Alguns grupos de jovens activistas tentaram hoje, mais uma vez, manifestar-se contra o Governo, em Luanda, mas foram travados pela intervenção da Polícia, neste caso não a Polícia Nacional mas a Polícia do regime. Sim, que com Eduardo dos Santos a Polícia não está ao serviço do Povo.
Por Orlando Castro
O protesto envolvia dez movimentos contestatários reunidos no autodenominando Conselho Nacional dos Activistas de Angola, que, julgando estarem num Estado de Direito cujas autoridades cumprem a Constituição, além de críticas à política do Executivo, exigiam a demissão do Presidente da República, José Eduardo dos Santos.
A manifestação estava agendada para as 15 horas com concentração no largo 1º de Maio, no centro de Luanda. Contudo, o acesso ao espaço foi vedado pelas autoridades, entre elementos da polícia regular e de intervenção. De novo, e como se previa, a razão da força dinamitou a força da razão dos que querem ser livres.
Estes elementos das força de segurança impediram e dispersaram a concentração de grupos de manifestantes próximo daquele largo, mas com acções repressivas aparentemente menos violentas do que as observadas em protestos anteriores.
Ainda assim, segundo relato feito por Raúl Mandela, do Conselho Nacional dos Activistas de Angola, cerca de 15 jovens terão sido detidos durante o dia e dez foram feridos pela polícia.
Detidos porque, refira-se, queriam pôr em prática o direito de manifestação consagrado na Constituição mas considerado pelo regime como crime contra a segurança do Estado, e feridos porque tropeçaram nos cassetetes e outros instrumentos decorativos da Polícia do regime.
O desemprego, a falta de habitações e de terrenos para construir, mas também de água potável, eram assuntos sobre os quais estes dez movimentos pretendiam apelar para a reflexão do povo, conforme se pode ler nos panfletos distribuídos pela capital angolana, a convocar a manifestação.
Por outro lado, reafirmam que os dirigentes do MPLA, no poder desde a independência em 1975 e presidido, tal como a República, desde 1979 por José Eduardo dos Santos, “não se preocupam em dar emprego aos angolanos” e acusam “portugueses e brasileiros” de ficarem com postos de trabalho na restauração, hotelaria ou construção civil.
Os manifestantes ameaçavam ainda levar o protesto até ao Palácio Presidencial, cujo inquilino e dono está no poder há 35 anos sem nunca ter sido nominalmente eleito, área que esteve hoje fortemente guardada por dezenas de elementos da Unidade de Guarda Presidencial (UGP).
UGP que tinha informações de que os jovens preparavam um golpe de Estado, usando para isso diverso armamento camuflado nos telemóveis, nos panfletos e sobretudo na mente.
Interpretado como um aviso sobre esta manifestação, o ministro do Interior, Ângelo Veiga Tavares, recomendou, na segunda-feira, firmeza e vigilância redobrada face a “reiteradas e veladas” tentativas de alteração da ordem democrática e constitucional por parte de algumas forças políticas.
É evidente que, para além de o paradigma democrático e constitucional do ministro ser o mesmo da Coreia do Norte, o regime temia que os mísseis escondidos nos telemóveis e as Kalashnikov camufladas nos bolsos dos manifestante pudessem servir para um golpe sanguinário.
Por ser perito em golpes sanguinários, recorde-se o 27 de Maio de 1977, o MPLA cuidou de cortar o mal pela raiz. Tudo, é claro, a bem da democracia e do Estado de Direito que Angola não é.
Ângelo Veiga Tavares referiu na altura, sem apontar nomes (já não tem à mão Jonas Savimbi ou Nito Alves), que algumas dessas forças, usando artifícios antidemocráticos, têm tentado fazer em Angola “uma réplica do que aconteceu em alguns países vizinhos”. Estaria, certamente, a pensar no Burkina Faso.
Estas manifestações anti-governamentais, que se sucedem desde 2011, terminam por norma com várias detenções e confrontos com a polícia, segundo a versão oficial. Na verdade terminam com feridos e desaparecidos (mortos?), até porque o regime tem um acordo com os famintos jacarés do Bengo, por exemplo, a quem deve obrigatoriamente alimentar com a carne dos… inimigos.