PITTA GRÓZ RECANDIDATA-SE A MAIS DO MESMO

O Procurador-Geral da República do MPLA (Angola), Hélder Pitta Gróz, cujo mandato terminou em Dezembro do ano passado e que tinha anunciado que não iria recandidatar-se, mudou de ideias e é um dos candidatos ao cargo que será votado na segunda-feira. Mais do mesmo, seis por meia dúzia.

O nome de Pitta Gróz consta entre os dez nomes admitidos para o provimento dos cargos de Procurador-Geral da República e Vice-Procurador apresentados, a 21 de Abril, na reunião da Comissão Eleitoral do Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público (CSMMP), segundo uma acta relativa ao assunto.

A decisão foi acolhida com “total surpresa” por fontes judiciais e que estiveram presentes na reunião que serviu para aprovar a metodologia de votação e as candidaturas. Surpresa? Surpresa seria se Angola fosse uma democracia e um Estado de Direito. Como não é, tudo é normal.

Pitta Gróz, de 67 anos, tinha comunicado a 23 de Dezembro que não iria concorrer à renovação do seu mandato, mas disse agora aos seus pares que alterou a decisão que tomou na altura, alegando “que havia a orquestração de uma campanha” que visava denegri-lo, “violando todos princípios éticos que devem pautar a ambição pessoal”.

Numa mensagem endereçada aos membros do CSMMP, o procurador-geral afirmou que achou melhor na altura afastar-se “do que conviver com hipocrisia”. Mas, na verdade, sendo a hipocrisia parte relevante do ADN do MPLA, o melhor mesmo é – segundo Pitta Gróz – continuar a sustentar-se, e a sustentar, a hipocrisia.

“Entretanto, daí para frente, fui contactado por diversas pessoas, quer magistrados como de fora da magistratura, para repensar na minha decisão”, acrescentou Pitta Gróz, sublinhando que alterou a decisão tendo em conta que o interesse público deve vir em primeiro lugar. Interesse quê? Ah. Interesse público a favor dos interesses privados.

“Assim foi toda minha vida. Defendo que a melhor campanha é o trabalho, observação de valores éticos, respeito, transparência e coerência no agir, no fazer…. na interacção”, comunicou aos membros do CSMMP que no dia 24 vão escolher três nomes.

Ao falar de “valores éticos, respeito, transparência e coerência no agir”, Pitta Gróz escreve um (mais um) brilhante capítulo do anedotário nacional, sério candidato a liderar o pódio da falta de valores éticos, respeito, transparência e coerência.

Os mais votados serão apresentados ao Presidente do MPLA nas vestes de Presidente da República, que escolherá entre estes o novo Procurador-Geral da Republica, adivinhando-se “uma votação renhida e muito difícil”, segundo uma das fontes que a Lusa contactou e que, presume-se, acredita que o Pai Natal existe mesmo.

Entre os 21 membros que votam do CSMMP, dez são externos, seis dos quais indicados pela Assembleia Nacional (quatro pelo MPLA, partido do poder há 47 anos, e dois pela UNITA, maior partido da oposição que o MPLA ainda permite que exista em Angola).

Em 20 de Dezembro do ano passado, o plenário do Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público já tinha proposto ao Presidente da República de Angola a recondução no cargo de Hélder Pitta Gróz, para um mandato de cinco anos.

DE GENERAL PARA GENERAL, PITTA GRÓZ SEMPRE!

Recordemos. O plenário do Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público propôs ao Presidente da República, João Lourenço, o que foi determinado pelo Presidente do MPLA, João Lourenço, a recondução no cargo do general Hélder Pitta Gróz, para um mandato de cinco anos.

De acordo com as deliberações saídas da primeira sessão extraordinária realizada no dia 16 de Dezembro, o nome do general Hélder Pitta Gróz foi também proposto para mais um mandato como presidente do Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público (CSMMP).

Na reunião foram propostos para a eleição ao cargo de vice-procurador-geral da República e 1.º vice-presidente do CSMMP os nomes de quatro magistrados e no sufrágio teve maior votação Inocência Maria Gonçalo Pinto (sete), seguida de Pedro Mendes de Carvalho (quatro), de Gilberto Mizalaque Balanga Vunge (três) e João Luís de Freitas Coelho (zero).

O plenário recomendou o envio formal da proposta de recondução do procurador-geral da República e presidente do CSMMP, bem como a lista dos três mais votados ao cargo de 1º vice-presidente do CSMMP ao Presidente João Lourenço.

No dia 20 de Dezembro de 2017, o general Hélder Fernando Pitta Gróz passou a ser o novo procurador-geral da República de Angola, nomeado para o cargo pelo Presidente da República, o também general João Lourenço.

Hélder Pitta Gróz era até essa data vice-procurador-geral da República para a esfera Militar e procurador Militar das Forças Armadas Angolanas (FAA) e substitui no cargo o também general João Maria de Sousa, que atingiu o limite do mandato.

O Presidente angolano nomeou ainda Luís de Assunção Pedro da Mota Liz, que se manteve no cargo de vice-procurador-geral da República, e Adão Adriano António, para os cargos de vice-procurador-geral da República para a esfera Militar e Procurador Militar das FAA.

Em 2015, o general Hélder Pitta Gróz foi um dos poucos elementos do regime a comentar publicamente a escolha da também angolana Francisca Van Dunem para ministra da Justiça de Portugal. “Numa sociedade como a de Portugal não seria fácil, não foi fácil de certeza absoluta, que uma mulher negra chegasse a fazer parte de um Governo”, afirmou.

“Também foi quebrar um bocado esse tabu que havia em Portugal: mulher negra não”, disse ainda o então vice-procurador-geral da República de Angola.

No início de Dezembro de 2017, o Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público propôs ao Presidente da República, João Lourenço, a promoção de três procuradores adjuntos para sucederem a João Maria de Sousa na liderança da Procuradoria-Geral da República.

A informação constava de uma deliberação daquele conselho, propondo Hélder Fernando Pitta Gróz, Luís Mota Liz e Pascoal Joaquim, para aquelas funções.

Licenciado em Direito pela Universidade Militar de Moscovo, o general João Maria de Sousa, de 66 anos, foi nomeado a 3 de Dezembro de 2007 e empossado procurador-geral da República de Angola pelo então chefe de Estado, José Eduardo dos Santos, dois dias depois.

Enquanto presidente do Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público, João Maria de Sousa convocou a 24 de Novembro uma reunião plenária daquele órgão, para desencadear o processo que levaria o chefe de Estado a empossar o próximo procurador-geral da República.

“Foram 10 anos de festa da corrupção em Angola, de incompetência, inépcia e gosto de acobertamento dessas práticas. É um procurador que zelou pela corrupção”, afirmou na altura o activista Rafael Marques, autor de mais de 15 participações à PGR, desde 2007, com suspeitas de corrupção envolvendo o regime angolano.

“Nenhuma delas avançou, a não ser aquela em que acusei o procurador de ser corrupto. Mantenho essa acusação e estou à espera de ser pronunciado e de ver o procurador em tribunal”, disse ainda.

Para Rafael Marques, ao próximo procurador exigia-se “respeito pela lei e pelo cargo”, porque, afirmou, nos últimos 10 anos “não houve Justiça em Angola”.

“Com este procurador cometeram-se as maiores injustiças neste país. Mesmo no tempo do marxismo-leninismo não era assim tão arbitrário. O general João Maria de Sousa foi um extraordinário promotor público da violação dos direitos humanos. Não vai deixar saudades”, criticou.

João Maria de Sousa cumpriu 40 anos ao serviço do Ministério Público angolano, nos foros Militar e Comum, e foi depois jubilado.

O estatuto orgânico da Procuradoria-Geral da República (PGR) de Angola define que o procurador – e vice-procuradores – “é nomeado e exonerado” pelo Presidente da República, “sob proposta do Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público”.

O Presidente João Lourenço, no cargo desde 26 de Setembro de 2017, admitiu pouco depois a necessidade de “moralização” da sociedade, com um “combate sério” a práticas que “lesam o interesse público” para garantir que a impunidade “tenha os dias contados”.

“No quadro da necessidade de moralização da nossa sociedade, importa que levemos a cabo um combate sério contra certas práticas, levadas a cabo, quer por gestores, quer por funcionários públicos. Praticas que, em princípio, lesam o interesse público, o interesse do Estado, o interesse dos cidadãos que recorrem aos serviços públicos”, apontou João Lourenço.

PGR “EXPLICOU” PORQUE SÓ HÁ CORRUPÇÃO NO MPLA

O Procurador-Geral da República explicou no dia 16 de Novembro de 2021, com a mestria que se lhe reconhece, a razão pela qual os casos de corrupção só envolvem gente do MPLA. Disse Hélder Pitta Gróz que o combate à corrupção em Angola “é selectivo” porque visa apenas os corruptos. OK. Estamos entendidos. É isso mesmo!

O procurador-geral, que falava à margem de uma conferência internacional sobre a consolidação do Estado de direito nos PALOP e Timor-Leste, que se realizou em Luanda, respondia a uma questão de um jornalista que questionou Pitta Gróz sobre críticas de alguns sectores da sociedade civil e da oposição angolana quanto à selectividade do combate à corrupção que tem visado familiares e colaboradores próximos do antigo Presidente José Eduardo dos Santos, os tais marimbondos (e também caranguejos) de que fala o Presidente João Lourenço.

Além de – pensando melhor – rejeitar a selectividade, salientando que são apenas visados os corruptos, Pitta Gróz afirmou que não existe em Angola o sentimento de impunidade que existia anteriormente, incluindo nas práticas de gestores públicos, que têm agora “outra atitude”. Anteriormente onde figuravam altos dirigentes do MPLA, como os generais Pitta Gróz e João Lourenço, entre (tantos) outros.

Questionado sobre a demora nas investigações relacionadas com a empresária Isabel dos Santos, filha do ex-Presidente que foi quem impôs João Lourenço como cabeça-de-lista do MPLA, que é alvo de processos criminais e cíveis em Angola, adiantou que há questões relacionadas com a cooperação internacional que exigem tempo.

“E necessário fazer diligências e estamos dependentes de respostas do exterior, temos estado a fazer uma certa pressão para que essas respostas sejam dadas o mais rapidamente possível, mas não podemos fazer mais, temos de respeitar a soberania dos Estados, respeitar as suas instituições e, portanto, resta-nos aguardar. Mas não houve nenhum abrandamento, os processos continuam”, garantiu Pitta Gróz, reafirmando que os processos são demorados porque dependem “bastante da cooperação internacional”.

Quanto aos activos recuperados, estimados em mais de 5 mil milhões de dólares, têm sido encaminhados, em valores monetários para uma conta do Banco Nacional de Angola (BNA), enquanto os valores patrimoniais têm sido entregues ou ao Cofre da Justiça ou a departamento ministeriais.

A lei angolana atribui 10 por cento dos valores recuperados à Procuradoria-Geral da República, enquanto órgão recuperador, que servem para reforço da sua capacidade e melhoria das condições de trabalho, mas até ao momento a instituição ainda não foi beneficiada. “Estamos ainda a ver como vamos fazer a operacionalização”, lamentou Hélder Pitta Gróz.

Hélder Pitta Gróz sublinhou que o início do PACED (Projecto de Apoio à Consolidação do Estado de Direito) foi para Angola “um despertar” para a necessidade do país se preparar para enfrentar um tipo de criminalidade para a qual não havia quase formação.

“Serviu para esse despertar, serviu para darmos os primeiros passos e daí continuarmos a consolidar essa formação”, realçou o mesmo responsável.

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