A transportadora aérea Emirates anunciou hoje o “fim imediato” do contrato de concessão para gestão da companhia de bandeira angolana TAAG face “às dificuldades prolongadas que tem enfrentado no repatriamento das receitas” das vendas em Angola.
Numa declaração à Imprensa, em Luanda, a transportadora refere igualmente que está a “tomar medidas no sentido de reduzir a sua presença em Angola” e que a partir de hoje reduz de cinco para três o número de frequências semanais para Luanda.
Angola vive desde 2014 uma crise financeira e económica decorrente da quebra nas receitas com a exportação de petróleo, também com efeitos cambiais, com várias operadoras aéreas a queixarem-se da dificuldade em repatriar dividendos das vendas em Angola, por falta de divisas.
“Esta questão tem-se mantido sem solução, apesar de inúmeros pedidos feitos às autoridades competentes e garantias de que medidas seriam tomadas”, refere a companhia árabe.
“Com efeito imediato, a Emirates põe fim à sua cooperação com a TAAG – Linhas Aéreas de Angola – ao abrigo de um contrato de concessão de gestão em curso desde Setembro de 2014”, acrescenta a empresa, com sede nos Emirados Árabes Unidos.
“Esperamos que a questão do repatriamento de fundos seja resolvida o mais cedo possível, de modo que as operações comerciais possam ser retomadas de acordo com a demanda”, refere ainda a companhia.
O contrato de gestão assinado entre o Governo angolano e a Emirates prevê a introdução de uma “gestão profissional de nível internacional” na TAAG, a melhoria “substancial da qualidade do serviço prestado” e o saneamento financeiro da companhia angolana, que em 2014 registou prejuízos de 99 milhões de dólares (88 milhões de euros).
Em contrapartida, no âmbito do Contrato de Gestão da transportadora pública angolana celebrado com a Emirates Airlines para o período entre 2015 e 2019, prevê-se dentro de quatro anos resultados operacionais positivos de 100 milhões de dólares.
Em entrevista à Lusa no final de 2016, o presidente do conselho de administração da TAAG, Peter Hill, indicado para o cargo pela Emirates ao abrigo do acordo com o Governo angolano, anunciou ter cortado 62 milhões de euros em custos no primeiro ano daquela gestão.
“Nós dissemos, no nosso plano de negócios, que em três anos íamos reduzir custos em 100 milhões de dólares [89 milhões de euros] e logo no primeiro ano já poupamos 70 milhões [62 milhões de euros]. Por isso estamos muito contentes e posso dizer que as finanças da companhia estão a melhorar dramaticamente”, explicou.
“Herdamos uma companhia não lucrativa, com muitos trabalhadores, e nos últimos 12 meses estamos a reduzir os custos”, enfatizou o administrador, que assumiu funções em Outubro de 2015.
Segundo Peter Hill, a TAAG contava então com cerca de 4.000 trabalhadores, para operar 31 destinos domésticos e internacionais, após uma forte redução, apenas com programas de reforma.
Outro tempos… ou nem por isso?
No dia 1 de Outubro do ano passado o ministro dos Transportes, Augusto da Silva Tomás, afirmou, em Luanda, que o Executivo angolano ia continuar a reforçar a TAAG com meios técnicos e aéreos, a fim de tornar a companhia referência mundial, prestando um trabalho com credibilidade, segurança e conforto.
A atingir tal desiderato, Angola que é um dos países mais corruptos do mundo, que é um dos países com piores práticas democráticas, que é um país com enormes assimetrias sociais, que é o país com o maior índice de mortalidade infantil do mundo, passará a ter o rótulo de companhia de referência (mundial).
Augusto da Silva Tomás falava à imprensa, no Aeroporto Internacional 4 de Fevereiro, no acto de recepção da nova aeronave Boeing 777-300ER da companhia angolana de bandeira.
De acordo com o ministro, o programa faz parte de uma estratégia do Executivo de sua majestade o rei de Angola, José Eduardo dos Santos, com vista a dotar a empresa de uma gestão profissional de nível internacional, tendo em conta a posição geoestratégica de Angola.
“Era necessário dotar a companhia de meios que permitam exercer o seu trabalho com eficácia e eficiência, sobretudo no âmbito dos padrões internacionais. É preciso igualmente ter pessoal qualificado para poder rentabilizar a empresa, melhorar o serviço prestado aos passageiros, elevar os seus padrões de operacionalidade e segurança”, salientou Augusto da Silva Tomás.
Avaliada em três biliões e 500 milhões de kwanzas, o avião, baptizado de ”Morro do Moco”(bem poderia chamar-se Isabel dos Santos), é o último de três aparelhos adquiridos ao fabricante norte-americano, tendo os dois primeiros chegado ao país em Maio de 2016.
A aeronave, que recebeu o nome em homenagem ao maior morro de Angola localizado na província do Huambo, planalto central, tem capacidade para transportar 225 passageiros em classe económica, 56 em executiva e 12 em primeira classe.
O “Morro do Moco” é o oitavo avião do tipo “triple seven” que a companhia angolana de bandeira adquire desde a chegada, a Luanda, do primeiro modelo, em Junho de 2011. A TAAG serve 31 destinos domésticos e internacionais com uma frota de 13 aeronaves, incluindo 737 e 777-200ER.
Para deixar a crise em terra
No dia 15 de Julho de 2016, a TAAG admitiu que enfrentava “sérias dificuldades” para cumprir as “obrigações contratuais” com fornecedores e credores, devido à conjuntura em Angola, nomeadamente à falta de divisas.
A situação foi admitida num comunicado divulgado pela transportadora, confirmando – como o Folha 8 noticiou – a suspensão da compra, com recurso a moeda nacional angolana, o kwanza, de bilhetes para viagens com destino a Luanda e o início no exterior do país.
“Tendo em consideração a crise económica que assola a República de Angola”, que tem criado “desequilíbrios financeiros e contabilísticos de forma generalizada” e “bem notável e acentuada escassez no acesso e disponibilidade da moeda estrangeira, particularmente no sector da aviação civil”, justificava a companhia.
“Os elevados custos operacionais no exterior do país”, diz ainda a TAAG no comunicado, tem levado a companhia a “enfrentar sérias dificuldades em honrar com as obrigações contratuais junto dos fornecedores e credores”.
Daí que a companhia espere aumentar as vendas em moeda estrangeira, como em dólares e euros, para fazer face às necessidades operacionais fora do país.
Na véspera (14 de Julho) foi notícia que a compra de viagens aéreas para Luanda, com início fora de Angola, em kwanzas, deixou de ser possível a partir, com a suspensão, desde aquele dia, dessas operações pela companhia de bandeira angolana, que desde o final de 2015 está (estava) sob gestão da Emirates.
A informação foi então confirmada por fonte oficial da transportadora área estatal de Angola, que seguia os passos de todas as restantes companhias internacionais que operam a rota de Luanda, incluindo a portuguesa TAP, que há vários meses deixara de aceitar kwanzas na compra de passagens para viagens que não se iniciem na capital angolana, face à dificuldade em repatriar divisas.
Só a TAP, segundo o relatório e contas da Parpública, tinha depósitos em Angola no montante de 27,7 milhões de euros, no final de 2015, que estava com dificuldade de repatriar.
No dia 3 de Junho de 2016 foi noticiado que Angola é o quinto país do mundo com mais fundos retidos às companhias aéreas, que não pagava há sete meses, acumulando dividendos de 237 milhões de dólares que as transportadoras não conseguem repatriar.
Os dados constavam de um comunicado da Associação Internacional de Transporte Aéreo (IATA) que colocava Angola numa lista de países liderada pela Venezuela, com 3.180 milhões de dólares (16 meses sem transferir dividendos), seguida da Nigéria (591 milhões de dólares, sete meses), Sudão (360 milhões de dólares, quatro meses) e Egipto (291 milhões de dólares, quatro meses).
No mesmo comunicado, a IATA, que representa 264 companhias aéreas e 83% do tráfego global, afirma que pediu aos governos “que respeitem os acordos internacionais que os obrigam a garantir que as companhias aéreas sejam capazes de repatriar suas receitas”.
Folha 8 com Lusa
O primeiro B-777 chegou em Julho de 2006!
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