Dalila Mateus era autora de uma obra de referência, “A PIDE/DGS na guerra colonial 1961-1974”, e, em conjunto com Álvaro Mateus, de várias investigações mais recentes sobre a guerra que assolou Angola nos anos pós-independência.
Olivro sobre o papel da PIDE na guerra colonial apresentava a originalidade quase iconoclasta de mostrar as diferenças entre o comportamento da mesma polícia na metrópole e nas colónias.
Sem nunca desvalorizar as violências e torturas da PIDE em Portugal, a historiadora mostrava como a polícia da ditadura conseguia ser ainda mais brutal, logo que deixava de estar submetida a factores de pressão política, como era o da opinião pública internacional ou mesmo, com os limites próprios da mordaça censória, da opinião pública portuguesa.
Juntamente com o comandante Costa Correia, oficial que obteve a rendição da PIDE em 26 de Abril de 1974, Dalila Mateus concedeu em 2005 uma entrevista à RTP Memória, que constituiu uma oportunidade única para tornar acessíveis a um público mais vasto o resultado da sua minuciosa investigação arquivística e da sua paciente recolha de testemunhos.
Dessa entrevista, realizada apenas com um propósito de divulgação, resultou um interessante e inovador cruzamento de informação, entre a pesquisa de Dalila Mateus, que indicava a relação muito próxima entre Spínola e o inspector da PIDE Coelho Dias durante a guerra colonial, e a revelação de Costa Correia sobre a nomeação do mesmo Coelho Dias pelo mesmo Spínola, no dia 26 de Abril, para o cargo de director de uma PIDE que, na concepção de Spínola, devia manter-se em funções com alguns retoques cosméticos.
Igualmente significativa é, na mesma entrevista, a constatação por Dalila Mateus do paradoxo que constituiu a dissolução da PIDE na metrópole, sob a pressão irresistível da rua, e a sua manutenção em funções nas colónias, cumprindo-se o programa spinolista de retoques cosméticos precisamente no terreno em que a PIDE mais se tinha excedido em brutalidade e em violação sistemática de direitos humanos.
Posteriores ao livro sobre o papel da PIDE, foram outras obras de Dalila Mateus em co-autoria com seu marido, Álvaro Mateus, também falecido há pouco mais de um ano: “Angola 61. Guerra colonial: causas e consequências”; “Nacionalistas de Moçambique. Da luta armada à independência”; e “Purga em Angola”.
No livro “Purga em Angola”, dissecam ambos os autores os acontecimentos de 27 de Maio de 1977, demonstrando a responsabilidade do então presidente da República Popular de Angola, Agostinho Neto, no massacre que então vitimou milhares de opositores, aglutinados em torno da figura carismática de Nito Alves.
Reagindo a esse livro, a viúva de Agostinho Neto, Maria Eugénia Neto, insultou Dalila Mateus numa entrevista publicada em 5 de Janeiro de 2008 no semanário “Expresso”. Do insulto resultou um processo judicial, em que Dalila Mateus obteve a condenação da viúva do antigo presidente angolano.
O funeral realiza-se amanhã, dia 1 de Novembro, às 10,15 horas, da Basílica da Estrela (onde o corpo se encontra em câmara ardente) para o Cemitério do Alto de S. João, em Lisboa.
Fonte: RTP