A analista Lucie Villa, que na agência de notação financeiro Moody’s, segue a economia de Angola, considera que a implementação do programa do Fundo Monetário Internacional (FMI) e o ritmo das reformas estruturais serão dois dos principais aspectos a acompanhar em 2019.
“Todos os desenvolvimentos no petróleo são importantes, mas a nossa perspectiva é que a produção de petróleo vai recuperar, ajudando o Governo, e o que será também importante é o âmbito e a profundidade das reformas que o Governo vai ser capaz de implementar, além do programa com o FMI”, disse Lucie Villa.
Em declarações à Lusa, a analista que segue a economia angolana vincou que “um programa com o FMI seria positivo do ponto de vista do crédito”, mas quando questionada sobre se isso será suficiente para melhorar o ‘rating’, três níveis abaixo da recomendação de investimento, Lucie Villa disse que só o andamento da implementação pode determinar uma mudança na avaliação da qualidade do crédito.
“Veremos o que contém o programa, mas é bom porque financia o Governo e normalmente é barato, mas também vem com condições em termos de reformas, por isso só quando virmos os termos do acordo é que podemos dizer o que pensamos”, afirmou a responsável.
A grande dificuldade, apontou, “é que as reformas são desenhadas para melhorar o ambiente empresarial, mas muitas vezes a questão é mais a implementação, porque é preciso ver se consegue acompanhar o ritmo que o Governo determinou, e aqui a questão permanece em aberto”.
O Programa de Financiamento Ampliado (Extended Fund Facility – EFF), que surge depois do acordo negociado pelo executivo angolano e o FMI, visa fundamentalmente a consolidação do ajustamento orçamental.
O programa de assistência financeira, que ficou aquém dos 4.500 milhões de dólares que chegou a ser apontado pelo governo angolano, foca-se na sustentabilidade fiscal, na redução da inflação, na promoção de um regime cambial mais flexível, na estabilidade do sector financeiro, mas também na “promoção do desenvolvimento humano, na reforma do sector público, na diversificação e no crescimento inclusivo”, explicou o director adjunto do FMI, Tao Zhang, numa nota divulgada no princípio de Dezembro por aquela organização.
E o que a Moody’s disse há dois anos foi…
A agência de notação financeira Moody’s estimava em Janeiro de 2017 que Angola iria enfrentar nesse ano maior instabilidade social, apesar do abrandamento da austeridade graças ao aumento da produção de petróleo, e previa um crescimento económico de 3%.
Num relatório sobre os “ratings” (classificação de risco) dos países da África subsaariana, a Moody’s disse na altura que “os países mais expostos ao risco de instabilidade social incluíam Angola, Camarões, República Democrática do Congo, Ruanda e Uganda”, recorrendo a indicadores como o tempo de permanência do Presidente no poder, a responsabilização política, os indicadores de estabilidade política, o Produto Interno Bruto “per capita” em paridade do poder de compra e o número de utilizadores da internet, entre outros.
Angola estava em 2017 a preparar o simulacro de eleições que, como previsto, permitiria ao MPLA acrescentar mais uns anos de governação aos 43 que já tem.
Ainda assim, a Moody’s mostrava-se mais optimista do que o Governo e do que o Banco Mundial, antecipando uma expansão económica de 3% para 2’17, depois de um crescimento estimado de 1,6%.
“Esperamos que o crescimento do PIB real de Angola suba para 3% em 2017, depois de 1,3% em 2016, apoiado num aumento da produção de petróleo e num abrandamento da consolidação orçamental”, lê-se no relatório.
O relatório sobre a África subsaariana, com o título “Perspectiva Negativa num contexto de stress de liquidez, baixo crescimento e risco político”, pormenorizava que “no final do ano de 2016, a Moody’s tinha revisto em baixa um terço dos 19 países analisados na região, em média em dois níveis, o que comparava com as 29 descidas nos “ratings” a nível global, representando 22% dos 134 países analisados” pela agência de notação financeira.
Cinco dos sete países viram na altura o “rating” descer, entre os quais estão Angola (B1 com Perspectiva de Evolução Negativa) e Moçambique (Caa3 com Perspectiva de Evolução Negativa), “têm uma Perspectiva de Evolução Negativa, sublinhando a visão da Moody’s de que as pressões que levaram à descida do “rating” vão persistir em 2017”, escreveram os analistas.
“As economias da África subsaariana vão continuar a enfrentar dificuldades de liquidez induzidas pelas matérias-primas em 2017, com défices orçamentais recorrentes em condições financeiras desafiantes”, comentava a vice-presidente da Moody’s e co-autora do relatório, Lucie Villa.
“Estes são constrangimentos importantes que vão continuar e que sustentam a nossa análise sobre a Perspectiva de Evolução Negativa para a África subsaariana, no geral”, acrescentou a analista.
A Perspectiva de Evolução Negativa é uma análise que a Moody’s faz sobre os próximos 12 a 18 meses, e antecipa geralmente uma revisão em baixa do “rating”.
Em média, a Moody’s antecipava para 2017 um crescimento económico de 3,5% nos países analisados nesta região, o que representava uma subida face aos 1,5% antecipados em 2016.
“No entanto, o valor vai variar significativamente na região; os países que estão dependentes das exportações de matérias-primas vão ver a sua actividade económica limitada em 2017”, lê-se no relatório.
Qualquer análise consciente e, por isso, racional, às consequências políticas e sociais da aposta que o regime do MPLA fez na economia de Angola aponta para que o país tenha “todos os ingredientes” para ver os jovens forçarem mudanças no regime.
O regime que aposta exclusivamente na razão da força acredita que essa estratégia é suficiente para manter na linha e em linha todos os que pensam pela sua própria cabeça. Estará enganado? Um dia destes vamos acordar à luz de uma “Primavera Angolana”? Ninguém sabe, nem mesmo os donos do regime, onde está o gatilho, a fagulha, o fósforo que vai desencadear o fim do nepotismo, da ditadura, da cleptocracia, do esclavagismo que, apesar das promessas da chega ao paraíso, continuam em todas as esquinas e, sobretudo, em todas as barrigas… vazias.
De facto, os ingredientes que vão originar a explosão, ou implosão, do país continuam todos cá, todos fazem parte do nosso quotidiano. Alto nível de desemprego, crescentes iniquidades sociais, crise na saúde, população jovem, mais envolvida do que há 10 ou 20 anos, e mais desperta para o que se passa no mundo, são rastilhos que um dia destes vão provocar convulsões.
Nos últimos 43 anos a economia, ou seja sobretudo o petróleo e os diamantes, esteve ao serviço exclusivo dos nobres donos do reino e não, como se poderia esperar, dos plebeus e escravos angolanos – a esmagadora maioria. E, como nos comprova a História, um dia destes os escravos vão revoltar-se e vão deixar de se comportar como passivos contratados para trabalhar nas fazendas coloniais, desta feita sob as ordens dos colonialistas do MPLA.
Se for verdade, e tem sido ao longo dos tempos, que o que acontece na economia é muito importante para determinar se a população fica mais reivindicativa ou não, é certo que a revolta vai sair à rua.
Folha 8 com Lusa