Estou indignado e envergonhado. A indignação e a vergonha aumentam todos os dias. Nem o facto de todos os dias existirem motivos para estar indignado e envergonhado ajuda a diminuir o volume da minha indignação e vergonha. Pelo contrário. O nosso Povo merece que esteja indignado e envergonhado e que, com todas as letras, o assuma. E que, com todas as forças, lute para que o país mude.
Por William Tonet
Envergonhado, como estes senhores que juraram, formalmente, respeitar e fazer respeitar a Constituição e a lei mas que, objectivamente, se gerem por uma outra “Constituição” – esta parida na maternidade das piores ditaduras do mundo.
A Constituição legal (mas só para estar na prateleira) é um documento evoluído e digno de algo que Angola, esta Angola, não é: um Estado de Direito Democrático. A outra “Constituição”, a que prevalece, a que é praticada, a que é a Bíblia do regime, tem um só artigo. E esse artigo diz: “O Presidente da República quer, pode e manda”.
Os angolanos de bem, que são a esmagadora maioria dos nossos 20 milhões de pobres, interrogam-se baixinho (não vá o regime descobrir o que pensam): Quem pensam que são alguns dos dirigentes deste MPLA, que se tornou perverso e não se coíbe de assassinar até muitos dos seus mais fiéis militantes?
Este MPLA tornou-se numa central de emprego bajulador e acéfalo, perdendo a vertente ideológica. Perdeu, aliás, tudo. De partido marxista passou, do dia para a noite, para partido capitalista selvagem. Mas como se isso não fosse suficiente, o Presidente transformou Angola numa monarquia esclavagista, onde as riquezas nacionais foram privatizadas e estão na mão do seu clã.
O bons patriotas, muitos dos quais pertencem ao MPLA, têm medo de falar e de perder os empregos, apenas o fazem dentro de quatro paredes. É natural. Pensam, e bem, que a única diferença entre Adolf Hitler e José Eduardo dos Santos está na cor da pele.
Como foi, é, possível ter este regime – unipessoal, monárquico, ditatorial, esclavagista – chegado tão baixo, arrastando consigo a esmagadora maioria dos autóctones angolanos que, depois da guerra colonial e da guerra civil apenas querem ser felizes, apenas querem paz, pão e liberdade?
Angola, esta Angola do MPLA, volta a estar – como em 1977 – na fase de “não vamos perder tempo com julgamentos”. Para isso chamam à colação o tal artigo único da sua “Constituição” particular.
Hoje, 41 anos depois da independência do MPLA, que não dos angolanos, o quadro esclavagista do reino (país é outra coisa) continua a desenvolver o roubo desenfreado dos cofres do erário público, peculato e corrupção institucional, por parte da mesma elite governativa, mostrando – perante a apatia internacional – a natureza perversa do regime unipessoal de José Eduardo dos Santos, hoje apenas comparável aos da Coreia do Norte e da Guiné Equatorial.
O MPLA está no poder desde 1975 e José Eduardo dos Santos desde 1979. E onde está o país? Está no lamaçal putrefacto da corrupção e de todas as epidemias fatais que lhe estão associadas. A fome está por todo o lado. A saúde é uma miragem (somos o país do mundo com o maior índice de mortalidade infantil). A liberdade zarpou para parte incerta. A legalidade está no bolso dos dirigentes do regime. Os direitos e a cidadania estão nas catacumbas do poder arbitrário do monarca.
Alguém, no seu juízo perfeito, nesta situação de crise para a maioria e faustosidade para o clã presidencial e seus acólitos, acreditaria ser possível ao Presidente da República nomear a sua filha para Presidente do Conselho de Administração da Sonangol? Se não acreditava passou a acreditar. A monarquia, esta monarquia, funciona mesmo assim. E quem ousar contestar… deve encomendar já o seu funeral.
Mesmo sabendo que andam por aí balas perdidas à minha procura, mesmo sabendo que consto da ementa dos jacarés do Bengo, continua a dizer que estou indignado e envergonhado. Sei, contudo, que não estou sozinho. Há muitos angolanos que estão como eu: envergonhados e indignados.
Tenho vergonha. Estou indignado. Um Povo mudo não muda. É por isso que eu, como outros – felizmente, não me calo. Um dia, como na Alemanha de Hitler, como na Coreia do Norte de Kim Jong-un ou na Guiné Equatorial de Teodoro Obiang, o nosso Povo vai sair à rua para festejar, finalmente, a liberdade, a independência.