policiais terão exercido violência sobre manifestantes da oposição que contestam os resultados oficiais da votação, tendo ocorrido tiroteios em Nampula, assim como outros episódios de violência nas Províncias de Zambézia, Sofala e Inhambane”, é descrito pela IL
Segundo os liberais, há “vários relatos independentes e credíveis de irregularidades no dia da votação e durante o processo de apuramento dos votos” que “apontam claramente a fraude eleitoral protagonizada pela FRELIMO”.
Hoje foi conhecido o pedido da Conferência Episcopal de Moçambique aos órgãos eleitorais para “reverem com responsabilidade e justiça todo o apuramento dos resultados” das eleições autárquicas, assinalando que o país enfrenta “uma situação de instabilidade e de continuada tensão social”.
As sextas eleições autárquicas em Moçambique decorreram em 65 municípios do país na passada quarta-feira, incluindo 12 novas autarquias, que pela primeira vez foram a votos.
Segundo resultados distritais e provinciais intermédios divulgados pelo Secretariado Técnico de Administração Eleitoral (STAE) nos últimos dias sobre 50 autarquias, a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo, no poder desde a independência) venceu em 49 e o Movimento Democrático de Moçambique (MDM), terceiro maior partido, na Beira.
Pelo menos quatro tribunais distritais já anularam o escrutínio, alegando várias irregularidades, com destaque para falsificação de editais.
O consórcio “Mais Integridade”, coligação de organizações não-governamentais moçambicanas, acusou a Frelimo (também conhecida como o MPLA de Moçambique) de ter manipulado os resultados das eleições autárquicas do dia 11, protagonizando “um nível elevado de fraude”.
Entretanto, os Estados Unidos da América reconheceram “credibilidade” aos relatórios sobre “irregularidades” nas eleições autárquicas de 11 de Outubro, pedindo que as autoridades do país considerem todas as queixas apresentadas.
“Com base nos relatórios da Embaixada dos EUA e de outros observadores, dos meios de comunicação social locais, dos delegados dos partidos, dos funcionários eleitorais e das organizações da sociedade civil, o dia da votação nos 65 municípios foi, de um modo geral, pacífico, mas existem muitos relatórios credíveis de irregularidades no dia da votação e durante o processo de apuramento dos votos”, refere a embaixada dos EUA, numa nota enviada à comunicação social.
O Governo norte-americano pediu que as autoridades eleitorais, os tribunais locais e o Conselho Constitucional de Moçambique levem “a sério todas as queixas de irregularidades” e sejam imparciais na sua actuação.
“A Comissão Nacional de Eleições (CNE) deve garantir que todos os votos são contados de forma exacta e transparente”, referiu a embaixada dos Estados Unidos da América na nota, reconhecendo a determinação com que os moçambicanos participaram no escrutínio.
Para o Governo norte-americano, que acompanhou o processo eleitoral em pelo menos 12 dos 65 municípios moçambicanos, um processo eleitoral “limpo, transparente e pacífico é essencial para o futuro da democracia multipartidária” em Moçambique.
O presidente da Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), Ossufo Momade, afirmou que o seu partido venceu as eleições autárquicas e não reconhece os resultados anunciados pelos órgãos eleitorais, denunciando uma “megafraude” para “manter” Filipe Nyusi e a Frelimo no poder em Moçambique.
A Iniciativa Liberal (IL) começou em Setembro de 2016, na forma da Associação Iniciativa Liberal – uma Iniciativa de um grupo de cidadãos que pretendia explorar a viabilidade de um partido liberal em Portugal – um partido para juntar todos os liberais portugueses. A Associação prontamente desenvolveu o Manifesto Portugal Mais Liberal, avançou para a recolha de assinaturas, e deu entrada do processo no Tribunal Constitucional em Setembro de 2017.
A IL foi reconhecida como partido político português pelo Tribunal Constitucional a 13 de Dezembro de 2017. Seguiu-se a elaboração do programa político Menos Estado, Mais Liberdade, que viria a definir a grande abordagem política de um novo partido, um partido liberal em toda a linha, o partido liberal de Portugal.
A Iniciativa Liberal concorreu, com listas próprias, a todas as eleições de 2019 – às Eleições para o Parlamento Europeu, Legislativas da Madeira e Legislativas Nacionais, tendo eleito um deputado à Assembleia da República. Em 2020, concorreu às Eleições Regionais dos Açores, elegendo o seu primeiro deputado numa Região Autónoma. Em 2021 a Iniciativa Liberal apoiou a candidatura presidencial de Tiago Mayan Gonçalves, e concorreu às Eleições Autárquicas, tendo eleito 89 autarcas liberais por todo o país.
Em 2022 a Iniciativa Liberal elegeu oito deputados à Assembleia da República.
Recorde-se que, em Portugal, o Chega e a Iniciativa Liberal votaram contra a deslocação de Marcelo Rebelo de Sousa a Luanda para a posse de João Lourenço como Presidente de Angola. BE e PAN abstiveram-se. PS, PSD, PCP e Livre votaram a favor.
A Iniciativa Liberal justificou o seu voto contra esta ida do chefe de Estado a Luanda defendendo que “a mais alta figura de um estado democrático não pode legitimar um estado autocrático”.
Na mesma nota, este partido referiu que “não existe, em termos diplomáticos, um histórico de reciprocidade nas presenças nas cerimónias de tomada de posse de chefes de estado dos dois países”.
Para a Iniciativa Liberal, “reconhecendo a importância de Angola nas relações bilaterais portuguesas”, seria suficiente “a representação pelo Governo”.
Por outro lado, a Iniciativa Liberal acusa Marcelo Rebelo de Sousa de comparar eleições “livres, transparentes e aceites por todos” em Portugal com eleições em Angola “cujos resultados levantaram dúvidas, nomeadamente aos observadores” e conclui: “Angola permanece uma autocracia que não devemos legitimar ao mais alto nível”.
Quando João Lourenço tomou posse pela primeira vez como Presidente de Angola, em 26 de Setembro de 2017, após 38 anos com José Eduardo dos Santos no poder, Marcelo Rebelo de Sousa deslocou-se igualmente a Luanda para representar o Estado português nessa cerimónia.
Na altura, essa deslocação foi aprovada por unanimidade, com votos a favor de PSD, PS, BE, CDS-PP, PCP, PEV e PAN. Chega e IL ainda não tinham assento no parlamento.
Folha 8 com Lusa