O reinício, amanhã, do transporte de minérios da RD Congo (RDC) para o porto do Lobito, através do Caminho-de-Ferro de Benguela (CFB), é uma vantagem para Angola, a julgar que os valores a arrecadar que podem contribuir para o desenvolvimento desta região, disse hoje, domingo, no Luau, a administradora adjunta local, Nora Mahongo.
Em declarações à Angop, a responsável considerou de mais-valia a reactivação da operação paralisada há muitos anos, por constituir uma das formas de contribuir na diversificação da económica angolana.
“Com a circulação do minério nessa via, o governo angolano fica a ganhar com as receitas a serem arrecadas, fruto da comercialização do produto no porto do Lobito aos países do ocidente”, referiu Nora Mahongo, insistindo que isso pode também ajudar o rápido desenvolvimento do seu município.
Nora Mahongo fez saber que o anúncio da reactivação do processo aumentou a expectativa da população local, aguardando que os resultados permitam também a construção do porto seco da região para permitir a fluidez do comércio transfronteiriço.
Em relação aos preparativos da construção do porto seco, disse ter já identificado o lugar onde poderá ser erguido e que neste momento a municipalidade aguarda pela empresa seleccionada pelo Ministério dos Transportes e o Conselho de Administração do CFB, cujo nome não foi revelado, para concentrar o material e dar início aos trabalhos.
Quanto ao comércio fronteiriço, referiu que apesar de não se comercializar produtos industriais de grande porte, o município continua a registar a venda dentro da normalidade, sendo a farinha de trigo, óleo vegetal, açúcar, leite, sal e peixe congelado, os produtos que mais circulam no sentido ascendente, Angola–RDC, enquanto os tecidos, telemóveis, calçados, o bombo, hortícolas, entre outros produtos agrícolas fluem no sentido descendente, RDCongo–Angola.
A responsável explicou que a fronteira tem sido aberta dois dias por semana, sendo terças e sextas–feiras, para a realização das trocas comerciais entre os povos de ambos os países.
O comboio inaugural, transportando 50 contentores com mil toneladas de manganês, vindo da região mineira de Kisenge, província de Katanga, chega amanhã à estação ferroviária do município fronteiriço do Luau, província do Moxico, leste de Angola.
Para testemunhar a operação, o porta-voz do CFB, António Hungulo, disse à imprensa que será realizada na estação do Luau uma cerimónia da chegada do comboio que contará com a presença dos ministros dos Transportes de Angola e da RD Congo, Augusto Tomás e Brain Mashimba, respectivamente, e do governador da província do Moxico, Manuel Gonçalves Muadumba.
Embora o MPLA gostasse de referir que se trata de uma totalmente da sua responsabilidade e criação, a verdade é que o Caminho de Ferro de Benguela é a única ligação ferroviária da África Central ao Atlântico, tendo a sua construção tido origem numa Lei de Agosto de 1899 e foi iniciada a 1 de Março de 1903 tendo ficado concluída a 2 de Fevereiro de 1929. A 10 de Junho de 1931 chegou ao porto do Lobito o primeiro carregamento de cobre do Katanga.
Cecil Rhodes foi o promotor da constituição do império britânico na África Central, o que conseguiu construindo caminhos-de-ferro com o objectivo de ligar o Cabo ao Cairo, o célebre “C to C”, e explorando as riquezas do solo do continente africano.
Quando em 1897 a linha do caminho-de-ferro vinda de Bechuanalândia (protectorado estabelecido na África meridional em 31 de Março de 1885 pelo Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda) chegou a Bulawayo, a 1.362 milhas do Cabo e a mais de 1.000 milhas do Katanga, Rhodes incumbiu Robert Williams de estudar os territórios que ficavam a norte, entre os rios Zambeze e Congo.
Deste estudo resultou a descoberta dos maiores jazigos de cobre de África, o “Copper Belt”, na Rodésia do Norte e no Katanga (antiga Garanganja).
Para que este centro, de enormes possibilidades de produção, fosse útil às indústrias europeias, era indispensável uma linha férrea que o ligasse até ao mar. De imediato percebeu-se que o escoamento do cobre pelos portos da costa oriental de África, já existentes, seria muito dispendioso, pelo que se tornava imprescindível fazê-lo pela costa ocidental. A Via Lobito permitiria reduzir a distância de transporte em relação à Via Beira em 3.533 milhas, e em relação à Via Cape Town em 2.715 milhas.
De início, o objectivo da linha do Caminho-de-Ferro de Benguela era transportar 40.000 toneladas por ano de minério de cobre do Katanga, única saída económica para a exploração das 60.000 milhas quadradas (155.400 km2) da concessão para pesquisa mineira naquela região, dada em 1899 pelo Rei Leopoldo à “Tanganika Concessions Ltd.”.
A fundação da Companhia do Caminho-de-Ferro de Benguela, e a criação do Porto do Lobito, devem-se aos esforços desenvolvidos por Robert Williams que, em 28 de Novembro de 1902, obteve de Portugal uma concessão por 99 anos para construir uma via-férrea que ligasse o porto do Lobito à fronteira oriental de Angola com o Katanga, junto ao paralelo 12º,5.
Os Estatutos da Companhia foram aprovados pelo Decreto de 25 de Maio de 1903, e registados no Tribunal do Comércio a 28 de Maio de 1903.
De acordo com o Contrato de Concessão, a linha tinha de seguir o traçado do reconhecimento inicial português destinado a ligar Benguela, o então porto de mar cujas condições de utilização eram bastante precárias, a Caconda, que até ao final do século XIX foi o grande centro de trocas comerciais, e o ponto-chave da ocupação portuguesa no interior da região planáltica. Comprometia-se ainda a chegar a Catengue, a 122km, em 10 meses.
A linha seria construída com a mesma bitola da linha “C to C”, que era de 3 pés e 6 polegadas (1,067m), com carris tipo CFB, de 60 libras por metro, e travessas metálicas de 30kg, com fixação por cunha, com um plano de assentamento de 1.430 travessas por quilómetro.
Para reforçar a mão-de-obra local, que era fraca e inapta, foi necessário contratar trabalhadores habituados à construção de vias-férreas, 7.000 nigerianos e senegaleses, e 2.000 indianos vindos com as suas famílias do Natal, África do Sul; para este contrato serviu de intermediário o jovem advogado Gandhi (1869-1948), a quem viria a ser atribuído o título de “Mahatma” (em sânscrito “A Grande Alma”).
Foram também importados camelos do norte de África, para apoiar os outros animais de carga e tracção, sobretudo no transporte de água e de materiais para a construção de linha.
O transporte de água para os trabalhadores, locomotivas, e outros trabalhos, foi uma das grandes dificuldades que tiveram de ser enfrentadas. A água era racionada, cabendo a cada trabalhador o equivalente a duas garrafas de Whisky por dia. A distribuição de água tornou-se mais fácil com a introdução de barris rolados por serventes, sendo que, em média, era necessário um servente para cada trabalhador só para este serviço.