O partido no poder (e já lá está desde 1975, importa não esquecer) mostrou, mais uma vez, não ter blindagem – muito menos substrato – intelectual capaz de cunhar sinais de positividade por muito débeis que fossem, ao manter-se fiel a práticas antiquadas de tudo fazer, incluindo a fraude, para governar “ad eternum” Angola e os angolanos.
Por William Tonet
Uma visão umbilical, cujo orgulho barroco não ultrapassando as próprias fronteiras ideológicas, não reservando mais do que um pequeno espaço, na estante dos fundos das bibliotecas, destino das obras e feitos dos partidos totalitários. Legado que, aliás, nem os seus mais próximos seguidores quererão recordar ou sequer desempoeirar.
Todos os partidos, dirigentes e líderes incapazes de se adaptarem aos tempos, correm o risco da vulgarização na auto-estrada da história. Na maioria dos casos, como será o caso do MPLA, limitar-se-ão a chamar auto-estrada à esburacada picada da sua génese totalitária e anacrónica.
A concentração, o absolutismo e o totalitarismo, enquanto divisas déspotas, andam em sentido contrário da cidadania, da abrangência, da imparcialidade e da ética republicana, gangrenando o sonho da maioria dos autóctones, que auguram por um país inclusivo.
O MPLA, desde 1975, colocou-se acima de todos os órgãos do Estado e pese a adopção (“que nos foi imposta”, dizem os dirigentes do regime), do multipartidarismo e democracia, a postura mantém-se inalterável, como cunha a primeira Lei Constitucional, aprovada aos 10 de Novembro de 1975, exclusivamente, como consta no artigo 60.º, pelo comité central do MPLA e assinada pelo Presidente do MPLA, António Agostinho Neto.
Houve, duas reformas constitucionais, a LC da RPA (Lei Constitucional da República Popular de Angola) através das Leis 12/91 e 23/92, aprovadas pela Assembleia do Povo (órgão cujos deputados, eram exclusivamente do MPLA).
Seguiu-se a elaboração da actual Constituição de 10 de Fevereiro de 2010, sem a participação de uma verdadeira Assembleia Constituinte, pois a auto-denominada, que vem nas suas folhas, é uma farsa, um embuste, porquanto ela foi, exclusivamente escrita pela equipa e visão individual de José Eduardo dos Santos, que fez um fato à sua medida, sempre colocando o MPLA como órgão supremo do Estado, ou sendo ele próprio o Estado.
E como repristinando essa LC, mesmo em regime, alegadamente, democrático, o MPLA não deixa de aplicar a regra constante no texto constitucional de 1975 de, obrigatoriamente, o presidente do MPLA ser o Presidente da República, como forma de trafegar, “ilicitamente”, vantagens ao partido do regime, ao partido que quer ser Estado.
E é com base, neste acervo secreto, que o MPLA aprovou no dia 27 de Abril de 2018 a realização de um congresso extraordinário na primeira quinzena de Setembro deste ano e a candidatura de João Lourenço ao cargo de presidente do partido, ocupado desde 1979 por José Eduardo dos Santos.
Esperava-se maior ousadia e maturidade dos seus dirigentes, se abrissem o leque, para outras candidaturas, mas o bureau político do MPLA, ficou-se pelo óbvio: apenas um chefe; um pensador; um (supostamente) novo “escolhido de Deus”.
“O bureau político aprovou a proposta de resolução e o cronograma de preparação e realização do 6.º Congresso Extraordinário do partido, a ter lugar na primeira quinzena de Setembro próximo e, consequentemente, aprovou a candidatura do camarada João Lourenço, actual vice-presidente, ao cargo de presidente do MPLA”, lê-se.
Curto, lacónico, previsível e vazio é, infelizmente, o retrato deste comunicado.
Esperava-se mais, muito mais, depois de se saber, dos tristes resultados socioeconómicos e políticos, desta matriz, que colocou o país no fundo do poço e que, como alternativa, parece querer tornar o poço ainda mais fundo. É cediço os prejuízos causados, em 42 anos, por uma política concentracionista e cega, na lógica de que o poder corrompe e o excesso de poder corrompe muito mais, mas esta, desnudadamente, é a divisa maior do MPLA, que não encontra outra via, senão a contrária à lei, para se manter no poder, como se fosse a encarnação de Deus na terra.
Oxalá, um dia, o tempo venha, no seio do próprio MPLA, oxigenar a mente dos seus principais dirigentes, para o colocarem no mesmo pedestal dos demais partidos, que em cada eleição, seja capaz de ganhar com lisura e transparência.