Angola deverá emitir, até finais do terceiro trimestre deste ano, o passaporte biométrico, exigido internacionalmente, sob pena de comprometer a deslocação de cidadãos nacionais para o exterior, declarou o director dos Serviços de Migração e Estrangeiros (SME), João António da Costa Dias. O anúncio anterior, honrando o ADN do MPLA, indicava que entraria em funcionamento no primeiro semestre de… 2017.
Agora, o director do SME, respondia a preocupações de deputados da III Comissão da Assembleia Nacional para as Relações Exteriores, Cooperação Internacional e Comunidades Angolanas no Exterior, numa visita à sede da instituição.
À delegação parlamentar, encabeçada pela presidente da comissão, Josefina Diakité, o director do SME esclareceu que o Estado angolano está obrigado a introduzir o controlo biométrico, no quadro da defesa da sua soberania e da segurança internacional.
Questionado sobre a falta de documentos de identificação de nacionais no estrangeiro, João António da Costa Dias respondeu que a demanda tem sido atendida, apontando como dificuldades o facto de muitos dos requerentes apresentarem documentos falsos.
Explicou que existem indivíduos com passaportes caducados, mas tratados há vários anos mediante bilhetes ou cédulas falsas, o que condiciona a sua renovação.
Segundo o director do SME, está em curso a verificação da autenticidade, junto da Direcção de Arquivo e Identificação Civil, de processos provenientes da diáspora, com destaque para a Alemanha, França e Bélgica.
O comissário principal de migração apontou como principais desafios do sector o controlo das fronteiras, particularmente, com a República Democrática do Congo (RDC), na ligação com as Lundas (Norte e Sul), pela sua extensão da fronteira comum.
Informou também que os cidadãos da Serra Leoa, da Libéria e Rwanda perderam o estatuto de exilados devido a estabilidade política alcançada nos respectivos países, mas os interessados em permanecer poderão requer o de residentes.
O plano estratégico apresentado aos deputados propõe um conjunto de reformas, para tornar o serviço migratório uma referência nacional e regional no combate ao crime de promoção e auxílio à imigração ilegal.
Propõe-se, também, imprimir maior rigor na emissão de documentos migratórios, elevar a moral e capacitação dos efectivos, assegurar a protecção internacional a indivíduos que dela carecem e melhorar os métodos de gestão e organização.
O SME conta com 7.041 efectivos, destacados em 18 delegações provinciais, 61 municípios, 51 postos de fronteira, 44 de travessia, 48 de contenção, 10 postos de detenção de estrangeiros ilegais, um centro de instalação temporária e correspondência com 72 postos consulares.
Os deputados foram informados da vigência de Acordos de isenção de vistos em passaportes ordinários com a África do Sul, Moçambique, Namíbia e Zâmbia, bem como do visto de turismo com o Benin, Botswana, Cabo Verde, Ilhas Maurícias, Rwanda, Ilhas Seicheles, Zimbabwe e Singapura. Desta lista estão outros 61 países com regime de isenção e simplificação de documentos de entrada.
No documento apresentado, o SME propõe-se, ao mesmo tempo, zelar pela segurança e soberania do país, criar facilidades à entrada de investidores estrangeiros, contribuir para a diversificação e o desenvolvimento económico de Angola.
A estratégia visa a gestão dos fluxos migratórios, o combate da imigração irregular e contribuir para a segurança e a estabilidade do país, acautelando os efeitos nocivos da migração.
Na mesma esteira, a estratégia prevê também criar um ambiente propício para o incremento do comércio, investimento e do turismo.
Um dos constrangimentos no controlo da permanência de estrangeiros residentes ou refugiados apresentados, relaciona-se com a existência de problemas urbanísticos e toponímicos de muitos bairros e cidades.
Existem em Angola 145 mil estrangeiros, 22.416 dos quais residentes, sendo 12.345 portadores de vistos de permanência temporária, 356 investidores, 22.785 refugiados e 30.149 requerentes de exílio.
O SME considera serem os seus maiores desafios a mobilização de recursos financeiros para a implementação do seu plano de modernização e excelência, com vista a melhorar as condições de trabalho, construção e apetrechamento de novas infra-estruturas.
Refere ainda a necessidade de equipar a instituição de meios de enfrentamento à imigração ilegal, tráfego de seres humanos e crimes migratórios e transfronteiriços.
Regresso a um passado recente
No dia 22 de Junho de 2019, o então ministro do Interior, Ângelo da Veiga Tavares, indicou que o Governo de Luanda pretendia introduzir, até ao final do ano. A 19 de Fevereiro o director do SME prometia que o Governo previa começar a emitir, em breve, passaportes com medidas de segurança reforçadas, incluindo dados biométricos.
Ângelo da Veiga Tavares, que discursava nas cerimónias comemorativas do 40º aniversário do Ministério do Interior, salientou que o processo tinha vindo a ser adiado desde 2016, tendo estado inicialmente previsto que a introdução de chips nos passaportes ocorreria no primeiro semestre de 2017.
O passaporte electrónico, ou biométrico, inclui um chip que armazena os dados identificativos do titular. Segundo Ângelo Veiga Tavares, a utilização de passaporte electrónico é uma obrigação que deve ser cumprida por todos os países membros da Organização Internacional da Aviação Civil.
O documento é identificado por um símbolo, estabelecido internacionalmente e estampado na capa e que, entre outras componentes, inclui um dispositivo electrónico no qual se encontra armazenada a informação biográfica e biométrica do seu titular.
O passaporte electrónico integra (integrará) uma nova geração de dispositivos, que vão do reconhecimento facial à integração de um chip.
Recapitulando. Então o que era “aquilo” que o Governo noticiou em 17 de Abril de 2015 quando disse que que nesse mês as entradas e saídas do aeroporto internacional de Luanda se iria processar automaticamente, em 12 segundos, com a entrada em funcionamento, do novo sistema electrónico de controlo, incluindo os dados biométricos?
Gil Famoso, que na altura falava à imprensa no final da reunião do Conselho de Defesa Nacional, orientado pelo Presidente João Lourenço, que analisou a situação política e militar do país, disse que seria apresentada “muito em breve” a proposta de alteração da lei de passaportes, para que se evolua do documento actual para o biométrico, com maiores medidas de segurança.
“A mudança vai conter três níveis de segurança visual, verificáveis através de equipamentos electrónicos e de segurança e mediante técnicas de conformação específicas e de técnicas forenses”, explicou o responsável.
Gil Famoso garantiu que a emissão de novos passaportes não iria, recorde-se, implicar alteração nos preços da nova taxa, fixados este ano nos 30.500 kwanzas (86 euros).
“Não há perspectivas de se elevar o preço do passaporte com a implementação do passaporte biométrico, porque o que estará em causa para a determinação da taxa são os custos de produção e tudo quanto está em volta do seu processo de produção”, frisou.
Sobre a polémica levantada à volta do aumento de preços, dos 3.000 kwanzas (8,40 euros) para 30.500 kwanzas, o responsável do serviço migratório angolano reconheceu que a subida foi “bastante acentuada” e admitiu não ter havido “uma prévia informação satisfatória”.
“Mas também reconhecemos que o valor anterior da taxa não cobria sequer o custo de produção da cédula. Julgamos que a actual taxa se adequa aos custos de produção do passaporte, aos custos de personalização e a todos os serviços para que ele chegue até ao cidadão”, referiu.
A mesma treta de outros tempos
A entrada e saída do aeroporto internacional de Luanda vai processar-se automaticamente, em 12 segundos, com a entrada em funcionamento do sistema electrónico de controlo, dizia o Governo do MPLA (não poderia ser outro) em Abril de 2015.
A informação foi confirmada por fonte do Serviço de Migração e Estrangeiros (SME), acrescentando tratar-se de um sistema de leitura electrónica de passaportes idêntico ao já utilizado nos aeroportos em Portugal, desenvolvido pela mesma empresa portuguesa Vision-Box.
Denominado em Angola por “Passa Fácil”, o Aeroporto 4 de Fevereiro seria, foi, será (o Departamento de Informação e Propaganda do MPLA que escolha!) o primeiro a implementar o funcionamento deste serviço, estando previsto o seu alargamento posterior a outros postos de fronteira do país.
Os cidadãos angolanos, de acordo com a mesma informação, também teriam acesso à nova funcionalidade, mas neste caso ficariam obrigados a um pré-registo, uma única vez, por não possuírem passaporte electrónico.
O sistema consistia na análise dos dados do passaporte electrónico, confrontando automaticamente, no caso de estrangeiros, com o tipo de visto emitido registado na base de dados, e com a análise e comparação de dados biométricos.
“Teremos cerca de uma dezena de equipamentos [individuais e automáticos] na entrada e outros tantos na saída. O que equivale a dizer que poderemos processar a entrada e saída de dez pessoas a cada 12 segundos”, explicou a mesma fonte.
Deixaria assim de haver necessidade de contacto com agentes do SME nos actos migratórios, numa tentativa das autoridades de “desburocratizar” o processo, até então feito exclusivamente de forma manual. Esta situação provocava longas filas de espera, nomeadamente à chegada de voos de Portugal, como facilmente se observava no posto fronteiriço do aeroporto de Luanda.
Biometria também para matumbos
O ministro da Justiça e dos Direitos Humanos, Francisco Queiroz, admitiu no dia 27 de Setembro de 2018, em Luanda, que milhares de crianças em Angola continuam sem registo de nascimento sendo objectivo do Governo, a “médio prazo”, inverter a situação.
Há quantos anos ouvimos estas promessas? “Xé menino”, desde o tempo do antigamente…
Em declarações aos jornalistas, no final de uma reunião que manteve com os embaixadores dos Estados membros da União Europeia em Angola, o governante referiu que decorrem trabalhos no intuito de, a médio prazo ou no final de legislatura, poder “‘zerar’ este número”.
Recorde-se que A Assembleia Nacional aprovou em 26 de Fevereiro de… 2015, por unanimidade, a Lei de Simplificação de Registo de Nascimento, o que (supostamente) impede situações de duplo registo.
Em declarações à imprensa, à saída da sessão parlamentar, o então ministro da Justiça, Rui Mangueira, disse que o diploma inovava aspectos fundamentais no processo de registo de nascimento, nomeadamente com a introdução da recolha de dados (cá está a Pedra Filosofal) biométricos.
“Para evitarmos o duplo registo, que tem estado a acontecer um pouco por todo o país, por uma série de razões, através da recolha da face e da íris, para termos a certeza de facto dos dados que estamos a recolher relativamente aos cidadãos”, frisou.
Segundo o então ministro, a introdução da recolha de dados biométricos facilitará igualmente o processo de obtenção do Bilhete de Identidade.
Um estudo sobre o registo civil nos municípios de Cambulo, Cuango e Chitato, concluiu que os cidadãos eram obrigados a pagar até 35 euros para terem acesso ao registo ou Bilhete de Identidade, que devia ser gratuito.
Em causa estão os resultados do “Estudo de Caso sobre o Registo Civil” em três municípios da província da Lunda Norte, no leste de Angola, a mais de 1.200 quilómetros de Luanda, realizado em Outubro de 2017 pela Organização Não-Governamental angolana Mosaiko – Instituto para a Cidadania.
Folha 8 com Angop