O Tribunal Constitucional angolano rejeitou o pedido de inconstitucionalidade de dois artigos da nova Lei de Imprensa, conforme recurso apresentado pelo grupo parlamentar da UNITA. E quem sabe são eles. Estão aí para cumprir “ordens superiores”
Por Óscar Cabinda
A nova legislação, aprovada pelo Parlamento angolano em 2016 e promulgada pelo Presidente da República, José Eduardo dos Santos, no início deste ano, tem sido dura e justificadamente criticada pela oposição angolana e pelos jornalistas de forma individual e colectivamente através do seu sindicato.
O maior partido da oposição angolana avançou mesmo para o Tribunal Constitucional com um pedido de fiscalização abstracta sucessiva da constitucionalidade dos artigos 7.º e 10.º da Lei N.º1/17, de 23 de Janeiro, a designada Lei de Imprensa, alegando, genericamente, que impõem “restrições à liberdade de imprensa”, desrespeitam o “princípio da proporcionalidade” e por “submissão da informação ao interesse público”.
Em acórdão daquele tribunal, datado de 26 de Junho, os juízes conselheiros rejeitam a declaração de inconstitucionalidade, conforme pedido pela UNITA.
Acrescentam que “os limites expressamente previstos” na nova Lei de Imprensa “não só estão devidamente alinhados com a Constituição, como respeitam as cláusulas do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, de que Angola é parte”, encontrando-se ainda “em linha com outras realidades constitucionais”, dando como exemplo a legislação portuguesa. Esta de citar, nesta matéria, a legislação portuguesa é a cereja no topo do bolo, dirá qualquer um dos poucos jornalistas portugueses em actividade. Não confundir com produtores de conteúdos.
Para a UNITA, as normas constantes da Lei de Imprensa “não são limites, mas sim verdadeiras restrições, pois impedem a liberdade de imprensa em situações que se considere não existir objectividade, rigor e isenção da informação”, pelo que, “ao constituírem restrições e não limites à liberdade de imprensa, são inconstitucionais”.
O maior partido da oposição entende que a lei “submete a esfera de informação ao Estado” e dos “interesses que a informação deve prosseguir à decisão dos órgãos superiores do Estado”, alegando, igualmente, violação da Constituição.
“O interesse público, tal como definido por Lei, é incumbência do Estado, à imprensa exige-se liberdade, crítica, debate, reflexão e não submissão aos interesses prosseguidos pelo Estado”, invocava a UNITA, no recurso levado ao Tribunal Constitucional.
Já para os juízes conselheiros daquele tribunal (obviamente peritos em legislação, em jornalismo e seguidismo canino ao poder instituído), o interesse público a que se sujeita o direito à informação “é o do rigor, objectividade, isenção e do Estado democrático de direito que, como é sabido, é um princípio informador de toda a ordem constitucional angolana”.
Também o Sindicato dos Jornalistas Angolanos (SJA) anunciou a 25 de Janeiro a intenção de levar ao Tribunal Constitucional o pacote legislativo da comunicação social, promulgado naquele mês pelo chefe de Estado, alegando que contém disposições que atentam contra a liberdade de imprensa.
A posição do órgão sindical da classe jornalística angolana foi então apresentada em conferência de imprensa, em Luanda, pelo seu secretário-geral, Teixeira Cândido, assumindo especial “preocupação” com a futura regulação do sector e a “usurpação de competências”.
“Ou seja, competências que são dos tribunais hoje foram atribuídas ao Ministério da Comunicação Social. Como é o caso dos estatutos editoriais dos órgãos de comunicação social, que agora serão supervisionados pelo Ministério da Comunicação e não pelos tribunais”, apontou o dirigente sindical.
O sindicato assume desta forma dúvidas sobre a constitucionalidade de algumas disposições constantes da nova legislação do sector, publicada em Diário da República a 23 de Janeiro.
Este pacote legislativo, aprovado pela Assembleia Nacional angolana em Novembro último, prevê ainda a criação legal da nova Entidade Reguladora da Comunicação Social Angolana (ERCA) também promulgada pelo Presidente da República.
Recordando o Angolense
A decisão dos juízes enquadra-se na estratégia daqueles que sempre que ouvem falar de liberdade puxam da pistola. Os donos disto tudo não brincam em serviço.
Em Janeiro de 2015, o antigo director de Informação, Agostinho Rodrigues, confirmava o encerramento do Semanário Angolense, mas dizia desconhecer quem são os novos proprietários do espólio nem que destino terá.
Outro jornalista que ficou então no desemprego com o encerramento do jornal, Makuta Nkondo, contou como soube da notícia: “Dois dias antes do Natal comunicaram-nos o fecho definitivo do jornal, com o formato actual, e pagaram-nos três meses de salários contra os demais que nos deviam e sem o décimo terceiro”.
Makuta Nkondo disse à VOA que o salário base de um jornalista no jornal era de 48 mil cuanzas, o equivalente a 480 dólares, e não houve qualquer negociação para efeitos de indemnização.
O jornalista acreditava (como continua a acreditar) que esta é mais uma medida para silenciar a imprensa no país. E é mesmo. Aliás, corresponde à suprema estratégia do regime, que pretende uniformizar a forma de os angolanos pensarem. E como os jornalistas (não confundir com os sipaios e mercenários que trabalham em meios de comunicação social do Estado – que somos todos nós) pensam, a melhor forma de os reeducar é pelo desemprego ou, ainda, por os levar a chocar com algumas balas perdidas.
Makuta Nkondo disse: “Significa que neste momento o único jornal privado e independente que sobrou é o Folha 8, de William Tonet. O MPLA pretende impor-nos o Jornal de Angola, que eu considero de Pravda, a Rádio Nacional de Angola, que é a rádio Moscovo, e a TPA, autêntica televisão soviética”.
Segundo Nkondo, “os ditos privados como a rádio Despertar, da UNITA, e rádio Eclésia, da Igreja Católica, fazem a mesma coisa com listas de pessoas proibidas de falar, como eu próprio que estou proibido de falar na Despertar e na Eclésia”.
Por sua vez, Teixeira Cândido, disse que foram apanhados de surpresa.
“Não acredito que alguém compre um título para extingui-lo um ano depois, isto deixa o Sindicato surpreso e estupefacto com isto de comprarem jornal e depois guardar na gaveta, não é uma situação normal”, considerou então Teixeira Cândido, para quem “de certo modo é um ambiente de intranquilidade para a classe jornalística e para o próprio jornalismo”.
Um dos directores do referido jornal, Joaquim Maciel, assegurou à VOA que não conhecia quem eram os novos donos e nem sabia que futuro reserva a publicação reestruturada.
A verdade é que o regime gizou, nos últimos anos, uma estratégia para “assassinar” a imprensa privada, cuja pujança assentava em títulos de vários proprietários. Pensava-se então que Angola caminhava para a democracia e para ser um Estado de Direito.
Preocupado com a diversidade de opinião, muitas descomprometidas com as amarras do poder, o regieme/MPLA nada mais fez do que estabelecer uma OPAC (Oferta Pública de Aquisição Coerciva) sobre os meios de comunicação sociais privados.
Ou seja, Semanário Angolense (com uma cláusula, impedindo os seus jornalistas de voltarem a escrever, durante um longo período); A Capital; Agora; Independente e Factual (ambos ligados a agentes da Segurança de Estado); Angolense; Novo Jornal; Continente.
Com a aquisição destes órgãos e o controlo absoluto, total e inequívoco dos meios de comunicação sociais públicos: Rádio Nacional, Jornal de Angola, Televisão de Angola (canal II e TPA Internacional, entregues sem concurso público a dois filhos do Presidente da República) e ANGOP – Agência de Notícias, o regime deixou de ter na imprensa um elemento fiscalizador e de denúncia, porquanto agora tudo é a voz do dono.
Nesta selva a única excepção é o Folha 8, alvo de todas as perseguições e chantagens, destacando-se os mais de 100 processos judiciais conhecidos contra o nosso director, William Tonet. Conhecidos porque deverão haver muitos outros, assinados em branco, prontos a saltarem da gaveta dos donos do país.
Com esta estratégia, com um toque de mágica, vários grupos empresariais de homens do poder, sem qualquer capital financeiro, mas munidos apenas de capital partidocrata, como arma bastante para escancarar as portas dos cofres onde deverão estar o nosso dinheiro, roubam milhões de dólares para corromper jornalistas e adquirir os seus jornais.
Milhões esses que também se estenderam a Portugal, onde são cada vez mais as empresas de comunicação social que estão nas mãos de homens do regime e que, como outras, também ajudam a branquear o que for necessário.
Todos nos recordamos que uma legião de gestores e jornalistas portugueses, foram então desembarcando por cá para dirigir as novas pérolas dos dirigentes angolanos, com salários chorudos, nunca antes praticados no mercado, tudo visando matar a liberdade de imprensa e de expressão e assim amordaçar a incipiente democracia.
Porquê os Jornalistas? Porque a verdade é incómoda.
Em Angola, mas não só, apesar da guerra que o Governo-regime move aos Jornalistas, não faltam ministros, deputados e políticos em geral (todos de pistola no bolso) a dizer que a liberdade de Imprensa é um valor sagrado. Sagrado sim desde que não toque nos interesses instalados, desde que só diga a verdade oficial.
No tempo em que existiam Jornalistas, dizia-se que se o jornalistas não procura saber o que se passa é um imbecil, e que se sabe o que se passa e se cala é um criminoso.
Hoje, o “jornalista” que não procura saber o que se passa é inteligente, e o que sabe o que se passa e se cala é um óptimo assessor, deputado, administrador ou até ministro.
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