Angola arrecadou 1,7 mil milhões de dólares (1,575 mil milhões de euros) com a exportação de diamantes, em 2021, período em que produziu perto de 9 milhões de quilates de diamantes, anunciaram hoje as autoridades do sector. Entretanto, a sul-africana De Beers vai regressar a Angola e explorar diamantes nas províncias da Lunda Norte e Lunda Sul.
Segundo o presidente do Conselho de Administração da Empresa Nacional de Diamantes de Angola (Endiama), José Ganga Júnior, a empresa perspectiva produzir 10 milhões de quilates em 2022.
A meta da diamantífera estatal angolana para este ano é de uma facturação relativamente superior à de 2021, em que as exportações renderam aos cofres angolanos cerca de 1,7 mil milhões de dólares.
“E a nossa intenção é que, pelo menos, 20% da nossa produção média anual seja processada em termos de lapidação aqui em Angola”, afirmou o responsável, à margem da abertura de um ‘workshop’ sobre a Diversificação do Sector Mineiro em Angola.
O ministro dos Recursos Minerais, Petróleo e Gás de Angola, Diamantino Pedro Azevedo, disse, na abertura do encontro, que os resultados do Plano Nacional de Geologia têm despertado interesse de importantes empresas multinacionais.
Segundo o ministro angolano, a comercialização de minerais estratégicos no “país, dentro dos parâmetros de desburocratização e lisura, são condição essencial que atestam” a “seriedade e empenho em relação à Iniciativa Transparência no Sector Extractivo”.
Angola tem desenvolvido acções para ser admitida como membro efectivo da Iniciativa Transparência no Sector Extractivo.
O ponto de situação sobre a diversificação da actividade mineira em Angola foi apresentado pelo director nacional dos Recursos Mineiros, André Buta Neto, tendo salientado que o país está já a produzir manganês e vai iniciar a produção de fosfato.
“Neste momento, a exploração de fosfato começa já a ser algo palpável, uma vez que a empresa está em bom ritmo e prevê já a partir do próximo ano iniciar a sua produção” assegurou o responsável.
Enquanto isso, a De Beers vai assinar amanhã, quarta-feira, dois contratos de investimento mineiro com o governo angolano para explorar diamantes nas províncias da Lunda Norte e Lunda Sul, marcando assim o regresso ao país da diamantífera sul-africana.
Os contratos resultam de “várias rondas negociais entre as instituições angolanas e a De Beers, desde Outubro de 2021”, salienta o Ministério dos Recursos Minerais, Petróleo e Gás (Mirempet), num comunicado.
A De Beers vai efectuar prospecção de depósitos primários de diamantes numa extensão territorial de 9.984 quilómetros quadrados, nos municípios de Saurimo, Dala e Muconda, na província da Lunda Sul e numa área de 9.701 quilómetros quadrados, nos municípios de Chitato, Lucapa e Cambulo na Lunda Norte.
Angola negociava há vários anos o regresso da De Beers ao país, num processo de recuperação da confiança da diamantífera sul-africana, reconhecido como “difícil” pelo próprio ministro dos Recursos Minerais e Petróleos, Diamantino de Azevedo, em Fevereiro de 2020.
O conflito entre a De Beers e o Governo angolano, através da diamantífera Endiama, começou no início de 2000, depois de as autoridades angolanas terem suspendido todos os contratos de compra e venda de diamantes no âmbito de uma reestruturação do sector, que incluiu a criação da Sodiam, empresa a quem foi atribuído o monopólio da comercialização dos diamantes angolanos.
Na sequência desse agravamento de relações, no final de Março de 2000, um lote de diamantes provenientes de Angola, enviado pela Sodiam, ficou retido em Antuérpia, Bélgica, durante alguns dias devido a um pedido judicial da De Beers, que defendia os seus direitos sobre a comercialização daquelas pedras preciosas.
Nos meses seguintes, registaram-se várias iniciativas para melhorar o relacionamento entre as duas partes, que incluíram uma deslocação a Luanda do presidente da multinacional sul-africana para se encontrar com o então Presidente angolano, José Eduardo dos Santos, mas todas sem sucesso.
Por essa razão, em 2001, ano em que suspendeu a sua actividade em Angola, a De Beers moveu vários processos arbitrais contra o Estado angolano, que viria posteriormente a perder.
Em 2018, aquando da sua deslocação a Angola, o CEO da De Beers, Bruce Cleaver, foi recebido pelo Presidente de Angola, João Lourenço, manifestando satisfação pelo convite lançado à multinacional para regressar ao país, onde mantém desde 2014 uma presença residual.
Bruce Cleaver será o signatário dos projectos que serão rubricados pela parte angolana por Jacinto Rocha, presidente da Agência Nacional de Recursos Minerais, e José Ganga Júnior, presidente da diamantífera estatal angolana, Endiama.
O comunicado do Mirempet destaca que “o renovado interesse da De Beers em projectos diamantíferos em Angola decorre das reformas implementadas pelo executivo”, conferindo “maior transparência aos processos de outorga de direitos mineiros, bem como uma maior participação no desenvolvimento sócio-económico das zonas mineiras”.
A outra face da riqueza
Em Fevereiro de 2018, a Human Rights Watch disse ser necessário que as multinacionais de joalharia dêem passos para garantir que adquirem ouro e diamantes a fornecedores que respeitem os direitos humanos, sendo que nenhuma das empresas que analisou cumpre totalmente os critérios da organização.
A organização de direitos humanos solicitou a 13 multinacionais do sector da joalharia informação detalhada sobre as suas práticas de verificação de fornecedores, nomeadamente se respeitam os direitos humanos nos locais de mineração, informação que reuniu num relatório então divulgado.
“As 13 companhias escolhidas incluem algumas das maiores e mais conhecidas da indústria da joalharia e da relojoaria, reflectindo ainda os diferentes mercados por geografias”, dizia a HRW no seu relatório.
As empresas seleccionadas foram a Pandora (Dinamarca); Cartier (França); Christ (Alemanha); Kalyan, TBZ Ltd. e Tanishq (Índia); Bulgari (Itália); Chopard e Rolex (Suíça); Boodles (Reino Unido); Harry Winston, Signet e Tiffany (Estados Unidos da América). Destas multinacionais, todas responderam às perguntas da HRW menos a Rolex, a Kalyan e a TBZ.
De acordo com a HRW, “algumas das companhias de joalharia analisadas fizeram esforços significativos para obter o seu ouro e diamantes a partir de fornecedores responsáveis, enquanto outras tomaram medidas muito mais fracas”.
“A Human Rights Watch descobriu que nenhuma das companhias cumpre na totalidade os nossos critérios para um fornecimento responsável. Os problemas principais são: falhas na avaliação de riscos relacionados com direitos humanos” bem como falta de transparência, indicou a organização.
Por exemplo, “nenhuma das empresas que respondeu à HRW consegue rastrear por completo o ouro e os diamantes que compra até às minas de origem, assegurando assim a cadeia de responsabilidade”.
“Uma companhia, a Tiffany, consegue essa cadeia completa de responsabilidade para o ouro, uma vez que compra o seu ouro apenas a uma mina, a Mina de Bingham Canyon, no Utah [Estados Unidos]”, salienta.
Um ranking feito pela ONG norte-americana aponta apenas uma companhia – a Tiffany – como tendo dado passos “muito fortes” para garantir a proveniência segura das suas matérias-primas.
Na resposta à HRW, a Tiffany salientou que não comprava diamantes a Angola ou ao Zimbabué “devido a crescentes riscos de direitos humanos”.
Na categoria das empresas que deram passos “moderados” na verificação do risco de direitos humanos constam a Bulgari, a Pandora, a Cartier e a Signet.
A Boodles, a Christ, a Chopard e a Harry Winston estão no nível “fraco”, enquanto a indiana Tanishq está no “muito fraco”. A Kalyan, a Rolex e a TBZ ficam de fora do quadro por não terem dado resposta.
Estas 13 empresas representam cerca de 10 por cento das vendas mundiais de joalharia, com receitas globais combinadas estimadas em mais de 30 mil milhões de dólares.
A produção anual de diamantes no mundo alcança os 130 milhões de quilates em bruto, com qualidade para gemas ou diamantes de uso industrial. Cerca de 70% têm qualidade para gemas.
Os maiores produtores de diamantes do mundo são a Rússia, o Botswana, o Canadá e a Austrália, e a indústria dos diamantes é dominada por duas companhias mineiras, a Alrosa (da Rússia e que opera em Angola) e a De Beers, que opera no Botsuana, Canadá, Namíbia e África do Sul. As duas companhias representam cerca de metade das vendas de diamantes em bruto em todo o mundo.
Angola, como todo o mundo sabe mas que poucos dizem que sabem, é actualmente aquele país que para uma população de cerca 32 milhões pessoas tem 20 milhões de pobres, tem um enorme potencial diamantífero nas regiões norte e nordeste do país, com dados que indicam para a existência de um total de recursos em reservas de diamantes superior a mil milhões de quilates.
Folha 8 com Lusa