A UNITA, o maior partido da oposição que o MPLA ainda permite que exista em Angola, assumiu hoje culpa no “incumprimento” das medidas de biossegurança, devido à Covid-19, em actividades políticas de massa, exortando outros partidos políticos a “darem a mão à palmatória” e a “obedeceram” às regras sanitárias. Noutro contexto, apresentou no Parlamento um projecto de lei sobre a Liberdade de Reunião e de Manifestação que visa revogar a lei vigente, “por ser inconstitucional”, e “salvaguardar a integridade” dos cidadãos.
Segundo o presidente do grupo parlamentar da UNITA, Liberty Chiyaka, os “angolanos, dirigentes e deputados investidos de responsabilidades de Estado”, devem “assumir a sua responsabilidade” em matéria de biossegurança.
“De forma acrescida, devemos fazer tudo para que a sociedade de uma forma geral, partidos políticos sejam eles a UNITA, MPLA ou outros, possam respeitar as leis, porque afinal está em causa a saúde pública e, quanto a isso, devemos dar a mão à palmatória”, afirmou hoje o responsável, em conferência de imprensa.
Os partidos políticos que realizam actividades políticas “sem respeitar as regras de biossegurança deverão fazer tudo para que se possa corrigir aquilo que está mal”, exortou.
Vários partidos políticos, sobretudo a UNITA e o MPLA (no poder há 45 anos), são acusados e criticados pela sociedade civil de “violação sistemática” das regras de biossegurança em actividades políticas de massa.
Pelas redes sociais circulam diariamente imagens que certificam a realização de actividades públicas de ambos os partidos, em Luanda e pelo interior de Angola, com “ajuntamentos consideráveis” de pessoas que favorecem a propagação da Covid-19.
O mais recente decreto presidencial sobre a situação de calamidade pública, que Angola vive há mais de um ano, visando travar a propagação da Covid-19, proíbe os ajuntamentos na via pública e estipula multas para os incumpridores.
Liberty Chiyaka, que falava a propósito da apresentação do c de lei sobre a Liberdade de Reunião e de Manifestação, que visa revogar o diploma de 1991, a proposta visa igualmente “travar as alegadas manifestações financiadas”.
“Não vamos entrar agora na especulação, os angolanos sabem aquilo que tem acontecido, a história de muitas manifestações que não foram realizadas porque os seus promotores talvez tenham sido corrompidos, infelizmente persegue a nossa história política recente”, respondeu, quando questionado pelos jornalistas.
A resposta da UNITA “para a solução desse problema é a apresentação desse projecto de lei”, indicou.
“Não queremos olhar mais para o passado, mas sim para futuro no sentido de ultrapassarmos os temores que existem da parte de quem governa e também procurarmos orientar o comportamento dos manifestantes e temos aí o projecto”, sustentou.
Para a UNITA, a lei vigente sobre a liberdade de reunião e manifestação “é inconstitucional e precisa de ser revogada”, facto que motivou a motivou a elaborar o projecto remetido hoje ao gabinete do presidente do parlamento angolano.
Angola soma 38.556 casos de covid-19, 889 óbitos e 32.791 doentes recuperados desde o início da pandemia.
A pandemia de covid-19 provocou pelo menos 3.925.816 de vítimas em todo o mundo, resultantes de 181.026.547 casos de infecção diagnosticados oficialmente, segundo o balanço feito pela agência francesa AFP.
Segundo o político da UNITA, apesar da Constituição de República de Angola (CRA) estabelecer que os cidadãos são livres para se reunirem e se manifestar sem impedimentos, sem armas e sem precisar de qualquer autorização, “existe, desde 1991, uma lei que diz o contrário”.
“Claro que esta lei, a Lei nº16/91, de 11 de Maio, Lei sobre o Direito de Reunião de Manifestação é inconstitucional e precisa de ser revogada”, defende Liberty Chiyaka.
A lei que “propusemos vem clarificar conceitos para eliminar as incompreensões, estabelecer limites para remover temores, disciplinar comportamentos para evitar abusos e estabelecer regras claras a observar por todos”. “Pelos manifestantes, pela polícia e pelo contra manifestantes”, explicou o líder parlamentar dos “maninhos”.
Para a UNITA, a razão dos referidos “temores e os comportamentos negativos” radicam, “principalmente, na conexão indevida que se estabelece entre o direito à liberdade de manifestação democrática e os resquícios culturais da mentalidade monolítica”.
As últimas manifestações em Angola, sobretudo promovidas por jovens e organizações da sociedade civil, têm sido marcadas por confrontos directos entre manifestantes e agentes da polícia, tendo em algumas resultado em mortes, feridos e detenções, inclusive de jornalistas.
Liberty Chiyaka, na sua intervenção, considerou também que as leis aprovadas na década de 90, nomeadamente a lei de Reunião de Manifestação, dos Partidos Políticos, entre outras, “não garantiram a concretização efectiva da democracia e dos direitos fundamentais”.
Na “prática, mesmo com a paz”, argumentou, o “Governo continuou a restringir de facto as liberdades e os direitos dos cidadãos. As liberdades de expressão, de manifestação, de imprensa e outras, continuaram apenas no âmbito da mera formalidade constitucional”.
O deputado da UNITA disse igualmente que mesmo com a CRA, aprovada em 2010, que consagra do direito à liberdade de reunião e de manifestação pacífica e sem armas, “o partido-Estado continuou a subverter e instrumentalizar a polícia para impedir e reprimir manifestantes”.
“A noção de que a soberania pertence ao povo, e não aos governos nem aos exércitos, não está na mente de quem governa”, apontou.
“Esta cultura autoritária do exercício arbitrário do poder político sem levar em conta os limites impostos pelos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos manteve-se e mantém-se até agora”, frisou.
O líder parlamentar da UNITA admitiu também que “receios de uma Primavera Árabe” levaram o “regime em Angola a subverter os órgãos do Estado constitucional democrático, utilizando quer a força bruta quer a propaganda política para violentar os direitos dos angolanos”.
O “Governo não pode impedir, limitar nem condicionar o exercício dos direitos fundamentais. Mas também os cidadãos não podem utilizar os direitos fundamentais para fazer desmandos, vandalizar equipamentos públicos ou tomar o poder político por vias não previstas na lei”.
Em Angola, observou Liberty Chiyaka, os temores sobre as manifestações são infundados, porque ninguém vai tomar o poder por via do direito à manifestação.
“A UNITA não vai permitir isso. O poder já pertence ao povo, e deve ser sempre exercido pelo povo, para o benefício do povo, nos termos da Constituição e da lei”, notou.
Liberty Chiyaka assegurou ainda: “A partir de agora acabou. Ninguém mais deve usar armas para em nome do Estado, assassinar um angolano por exercer pacificamente e sem armas o direito e sem armas o direito de reunião e de manifestação”.
“Quem o fizer terá de ser responsabilizado. O Estado terá de assumir, tal como estabelece a Constituição”, exortou.
O político da UNITA, que acredita na aceitação e aprovação do seu projecto de lei por parte MPLA, deu conta que a proposta visa estabelecer também “regras e procedimentos para orientar a comunicação prévia entre autoridades e manifestantes”.
Folha 8 com Lusa