Segundo informação do Laboratório de Engenharia de Angola há cerca de 500 edifícios em risco de desabamento em Angola, mais de metade estão em Luanda.
Por Carlos Pinho (*)
Pensando bem, o que se passa com estes edifícios é um claro paradigma do que se passa em Angola, desde o dia em que esta foi entregue de mão beijada pelo MFA português ao MPLA. Foi um fartar de vilanagem. Infelizmente a libertação de Angola do jugo colonial português, foi só isso e mais nada, Angola passou de jugo colonial português para o jugo neocolonial do MPLA.
Foi bom e fácil ocupar casas alheias, com a desculpa de que todos os portugueses, seus descendentes ou simpatizantes, eram feios, porcos e maus. A entrega dessas casas aos povos libertados foi um rico forrobodó, forrobodó esse que continua há quase meio século. Esse meio século que rapidamente se aproxima, decorreu sobre a governação e gestão clarividente do MPLA.
Em qualquer país civilizado, tendo em conta o tempo de vida expectável para as construções civis mais simples, o que teria sido de esperar nestes quase 50 anos de independência, é que tivessem ocorrido pelo menos duas grandes intervenções de manutenção e restauro dessas construções. Mas não, como o colonialismo português tem as costas quentes, todas as degradações e falhas de processes de manutenção e restauro serão sempre culpa dos colonos. É fácil, é barato, e presumo que dará milhões aos governantes de Angola.
É irrelevante que cada cidadão ocupante de um apartamento ou casa dos malvados dos colonos, as tenha convertido em verdadeiros bunkers. Foram tanques de água, sistemas de bombagem para distribuição da dita água às respectivas torneiras e tanques de gasóleo para alimentação de geradores eléctricos e estes propriamente ditos; consequentemente com o calor e odores libertados por esses mesmo geradores, instalações de ar condicionado de dimensões mais ou menos compatíveis com os cómodos a climatizar, foram instaladas nos vários apartamentos desses edifícios libertados do jugo colonial. Isto em edifícios, construídos originalmente para um país minimamente civilizado, onde supostamente as utilidades mais elementares como água potável e electricidade, chegavam facilmente à porta do cliente, e por isso não tinham sido dimensionados e construídos para aguentarem tais sobrecargas extras. Depois é preciso considerar o fecho de varandas com paredes em tijolo, instalação de sanitários extra nas varandas, com as águas chocas a choverem sobre os desgraçados que vivem por baixo, em suma uma verdadeira baderna à boa maneira angolana.
Depois há o facto de que além das ausências das necessárias manutenções nos edifícios, também a rede de esgotos da cidade de Luanda deveria ter sido objecto de processos de manutenção e renovação. Tal logicamente também não aconteceu e por isso muitas zonas de Luanda estão hoje sobre verdadeiros pântanos, ou lençóis subterrâneos, de chorume. Está preparado o cenário ideal para derrocadas em série.
Ora tudo isto é bem representativo das capacidades governativas do MPLA, não só na cidade capital onde os altos prédios entretanto construídos na baixa e não só, constituem uma autêntica barreira visual que pretende esconder a desgraça que por aí vem com a queda futura de edifícios degradados como castelos de cartas, mas logicamente em todo o país.
Convém relembrar o que aconteceu em 2010 com o Hospital Geral de Luanda, construído em 2006 e posteriormente reinaugurado em 2012. É caso para se dizer que os edifícios do neocolonialismo são bem piores do que os do colonialismo.
Será igualmente de lembrar que o custo médio de recuperação de estradas em Angola é quatro vezes maior do que em Portugal, segundo um relatório sobre o Custo de Desenvolvimento de Infra-estruturas no país. Este estudo, referente ao período entre 2011 e 2014, foi apresentado em 19 de Maio de 2019 e foi fruto de uma colaboração entre o Centro de Estudos e Investigação Científica (CEIC) da Universidade Católica de Angola e o Chr. Michelsen Institute (CMI) (Diário de Notícias, Lisboa, Portugal, https://www.dn.pt/lusa/recuperar-estradas-em-angola-custa-quatro-vezes-mais-do-que-em-portugal—estudo-10896619.html). Ora, isto deverá acontecer por via da gasosa. Não vejo outra explicação tão convincente.
Por isso o fartar vilanagem continua em grande ritmo e recomenda-se. Esta baderna infesta e afecta todos os estratos da vida angolana. Veja-se só o que se passou com o antigo ministro da saúde do governo de Agostinho Neto, Mário Afonso d’Almeida (Kasesa), que não aceitou comparecer na cerimónia de condecoração que o governo de João Lourenço realizou na terça-feira 4 de Abril de 2023 em Luanda, por questionar os critérios que estiveram na base da selecção dos que seriam condecorados. Ou os comentários de Edgar Valles sobre o mesmo assunto. Misturar carrascos e vítimas e colocá-los ao mesmo nível, só mesmo em Angola, e normalmente dá asneira.
Ou a tentativa do governo angolano em ludibriar familiares de Zé Van-Dúnem e Sita Valles entregando-lhes ossadas falsas. Não há vergonha, não há respeito pelos cidadãos, não há pundonor, não há sentido de estado, nada existe, a não ser a miserável e triste sina de ser-se angolano.
(*) Aposentado. Ex-docente universitário.