A Ordem dos Engenheiros de Angola defende a implementação gradual do sistema autárquico, com preponderância para as localidades que tenham entre dez mil a cem mil habitantes. Talvez fosse altura de a Ordem das Zungueiras de Angola também se manifestar. Desde que seja para concordar com as “ordens superiores” do MPLA, todos são livres e importantes…
A informação foi prestada pelo presidente do Conselho Fiscal da Ordem dos Engenheiros de Angola (OEA), Augusto Baltazar de Almeida, no final de encontro, à porta fechada, com o ministro da Administração do Território e Reforma do Estado, Adão de Almeida, e quadros seniores deste departamento ministerial.
De facto, é importantíssima a opinião do Comité de Especialidade do MPLA em que – tanto quanto parece – se transformou (ou sempre foi?) definitivamente a OEA.
Recorde-se que, como não poderia deixar de ser (ou podia?), a OEA atribuiu no dia 4 de Agosto de 2015, em Luanda, o “Primeiro Grau da Ordem” ao Presidente José Eduardo dos Santos como reconhecimento do seu engajamento na construção de infra-estruturas de engenharia no país.
O título representado por uma faixa, um diploma e um galardão de mérito foi recebido pelo ex-ministro dos Petróleos, engenheiro Desidério Costa, representando o Presidente José Eduardo dos Santos.
Ao efectuar a entrega do “Primeiro Grau da Ordem”, o então bastonário da OEA, José Dias, afirmou que as engenharias se sentiram privilegiadas pela modernidade, quantidade e qualidade de infra-estruturas que beneficiaram fruto do empenho do Chefe do Executivo.
José Eduardo dos Santos é formando em Engenharia de Petróleos pelo Instituto de Petróleo e Gás de Baku, Azerbaijão, uma das repúblicas da ex-União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS).
Quanto às eleições autárquicas, a OEA adiantou que a segunda variante aponta para um quadro autárquico em localidades cuja população varia entre os cem mil e a um milhão e quinhentos mil habitantes e num terceiro escalão com mais de um milhão e 500 mil pessoas.
Baltazar de Almeida disse ter sugerido o arranque do processo em regiões mais pequenas para se estender para as maiores.
A OEA entende que o futuro autarca deverá ser uma pessoa aceite e eleita pela população, conhecedora da realidade local e gestora, sem obrigações de títulos académicos, mas apoiado por um gabinete que o ajude a gerir a autarquia.
Enalteceu a prontidão dos engenheiros no “staff” do autarca para ajudar a resolver problemas como os ligados às infra-estruturas, comunicações, água, energia, saneamento básico e ambiente, para que as obras sejam mais duradouras e sustentáveis.
Baltazar de Almeida disse que a OEA propõe também várias acções a desenvolver na fase preparatória como o processo de formação, o perfil do autarca, a contribuição da Ordem dos Engenheiros no desenvolvimento local e para o bom funcionamento das autarquias.
De acordo com o Ministro da Administração do Território e Reforma do Estado, Adão de Almeida, o encontro serviu para a troca de informações e recolha de contribuições no quadro da auscultação para a implementação das autarquias no país, previstas para começaram em 2020.
O processo de auscultação iniciou-se a um de Junho e termina na terça-feira, 31 de Julho deste ano.
A UNITA, maior partido da oposição que o MPLA permite que exista em Angola, afirma que “o partido Estado continua a distrair as pessoas com conceitos, visões e terminologias”, que “subvertem a democracia”.
Isaías Samakuva considera “muito difícil e por vezes doloroso” o parto das autarquias em Angola, cuja primeira eleição está prevista (se, entretanto, o MPLA não mudar de ideias) para 2020.
“Ora dizem-nos não haver condições para realizar eleições autárquicas nos mesmos municípios onde já se realizam eleições gerais. Ora dizem-nos não haver infra-estruturas nos mesmos municípios onde já funcionam administrações municipais com gestores públicos que não representam as populações nem prosseguem os interesses públicos locais. Ora dizem-nos não haver recursos nos mesmos municípios onde produz riqueza nacional”, criticou Isaías Samakuva.
Para o líder da maior força política da oposição, “o tempo dos bairros sem saneamento básico, que se tornaram viveiros da malária e da cólera, acabou”, bem como o da falta de escolas “só porque os governantes desviam o dinheiro da educação”.
“O tempo das casas sem água potável canalizada e sem energia para iluminação acabou. O tempo dos administradores de um só partido, não eleitos pelo povo, acabou. O tempo dos roubos institucionalizados e do lixo a céu aberto, à vista de todos, sem pudor nem controlo, acabou”, afirma (com uma grande dose de ingenuidade política inerente à sua contínua luta pela sobrevivência) Isaías Samakuva.
A UNITA quer (se o MPLA deixar) que os seus quadros sejam “capazes de rejeitar com propriedade a noção de gradualismo territorial, na implementação das autarquias locais, identificar armadilhas na legislação proposta e compreender os mecanismos pelos quais o Estado financia as autarquias locais”.
Isaías Samakuva diz que é “prioridade número um” do seu partido “assegurar a institucionalização efectiva das autarquias obrigatórias, as autarquias municipais, em todo o país, em 2020, como anunciou o Presidente da República e combater a subversão do gradualismo que tem sido pregada dentro e fora do país”.
“Os angolanos todos, de Cabinda ao Cunene, devem ser informados e mobilizados para rejeitar as autarquias do MPLA (o único partido que governou o país desde a independência) e o seu gradualismo distorcido. Queremos as autarquias do povo, sem gradualismo distorcido”, diz Samakuva.
O que impõe o MPLA
Os presidentes de Câmara e restantes órgãos autárquicos em Angola vão ser eleitos para mandatos de cinco anos, mas só nas quartas eleições, previsivelmente em 2035, é que o processo deverá estar concluído em todo o país. Gradualismo, diz o MPLA.
Em causa está o princípio do gradualismo na implementação das autarquias, defendido pelo Governo e que está plasmado no seu pacote autárquico.
De acordo com a proposta de Lei de Organização e Funcionamento das Autarquias Locais, um dos seis documentos em consulta pública desde 1 de Junho, o período do mandato dos órgãos eleitos das autarquias locais, entre presidente da Câmara e eleitos à Assembleia Municipal, é de cinco anos.
A mesma proposta refere que o presidente da Câmara Municipal, bem como os secretários da câmara, os secretários comunais e de distrito urbano, designados pelo líder eleito do município, “exercem as suas funções em regime de exclusividade”, contrariamente aos eleitos à Assembleia Municipal, que ficam em regime de voluntariado, com direito a senhas de presença por reunião.
À Câmara Municipal cabe o poder executivo, enquanto a fiscalização é assegurada pelo plenário da Assembleia Municipal.
Actualmente, o poder local em Angola é garantido por administradores municipais designados pelos 18 governadores provinciais, por sua vez nomeados e exonerados pelo Presidente da República. Democracia “made in MPLA” em toda a sua plenitude.
A legislação agora em consulta pública refere que “após a institucionalização de cada autarquia local”, com a eleição dos respectivos órgãos, “observa-se um período de transição de três meses” entre a Administração Municipal, central, e a nova administração autárquica.
“Durante o período de transição a Administração Municipal procede à passagem das pastas e do património e presta toda a colaboração necessária com vista um melhor enquadramento por parte da administração autárquica”, lê-se ainda.
Embora sem data ainda marcada, o Presidente João Lourenço anunciou em Março último o ano de 2020 como previsão (previsão, note-se e anote-se) para a realização das primeiras eleições autárquicas em Angola.
De acordo com a proposta de Lei Sobre a Institucionalização das Autarquias Locais, está prevista uma “experiência inicial”, com a criação de autarquias, entre os actuais mais de 170 municípios do país, com base em alguns critérios.
“O processo de implementação das autarquias locais passa pelo reforço da desconcentração administrativa, acção que o Executivo se propõe começar a realizar ainda no decurso do presente ano de 2018. A desconcentração começa pela transferência de competências e recursos humanos e financeiros para os municípios, pela aprovação dos planos de desenvolvimento municipal”, disse em Fevereiro o Presidente João Lourenço.
No modelo proposto pelo Governo (o único com “força” de lei) e contestado pelos partidos da oposição, que reclamam eleições em simultâneo em todo o país, serão escolhidos para integrarem as primeiras eleições “alguns municípios” que “apresentem níveis de desenvolvimento sócio-económico e de infra-estruturas expressivos no quadro da respectiva província”.
Serão também escolhidos alguns municípios rurais, com pelo menos 500.000 habitantes, desenvolvimento sócio-económico e um historial de capacidade de arrecadação de receita de pelo menos 15% face à média da despesa pública orçamental nos últimos três anos.
E ainda alguns municípios com menos de 50.000 habitantes, que apresentem segmentos de economia local específicos, e estruturados, além de, igualmente, um historial de arrecadação de receita de pelo menos 5% face à média da despesa pública orçamental nos últimos três anos.
Serão igualmente escolhidos “alguns municípios com fraca capacidade de arrecadação de receita”, que possuam um mínimo de 250.000 habitantes, outros “com grande expressão e particularidades culturais, tendencialmente do interior do país” e outros que apresentem “dinâmicas de desenvolvimento local assentes na agricultura e pecuária”.
A mesma proposta de lei diz que “compete à Assembleia Nacional proceder à aprovação da lista dos municípios nos quais devem ser institucionalizadas as autarquias locais para a experiência inicial”.
“O processo de implementação das autarquias locais em todos os municípios do país deve ser concluído num período não superior a 15 anos, após a realização das primeiras eleições autárquicas”, refere a proposta.
Em cima da mesa está a realização de eleições autárquicas em 2020, 2025, 2030 e 2035, prazo limite para a concretização do alargamento do novo modelo de gestão local a todos os municípios do país.