Pela voz de um dos seus ventríloquos, o Titular do Poder Executivo angolano (João Lourenço) considerou hoje a aprovação global da lei de revisão constitucional como um “momento importante na vida da democracia do país”, garantindo que irá “estruturar melhor” a relação entre o parlamento e o executivo. Também o Presidente do MPLA (João Lourenço), bem como o Presidente da República (João Lourenço) mandaram dizer o mesmo.
“Com esta revisão da Constituição, vamos ter uma melhor estruturação e melhor equilíbrio na relação entre o Parlamento e o Executivo na medida em que ficam clarificados os mecanismos de fiscalização política do Parlamento sobre o poder Executivo”, afirmou Adão de Almeida, ministro de Estado e chefe da Casa Civil do Presidente angolano, mostrando que – para ele – desde que o chefe mande, tanto-lhe faz dormir com o José Maria como com a Maria José, como deixar a porta aberta ou deixar a Berta à porta.
Em declarações no final da reunião plenária que aprovou o projecto de lei de revisão constitucional, de iniciativa do Presidente João Lourenço, o governante assinalou que o diploma também abre espaço para a universalização do direito de voto para os angolanos no exterior. Tal como abre espaço para que Angola seja uma verdadeira democracia e um Estado de Direito quando o MPLA comemorar 100 anos de governação ininterrupta. Já só faltam 55…
Para Adão de Almeida, a actual revisão da Constituição da República de Angola (CRA) “também clarifica o papel institucional, no sentido de reforma, de instituições importantes” como o caso do BNA (Banco Nacional de Angola).
“Clarificamos alguns poderes do Presidente da República, particularmente a proibição da prática de certos tipos de actos na fase final do seu mandato, a partir do momento em que começa a campanha eleitoral”, frisou.
O Parlamento do MPLA aprovou na globalidade o projecto de lei de revisão constitucional com 152 votos favoráveis do… MPLA e de alguns deputados na oposição, nenhum voto contra e 56 abstenções da UNITA e da CASA-CE.
Após a sua aprovação por unanimidade na especialidade, no hemiciclo o MPLA (no poder desde 1975) anuiu favoravelmente o documento com a sua maioria absoluta seguido de deputados da FNLA e do PRS.
Os deputados da UNITA, maior partido na oposição que o MPLA ainda permite, deputados da CASA-CE e alguns independentes abstiveram-se.
Este projecto de revisão da CRA alterou 44 artigos, aditou sete novos artigos e revogou igualmente alguns artigos. O novo texto constitucional, que altera parcialmente a Constituição aprovada em 5 de Fevereiro de 2010, garante que o BNA “é independente na prossecução das suas atribuições e no exercício dos poderes públicos a si acometidos”.
No domínio da administração e registo eleitoral, o projecto de revisão da CRA aprovado refere que o registo eleitoral “é oficioso, obrigatório e permanente” e é realizado pelos órgãos competentes da administração directa do Estado, “sem prejuízo da possibilidade de participação de outros órgãos da administração pública”.
A ausência de votos contra a revisão da Constituição angolana foi também assinalada por Adão de Almeida, para quem a abstenção da oposição parlamentar “significa que no equilíbrio há coisas boas e eventualmente coisas com as quais não se concorda”. “Mas, elas não foram ao nível do voto contra”, concluiu o ministro angolano.
Recorde-se que o ventríloquo em questão, Adão de Almeida, foi escolhido pelo Presidente da República, João Lourenço, para dirigir a Comissão Interministerial para a organização das acções comemorativas do centenário do primeiro Presidente e Fundador da Nação angolana, único herói nacional segundo o MPLA e responsável pelo massacre de milhares de angolanos no genocídio de 27 de Maio de 1977, António Agostinho Neto.
De acordo com uma nota de imprensa da Casa Civil do Presidente da República, a Comissão resulta da necessidade de se organizar os preparativos para uma comemoração condigna desse acontecimento que se celebra a 17 de Setembro de 2022.
A Comissão vai elaborar um cronograma de acções comemorativas alusiva aos 100 anos do nascimento do suposto único fundador da Nação, apresentar uma proposta de orçamento para as celebrações, preparar, organizar e coordenar, a nível interno e externo, as operações necessárias à realização das celebrações.
Como coordenador da Comissão, Adão de Almeida era para ter como adjunto o ministro de Estado e Chefe da Casa de Segurança do Presidente da República, general Pedro Sebastião, que entretanto foi mandado dar uma volta ao bilhar grande.
Integram também esta Comissão os ministros da Administração do Território, Marcy Lopes; da Defesa Nacional e Veteranos da Pátria, João Ernesto dos Santos; do Interior, Eugénio César Laborinho; e das Relações Exteriores, Teté António.
São ainda membros da Comissão a ministra das Finanças, Vera Daves, os ministros dos Transportes, Ricardo de Abreu, das Telecomunicações, Tecnologias de Informação e Comunicação Social, Manuel Homem, da Educação, Luísa Grilo, da Cultura, Turismo e Ambiente, Jomo Fortunato e da Juventude e Desportos, Ana Paula Neto.
Os governadores provinciais, o director do Cerimonial do Presidente da República, o presidente do Conselho de Administração do Memorial António Agostinho Neto e um representante da Fundação António Agostinho Neto fazem parte igualmente da Comissão.
Em Setembro de 2020, outra ventríloqua, vice-presidente do MPLA, Luísa Damião, desafiou as universidades do país (desde logo a Universidade da qual é patrono) a promoverem a elaboração de projectos de estudos no âmbito do centenário de Agostinho Neto. A caminho, presume-se, de uma série de galardões internacionais, caso do Nobel da Paz…
Luísa Damião, que falava na abertura de uma mesa-redonda sobre “A dimensão política e cultural de Neto”, propôs à Faculdade de Letras da Universidade Agostinho Neto a criação de um departamento ou estudos sobre a vida e obra de Agostinho Neto, à semelhança de algumas academias do mundo. A vice-presidente do MPLA defendeu que não se pode diminuir ou denegrir a imagem ou reduzir a dimensão de Agostinho Neto. Tem razão. Para além de ter mandado massacrar milhares e milhares de angolanos no 27 de Maio de 1977, a dimensão genocida de Agostinho Neto tem outras variantes dignas de estudo.
“O seu sentido humanista e de liderança do país fica expresso na necessidade da formação do homem novo por via da educação e dos valores e ideias do povo angolano”, disse a oradora, certamente numa mensagem subliminar aos familiares das vítimas do massacre que, provavelmente, não viram nessas mortes o sentido humanista do carrasco.
No colóquio, que decorreu sob o lema “Reforçar a Unidade Nacional com o Legado de Neto”, Luísa Damião defendeu que Agostinho Neto deve ser sempre promovido, para o conhecimento e estudo das novas gerações. Tem razão. Do ponto de vista do MPLA, e aqui a mensagem não é subliminar (pelo contrário), importa que os angolanos se lembrem de que o 27 de Maio de 1977 “made in” Agostinho Neto não foi caso único e pode ser repetido sempre que o partido quiser.
Luísa Damião lembrou que Agostinho Neto é reconhecido internacionalmente e os seus feitos ultrapassam fronteiras (em breve serão assinados com uma lápide em… Marte). No seu percurso histórico, acrescentou, além da dimensão humanista, tem as suas impressões digitais em vários domínios da vida do país. Modéstia. Na verdade as impressões digitais de Agostinho Neto estão sobretudo na morte dos angolanos.
Folha 8 com Lusa