Repensar os fantasmas é uma boa estratégia que, aliás, revela que o governo do MPLA (há quase 46 anos que Angola só conhece governos do MPLA) até da própria sombra tem medo. É que os fantasmas aparecem em vários formatos e configurações. Uns surgem na forma de Jonas Savimbi, outros na de Isabel dos Santos, outros ainda em formato de… “Folha 8”. Que o diga o “maninho” Celsinho Malavoloneke.
Por Orlando Castro
Enquanto secretário de Estado da Comunicação Social, Celso Malavoloneke, valorizou o ciclo de formação dirigido aos jornalistas, considerando ser uma matéria “complexa”, mas que deve ser “descodificada” para o entendimento da sociedade.
“Não é segredo para ninguém que a especialização nas matérias económicas ainda é um dos nossos pontos fracos, enquanto profissionais da comunicação, não apenas por eventual culpa dos profissionais dos órgãos de comunicação”, disse Malavoloneke.
Um jornalismo mais sério, baseado no patriotismo, na ética e na deontológica profissional, é o que o MPLA (com ou sem Ministério da Comunicação Social) pretende para Angola. A tese (adaptada do tempo de partido único) é exactamente de Celso Malavoloneke.
Convenhamos, desde logo, que só a própria existência de um Ministério da Comunicação Social foi reveladora da enormíssima distância a que estávamos das democracias e dos Estados de Direito. Com a perspicácia que lhe é genética, o MPLA acabou com o rótulo (o Ministério) mas manteve o produto, o (ex)celso nanismo intelectual de quem julga ser dono da verdade.
Quem é Celso Malavoloneke, o ex-secretário de Estado, ou o ex-ministro, ou o próprio Titular do Poder Executivo para nos vir dar lições do que é um “jornalismo mais sério, baseado no patriotismo, na ética e na deontológica profissional”?
Mas afinal, para além dos leitores, ouvintes e telespectadores, bem como dos eventuais órgãos da classe, quem é que define o que é “jornalismo sério”, quem é que avalia o “patriotismo” dos jornalistas, ou a sua ética e deontologia? Ou, com outros protagonistas e roupagens diferentes, estamos a voltar (se é que já de lá saímos) ao tempo em que patriotismo, ética e deontologia eram sinónimos exclusivos de MPLA?
Esta peregrina ideia de Celso Malavoloneke foi manifestada no dia 27 de Fevereiro de 2018, na cidade do Huambo, na abertura do seminário dirigido aos jornalistas das províncias do Huambo, Bié, Benguela, Cuanza Sul e Cuando Cubango.
Para alcançar tal desiderato, Celso Malavoloneke informou que o então Ministério da Comunicação Social iria prestar uma atenção especial na formação e qualificação dos jornalistas, para que estes estivessem aptos para corresponder às expectativas do Governo. Às expectativas do Governo? Exactamente.
Como se vê o gato escondeu o rabo mas deixou o corpo todo de fora. Então vamos qualificar os jornalistas para que eles, atente-se, “estejam aptos para corresponder às expectativas do Governo”? Ou seja, serão formatados para serem não jornalistas mas meros propagandistas ao serviço do Governo, não defraudando as encomendas e as “ordens superiores” que devem veicular.
Celso Malavoloneke lembrou que o Presidente da República, João Lourenço, no seu primeiro discurso de tomada de posse, orientou para que se prestasse uma atenção especial à Comunicação Social e aos jornalistas, para que, no decurso da sua actividade, pautem a sua actividade pela ética, deontologia, verdade e patriotismo. E fez bem em lembrar. É que ministros e secretários de Estado também recebem “ordens superiores” e, por isso, não se podem esquecer das louvaminhas que o Presidente exige. E se há coisas que o Celsinho não se esquece é de bajular quem manda, seja ele quem for, nem que para isso confunda a cubata do fundo com o fundo da cubata.
Aos servidores públicos, segundo Celso Malavoleneke, o Chefe de Estado recomendou para estarem abertos e preparados para a crítica veiculada pelos órgãos de Comunicação Social, estabelecendo, deste modo, um novo paradigma sobre a forma de fazer jornalismo em Angola.
Mesmo sem a cobertura do ministro João Melo, as suas teses – que ao fim e ao cabo pouco diferem das de… Joseph Goebbels, a não ser na embalagem – os servidores públicos podem estar descansados que não haverá lugar a críticas da Comunicação Social.
Nós por cá vamos continuar a (tentar) dar voz a quem a não tem. Aceitamos, sem hesitações, que a nossa liberdade termine onde começa a de todos os outros, sejam as mães que procuram comida para os filhos nas nossas lixeiras ou os mais altos dignitários do Estado. Mas, para isso, exigimos que a liberdade dos mais altos dignitários do Estado termine onde começa a nossa.
Vamos, em síntese, estar apenas preocupados com as pessoas a quem devemos prestar conta: os leitores. Se calhar, citando Celso Malavoloneke, não seremos tão patrióticos como o Governo deseja. Para nós, se o Jornalista não procura saber o que se passa é um imbecil. Se sabe o que se passa e se cala é um criminoso.
Daí a nossa oposição total aos imbecis e criminosos, sejam jornalistas, polícias, membros do governo, militares, políticos, líderes religiosos, deputados etc. etc..
Por último, mostrando como alguns membros do MPLA são especialistas em atirar a pedra e esconder a… pata, Celso Malavoloneke não usa o direito de resposta. Prefere “chorar” como as hienas, fazer-se de vítima e queixar-se (de forma particular e apelando à amizade) para tentar calar a liberdade. Não resultou ontem, não resulta hoje, não resultará amanhã.