Não ouvem! Não ouvem! Não diga o contrário, senhor Presidente da República, pois esta é a realidade, nua e crua, com o agravar da vida do cidadão, principalmente, os 20 milhões de pobres. A sociedade angolana está enferma, o combate à corrupção é necessário, mas a boçalidade, a selectividade, a partidocracia, no seu combate, não traz os ganhos desejados pela sociedade, dada a sua complexidade, enquanto questão política, para à consolidação da democracia em Angola.
Por William Tonet
Muita dessa gente, maioritariamente despreparada, que o rodeia e idolatra, está a afundar o país e a arrastá-lo a si, aproveitando a cartilha do ódio e da vingança selectiva, para um lamaçal de onde, se nada fizer de ousado, dificilmente, sobreviverá, fora do colete de ditador, mais a mais dispondo, já, de super-poderes constitucionais, atípicos, distantes de um sistema presidencialista puro, sustentado no sufrágio universal, directo e nominal (inexistente no caso angolano).
A Constituição de 2010, art.º 109.º (“É eleito Presidente da República e Chefe do Executivo o cabeça-de-lista pelo círculo nacional, do partido político ou coligação de partidos políticos mais votado no quadro das eleições gerais, realizadas ao abrigo do artigo 143.º e seguintes da presente Constituição), mostra estarmos diante de um sistema parlamentar e se dúvidas houver, basta revisitar a blindagem do n.º 3 do art.º 114.º (“A eleição para o cargo de Presidente da República é causa justificativa do adiamento da tomada do assento parlamentar”), cuja violação flagrante, a não ser impugnado, mais grave, sendo aceite, pelos deputados (não abdicou do único cargo, o de deputado, pelo qual foi eleito, pelo voto popular, vide art.º 143.º CRA), denota, a aceitação de o actual Presidente da República, ser, ao mesmo tempo deputado e quiçá, o verdadeiro presidente da Assembleia Nacional, tal como no tempo de partido único, o Presidente da República Popular de Angola era, ao mesmo tempo, o Presidente da Assembleia do Povo e presidente do MPLA.
Nesta senda, ninguém, que não abdique, “ab initio”, por iniciativa própria, de se cobrir com lençóis com as cores da ditadura, com tonalidades de poderes excessivos, pode ser julgado com a higiene mental de democraticidade.
Na minha opinião, e ela vale o que vale, o Presidente da República, abriu, voluntária ou involuntariamente, muitas frentes de “combate”, inclusive com quem colocou as mãos no fogo por si, não o conhecendo tão bem, até ser jogado para o ostracismo institucional, como o vice-Presidente da República, Bornito de Sousa; o MPLA, partido que o suporta ideologicamente; a Economia, ameaçando tudo e todo tecido empresarial, com a agravante de meter medo ao DINHEIRO; Justiça, domesticando-a, amordaçando-a, selectiva e bajuladoramente, levando-a a actuar, na marginalidade da Constituição e da Lei.
Ninguém em sã consciência pode esquecer o passado sinuoso de todos os integrantes do único grupo (considerado por alguns de quadrilha) ideológico, que discriminatoriamente governa o país desde 1975, com péssimos resultados, sobretudo mas não só, sociais e económicos.
E quando alguém fala, sugere, aconselha o que recebe em troca?
Arrogância! Petulância!
Não são modestos, nem humildes e, o pior, é que nem parecem bestiais, pois verdade ou mentira o estado calamitoso de Angola em que tudo foi destruído; tecido industrial (havia um parque produtivo), agrário (éramos primeiros exportadores mundiais, em muitos produtos, até 1974) e pecuário (auto-suficientes), incrimina e não deixa margem de inocência aos incompetentes e culpados ideológicos.
A única diferença é de uns serem mais incompetentes do que outros. Tanto que, para não variar, estão identificados com os maus ideólogos do neoliberalismo inglês e americano e a mediocridade económica e financeira ocidental das organizações de Bretton Woods.
A cegueira dos cifrões, assente nos impostos criminosos, não é sinónimo de boa arrecadação de receitas, pelo contrário, demonstra uma traição aos pobres e mais desfavorecidos que, mesmo no desemprego, são os responsáveis pelo pagamento de um financiamento externo, que, na realidade, mais beneficia uma elite e suas orgias, principescamente alojadas, para tristeza da maioria patriótica, nos três órgãos do poder: legislativo, executivo, judicial.
CAMINHO SEGUE A META DOS 100 USD POR 100 MIL KWZ
O câmbio vai, devido à incompetência, qual andarilho, escalando, escalando, desreguladamente, montanhas de um desnorte anunciado da política económica do Executivo.
O pico de 70 mil kwanzas, atingido, neste momento, demonstra o boçalismo programático do Banco Central (BNA – Banco Nacional de Angola), no caminho de USD 100,00, passar a valer, no final do ano, 100 mil Kwanzas.
E o drama só não é pior, hoje, por as ruelas populares (kinguilas e kinguilos), curarem de regular o que resta de esperança cambial, para uma maioria de empreendedores que encontra nesta marginalidade financeira (mercado informal de divisas), a chama acesa para continuidade da escassa actividade comercial.
Não viso a idoneidade do governador do Banco Nacional, nem discutir as suas posições accionistas, em bancos comerciais, mas uma coisa temos de reconhecer, ele só regressou ao cargo de governador do BNA, de onde já havia feito muita borrada (consulado do presidente JES), primeiro, por ser considerado banqueiro profissional, pelo actual inquilino da Cidade Alta, segundo, como muitos advogam, partilhar posições accionistas, com o Presidente da República, no banco BAI, com acções adquiridas, por este, administrativamente (não houve entrada de capital vivo, fresco, dinheiro), no quadro da política de “Acumulação Primitiva do Capital”, institucionalizada pelo ex-presidente Eduardo dos Santos, para a criação de uma burguesia angolana, mas identificada exclusivamente com o MPLA.
Esta bagunça mutila e afunda o tecido social e económico, carente de uma verdadeira reforma extra-partidária.
No actual contexto, sempre abraçará a suspeição uma caminhada isolada do Presidente da República, no combate aos crimes de corrupção, por nunca ter renunciado aos banhos das mordomias, ladeado por “amigos-camaradas” de ontem, mas colocados, selectivamente, hoje, na marginalidade, como “inimigos-camaradas”, por conveniência do poder.
A credibilização de uma verdadeira batalha das muitas que se impõem, contra a corrupção, exige a coerência, a ponderação e a humildade para dela se retirar os ganhos necessários para o resgate da moral e da ética, principalmente, dos agentes públicos, na Função Pública, através de uma ampla integração de convergências dos autores partidários e políticos.
As sublevações sociais, os distúrbios, as destruições de bens móveis e imóveis, no Chile, no Peru, no Uruguai, no Líbano, na Tunísia, pela adopção cega de políticas económicas criminosas, muitas vezes impostas pelo FMI, que retiram direitos sociais aos mais pobres, impondo-lhes uma cadeia de impostos, deveriam ser levadas em causa, pelo Titular do Poder Executivo de Angola, principal visado, que infelizmente, não tendo contra-poderes de fiscalização ou “check and balance”, inclusive do poder legislativo (Assembleia Nacional), administra poderes absolutos (distante de um democrata), sem paralelo em nenhum sistema presidencialista ou parlamentar, no mundo.
É verdade que muitos, parlamentares, inclusive com capacidade intelectual e académica, fazem da omissão, da cumplicidade, uma forma de estar, melhor, continuar, bajuladoramente, traindo ou vendendo, até a própria mãe, tudo para continuar nos corredores do poder, endeusando o novo chefe, para obtenção de vantagens.
Por isso, agora, covardemente, já não tendo força, nem poder, muitos deputados, dirigentes do MPLA, comentadores, se atiram, “malandramente” contra José Eduardo dos Santos acusando-o de ser o único responsável pelos desvarios de uma equipa, um partido: o MPLA.
O País precisa, urgentemente, de uma verdadeira reforma mental, antes mesmo da económica, para extirparmos vícios insanáveis alojados no poder, através da constituição do MPLA, emprestada a República Popular de Angola, que vigorou, até 2010.
Um Estado nascido sem Constituição republicana, como foi o de Angola (a dita constituição de 1975, foi aprovada exclusivamente pelo comité central do MPLA e promulgada pelo presidente do MPLA, quando deveria ser pelo Presidente da República), é pobre, com a agravante da maioria da classe política ser cúmplice, dos desvarios cometidos ao longo dos 44 anos de poder absoluto e discriminatório, contra os cidadãos inocentes.
E, por tudo isso, uma reforma mental se impõe, urgentemente, visando a constituição política da primeira e imparcial Assembleia Constituinte, para repensar Angola e todos os seus principais instrumentos jurídicos.
NOVA LEI DE CRIMINALIZAÇÃO DA CORRUPÇÃO
O mundo não sendo estático, nem as leis imutáveis, por integrarem a lógica da positividade do direito, podem ser revolucionadas em função de novos contextos sócio-políticos. Se aqui, século XXI, nada muda, nem com a transição presidencial, então, retire-se o cavalinho da chuva, por não existir vontade política real de mudança.
O fio condutor deste pensamento assenta numa primeira manifestação do Presidente da República, João Lourenço, quando afirmou, ser avesso à bajulação e pretender liderar uma séria cruzada anti-corrupção, mas não resistiu à tentação de receber mimos, “untagens” idolatrias de todos quantos nunca antes o viram com a estrela de líder visionário.
O chefe de Estado parece, agora, deleitar-se com a concentração de poder, que o torna o STA (senhor todo absoluto), ou DDT (dono disto tudo) sem oposição e pressão de nenhum outro órgão de soberania, daí o adiamento, “sine die”, da tão almejada reforma do sistema judicial, que o tornaria mais imparcial e menos partidocrata, bem como da Constituição.
Por esta razão, a maioria da intelectualidade, sedenta de água natural e justiça, aguarda a hora, dos políticos do MPLA, deixarem de acreditar nas próprias mentiras e serem escravos das suas palavras, como forma de impedirem o contínuo resvalar do país ao precipício, caso contrário, que declarem, formalmente, o retorno a ditadura.
Num país civilizado, respeitador das suas tradições e costumes, não se iniciaria um combate aos crimes de corrupção, reconhecidamente um cancro na sociedade e economia, liderado e instalado à 44 anos, exclusivamente, pelo MPLA, sem a celebração de um “Pacto de Regime”, assinado entre todas as forças políticas, os representantes dos empregadores, os sindicatos de trabalhadores e a sociedade civil, para se encontrar uma saída para a crise.
Este (Pacto) permitiria, não se ficar atolado ao passado e a cega caça às bruxas, contra os delapidadores do erário público, por sinal, membros da mesma gangue política, mas analisar, também, os erros nefastos de campanhas anteriores, ocorridas na Espanha, Itália, Brasil, entre outros países, onde se privilegiou a prisão de altos membros da classe política, principalmente, contrária e do empresariado, resultando em desempregos astronómicos, fecho de empresas e convulsões sociais.
Em Espanha o juiz Baltasar Garzón, que gostava da mediatização, chegou a expedir um mandado de prisão, contra um presidente estrangeiro, Augusto Pinochet, mas depois teve de abandonar a magistratura, face aos excessos cometidos. Igualmente ocorreu na Itália com as “Mani Pulite” (Mãos Limpas), operação contra a corrupção, que abalou a Itália, ao longo de dois anos e dez meses – Fevereiro de 1992 a Dezembro de 1994 -, liderada por um juiz considerado próximo da extrema-direita, Antonio Di Pietro, que condenou, muitas vezes sem provas, altas figuras políticas, grandes empresários, a custa da maior onda de desemprego, mais de 5 milhões e o encerramento de empresas, cerca de 1.500. Muitas das investigações assentavam não na lei mas no viés ideológico, em clara violação a Constituição e a Lei, ao ponto de terem sido extintos partidos históricos como o Partido Democrata Cristão e o Partido Socialista, abrindo caminho à ascensão de um ilustre desconhecido na política, ao cargo de primeiro-ministro, o magnata da comunicação social e do futebol, Silvio Berlusconi da extrema-direita.
No Brasil, o mesmo caminho seguido pelo juiz de direita, Sérgio Moro, de alegado combate à corrupção visou a classe política de esquerda, mais concretamente a prisão do ex-presidente, Lula da Silva, para este não concorrer a um terceiro mandato. Foram presos alguns corruptos, comprovadamente, mas também, muitos inocentes e os resultados não podiam ser piores, com os próprios procuradores e juiz da Operação Lava Jato a praticarem actos de corrupção, desviando dinheiro apreendido e causando, até hoje, mais de 12 milhões e quinhentas mil pessoas.
O momento tem demonstrado que nem sempre as formas clássicas de combate à corrupção, com a aplicação de medidas restritivas de liberdade, após condenação, dos corruptos, traz os resultados desejados pelos países.
Angola poderia liderar uma reforma legal e colocá-la à disposição do mundo jurídico, distanciando-se das habituais cópias do Ocidente, alterando o conceito de condenação, que se resume à reclusão dos réus.
Quando um corrupto é condenado pelo desvio de milhões de dólares a sociedade espera uma reparação, mas nem sempre ela chega, com a sua colocação atrás das grades. Nessa condição, muitos conseguem manter escondido os milhões, que se multiplicam, durante os anos de reclusão e a devolução do desviado nunca chega a beneficiar os lesados.
Não seria de descurar, uma revolução da norma jurídica, enquanto corpo sistematizado de regras de conduta, caracterizadas pela coercitividade e imperatividade do ordenamento jurídico, nos actos de coacção da conduta, dos sujeitos.
Não seria considerado displicente, se a compreensão da norma jurídica e a sua eficácia alterasse o principio da sanção, no tocante aos crimes de corrupção, levando a reformas nos artigos de condenação no Direito Penal e Código de Processo Penal, angolanos, conferindo-lhes blindagem e eficácia, para transformar a reclusão de quem se tenha aboletado de milhões e milhões de dinheiro público, condenando os réus à devolução, em espécie, mensal, trimestral, semestral e anual de quantia certa, arbitrada em sentença, diferente do rito de indemnização.
Assim, um réu, com actividade empresarial, condenado a uma pena de 12 anos, ao invés de ficar refastelado, numa cela de cadeia pública, seria obrigado a:
a) garantir 85% de trabalhadores, com contratos por tempo indeterminado;
b) implantar novas sucursais pelo país, em pontos estabelecidos pela justiça;
c) entrega de quantia certa, mensal, aos cofres públicos;
d) patrocínio de uma unidade hospitalar;
e) patrocínio de uma unidade escolar pública.
Desde logo essa forma de encarar a norma jurídica e um crime tão escorregadio como a corrupção, poderia conferir mais estabilidade social, sem afastar o suporte fáctico e a consequência jurídica (condenação), por integrar a imperatividade, comportamento obrigatório das sanções pelos sujeitos; a generalidade, aplicada a todos destinatários; a abstracção, dirigida a todas situações e factos abstractos; a hipoteticidade, estabelecendo condutas a adoptar no futuro, sempre que as mesmas venham a ocorrer ou quando ocorrerem.
Neste caso deve-se ter em linha de conta, que a sanção não pertence aos elementos que definem a norma jurídica:
a) suporte fático
b) consequência jurídica
pois trata-se de decorrência da necessidade do comando prescritivo do direito, por a força legal ser um instrumento de realização do direito, bem como a existência da regra. Daí ser importante averiguar a compatibilidade de norma jurídica nova, com outras normas do ordenamento jurídico vigente.
Isto por ser difícil a detecção dos crimes de corrupção, tal como dizia o ex-secretário geral da ONU, à época da implementação da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção: “(…) Com efeito, a corrupção tem três características que a diferenciam dos demais ilícitos e dificultam a utilização de técnicas convencionais de repressão. Em primeiro lugar, a corrupção é invisível e secreta: trata-se de um acordo entre o corrupto e o corruptor, cuja ocorrência, em regra, não chega ao conhecimento de terceiros. Além disso, a corrupção não costuma deixar rastros: o crime pode ser praticado mediante inúmeras condutas cuja identificação é dificílima, e, ainda que provada uma transacção financeira, é ainda necessário demonstrar que o pagamento tinha realmente por objectivo um suborno. Por fim, a corrupção é um crime sem vítima individualmente determinada – a vítima é a sociedade -, o que dificulta a sua comunicação às autoridades, há que não há um lesado directo que se sinta obrigado a tanto.”
A sociedade angolana está enferma, o combate à corrupção é necessário, mas a boçalidade, a selectividade, a partidocracia, no seu combate, não traz os ganhos desejados pela sociedade, dada a sua complexidade, enquanto questão política, para à consolidação da democracia em Angola.
Ninguém pode descurar a multifacidade deste fenómeno, poder criar órgãos altamente enrodilhados e complexos, com danos no tecido social de difícil detecção e reparação, impondo-se formas mais inteligentes de a estancar, dada as suas ligações internas, aos órgãos judiciais, estatais, legislativos, as instituições regionais e internacionais, que podem, num toque de mágica, face aos inúmeros conhecimentos dos envolvidos, condicionar apoios financeiros e outros ao país.
Por esta razão defendo que a selectividade das condenações, num sistema judicial viciado, causa, na maioria das vezes, por corrupção de juízes e procuradores, mais ou iguais prejuízos, que os causados pelos corruptos. Finalmente, não me sinto regozijado, havendo 10 corruptos na cadeia, se em consequência disso, haver mais de 400 mil desempregados, segundo estatísticas das centrais sindicais: UNTA e CGSILA, 1.250 empresas encerradas, alta inflação, taxa de câmbio flutuante e ausência de dinheiro no circuito bancário comercial.
Pensemos Angola, em primeiro lugar, em segundo lugar, no que deve ser mudado, tendo em conta os nossos costumes e tradições e não com a obsessão das medidas e ajuda do Fundo Monetário Internacional, que se fossem boas, existiam, no mundo, pelo menos 20 países, sendo cinco de África, como exemplos de economia regulada, direitos sociais e previdenciários robustos e democracia plena.