Os trabalhadores da Empresa Nacional de Pontes (ENP) de Angola, sem salários há 56 meses, realizam sábado, em Luanda, uma marcha de protesto para “exigir o pagamento” dos seus ordenados, anunciou hoje fonte sindical, falando em “má-fé das autoridades”. Por onde anda o actual Governo? Estará desaparecido ou de férias num qualquer… paraíso?
“Cinquenta e seis meses sem salários é muito tempo, são quase cinco anos e isso até é desumano. Daí que vamos realizar no sábado, 28 de Julho, uma marcha pacífica para manifestar o nosso desagrado e pedir às autoridades que olhem para a nossa situação”, disse o primeiro secretário da comissão sindical da empresa, Mateus Alberto Muanza.
Segundo o sindicalista, a marcha da manhã de sábado tem um carácter “pacífico” e é organizada pela Central Geral de Sindicatos Independentes e Livres de Angola (CGSILA), que se manifesta solidária com os cerca de 400 trabalhadores nesta situação.
Fazem bem em realçar que se trata de uma marcha pacífica. Mesmo assim, até porque o significado de pacífico varia consoante quem dá as ordens superiores, a Polícia estará com certeza presente, não vão os manifestantes pensar que estão num Estado de Direito.
A marcha, acrescentou, destina-se a protestar junto do Governo e mostrar à sociedade a “grave situação” em que se encontram os trabalhadores, situação que afecta também as famílias e, sobretudo, os filhos.
“Os nossos filhos já não estudam e correm sérios riscos de se tornarem bandidos, porque há cinco anos que o pai não tem salário”, lamentou.
“A preparação da marcha está já bem encaminhada e a segurança está garantida, porque o documento que remetemos à Polícia está bem oficializado. Por isso, os trabalhadores podem aparecer com as respectivas famílias e sugerimos que todos apareçam trajados de preto”, adiantou.
“O preto é para simbolizar o nosso luto, a nossa tristeza, o nosso clamor, porque neste momento estamos de luto mesmo. Cinco anos sem salários numa empresa do Estado não é normal, é grave e sentimo-nos completamente abandonados pelas autoridades”, acrescentou.
No dia 16 de Maio que a Direcção da empresa estatal angolana (que certamente não está há 56 meses sem salários) suspendeu 82 trabalhadores, mais de 70 em idade de reforma, e toda a comissão sindical, conforme denunciou o sindicato.
Mateus Alberto Muanza considerou na altura “inaceitável, desumana e ilegal” a medida tomada pela Direcção da empresa e defendeu o pagamento dos salários em atraso.
Agora, para o sindicalista, a nova medida da Direcção em proibir a presença dos trabalhadores suspensos nas instalações da empresa de pontes, no município do Cazenga, arredores de Luanda, é igualmente “ilegal e antidemocrática”.
Importa, contudo, que os trabalhadores percebam que – como acontece com a palavra “pacífica” – democracia não é a mesma coisa em todos os sítios, tal com existem diferentes tipos de angolanos, os de primeira e os outros.
Segundo Mateus Alberto Muanza, essa proibição ainda prossegue, salientando que essa é outra das razões que levaram à realização da marcha de protesto de sábado.
Por seu lado, em declarações recentes à imprensa, o director-geral da Empresa Nacional de Pontes, José Henriques, confirmou a suspensão dos 82 trabalhadores, justificando a necessidade de rentabilizar a empresa, fruto de uma parceria com o consórcio formado por três empresas de Angola e da China.
“É um processo que tem o aval do Ministério da Construção e Obras Públicas e corre o seu curso normal”, explicou.
Em Outubro de 2017, o novo ministro da Construção e Obras Públicas, Manuel Tavares de Almeida, visitou as instalações da Empresa Nacional de Pontes de Angola, em Luanda, tendo assumido analisar a situação, apelando por isso o diálogo entre sindicato e administração.
É claro que de Outubro até agora o ministro ainda não teve tempo para resolver o assunto. É compreensível. Se o MPLA ainda não teve tempo, ao fim de quase 43 anos, para perceber que não é uma solução para os nossos problemas mas, antes, um problema para as soluções…
“Temos algumas perspectivas no nosso plano orçamental e isso pode ajudar a resolver já os problemas candentes e equacionar o problema dos atrasados”, disse na ocasião o governante, tendo ainda assegurado que seriam elaborados programas “para alavancar” a empresa.
Promessas que, segundo Mateus Muanza Alberto, não se concretizaram na prática: “De facto foram muitas promessas, mas continuamos na mesma situação. Tanto que ainda ontem voltamos a solicitar uma audiência com o senhor ministro, para abordar a situação”.
“Vamos propor muitas situações internas e externas, porque apesar de a direcção não conseguir aprofundar as questões, esse silêncio afecta-nos. Há até solicitações para a empresa adjudicar obras, mas a direcção tarda em elaborar contratos”, adiantou.
“Se a empresa deve aos trabalhadores, esta suspensão de trabalhadores vai-se basear em quê? Ao menos que paguem os salários em atraso, indemnizem. Porque não acreditamos que os trabalhadores suspensos possam ser reenquadrados”, argumentou.
As dívidas para com os trabalhadores datam desde 2011, situação que deixa Maria Alexandrina, há 20 anos na empresa, “triste e agastada”, sem forma de sustentar os sete filhos.
“Por isso estou a pedir às entidades superiores que nos ajudem, que façam qualquer coisa. Os nossos filhos estão fora do sistema escolar, como é que a gente vai acabar”, questionou.
João Lourenço prometeu “Melhorar o que está bem e corrigir o que está mal”. A primeira parte está a ser cumprida. Os poucos que têm milhões estão a ver melhoradas as condições. Têm cada vez mais milhões. Os outros, os milhões que têm pouco, ou nada, continuam a ter cada vez menos.
Falta só saber se João Lourenço vai exonerar as pontes ou os 400 trabalhadores que, por não compreenderem a filosofia do novo governo, teimam em julgar que têm direito a receber salários…
Folha 8 com Lusa