Pão nosso (já não é) de cada dia

Há um ano, o pão constituía-se como o elemento principal da cesta básica dos cidadãos angolanos, até que a crise económica e financeira no país, atingiu o mercado de fornecimento da farinha de trigo, que está a resultar na subida vertiginosa do preço do pão, e consequentemente a ausência deste produto inigualável ao pequeno-almoço nas mesas de milhares de famílias.

Por Pedrowski Teca

Ao pequeno-almoço, vulgo “mata-bicho”, o cada vez mais elevado preço do pão obrigou várias famílias a inovarem, substituindo assim o “precioso” pão com o prato de arroz branco acompanhado com o peixe “lambula”, agora intitulado “peito alto”, ou o chá com batata-doce ou mandioca.

O Folha 8 percorreu as ruas da cidade capital, Luanda, onde conduziu um inquérito, também nas redes sociais, que abrangeu outras províncias do país, procurando saber sobre o preço do pão em várias localidades.

Na pesquisa, notou-se que em cada localidade, as padarias e vendedoras de pães ditam e especulam os preços, criando disparidades, observando-se do mesmo modo, a redução do tamanho e da qualidade do produto, chegando alguns cidadãos a reclamarem de “pães pequenos tipo esponjas”, e clamando por uma entidade reguladora de preços.

Luanda

”Vivo em Viana, Estalagem, e o preço do pão aqui é 40 Kwanzas para o pequeno e o grande são 70 Kwanzas. Há cada dia que passa, os preços estão a aumentar cada vez mais. Cada um quer fazer o seu preçário e não existe uma regra comercial que estipula um determinado preço. É muito preocupante isso, sendo o pão um alimento básico para a alimentação da população e os factores que estão a influenciar, acho eu, é que alguns estão a se aproveitar do factor crise para serem beneficiados disso e prejudicam a maioria da população, principalmente os estrangeiros que têm as suas cantinas, fazem os seus próprios preços”, denunciou Cristo Caramelo Workino.
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Para o mesmo cidadão, a solução deste problema, reside necessariamente na intervenção das entidades económicas, que devem encontrar políticas para solucionar e punir aqueles que praticam tais actos.

Na Centralidade do Sequele, no Zango, o cidadão Esmeraldino Mauro revelou que três pães pequenos custam o valor de 100 Kwanzas.

Respondendo do município do Cazenga, o cidadão Sola Alexandra Obie, afirmou que o pão custa 70 Kwanzas na sua localidade.

Gelson Manuel, morador do bairro Benfica, disse que tem comprado o pão redondo em valores que oscilam de 35 a 50 Kwanzas, o pão cassete de 75 a 100 Kwanzas.

“Por consequência, as padarias produzem em série e o pão está mais leve do que papel. Uma das soluções é a inspecção e regularização do preço do pão pelos órgãos de direito, sendo um produto da cesta básica e muitas famílias carentes nem conseguem substituir esse bem pela mandioca, batata doce ou arroz para o mata-bicho! O pão está sempre a subir até o saco plástico na padaria custa 20 Kwanzas”, acrescentou Gelson Manuel.

Já o Dadinho Resende Tomé, residente no bairro Calemba 2, contou que o pão está a custar 80 Kwanzas.

“Até aqui, o preço do mesmo bem alimentar só subiu, ainda não vi descida e os factores que alegam estar na subida do mesmo, estão generalizados na falta de divisas para a importação dos recursos ou produtos para a produção”, disse.

A cidadã Alice Vasco, narrou que na loja DisKontão o pão está no valor de 55 Kwanzas, e na Centralidade do Kilamba algumas padarias vendem-no em valores que variam de 40 a 50 Kwanzas, tendo notado algumas vezes o não funcionamento das mesmas pela falta de farinha de trigo.

“E não é pão de verdade, é uma pequena porção de massa misturada com bastante fermento e depois assada, faz até mal para a saúde,” desabafou um cidadão de nome Konndor Faro.

A jovem Piedade Matias, moradora do bairro Caop, em Cacuaco, revelou que um pão no tamanho normal custa 100 Kwanzas, enquanto 4 pães pequenos e redondos custam 280 Kwanzas.

“Quem tem facilidade de sair do bairro, aproveita para comprar em outros postos porque a qualidade é maior e as vezes um pouquinho mais barato,” disse Piedade Matias.

Nelson Vieira Lopes, morador do Prenda, bairro Sagrada Esperança, revelou-nos que o pão está a custar 100 Kwanzas, quando anteriormente custava 35 Kwanzas.

Benguela

Falando a partir do bairro Bela Vista, na província de Benguela, o cidadão Wakuto Paulo, disse que nas padarias ou nas revendedoras, o pão cassete está a custar 100 Kwanzas, enquanto o pequeno custa 25 Kwanzas.

Kwanza Sul

O cidadão Xavi Calas, falando do município do Sumbe, província do Kwanza Sul, disse que no bairro das Salinas, o pão pequeno custa 50 Kwanzas, o de tamanho médio custa 100 Kwanzas, e o maior custa 200 Kwanzas.

Lubango

A partir da cidade do Lubango, José Macuva Chipalanga afirmou que na generalidade as padarias vendem o pão ao preço de 35 Kwanzas.

Nota-se alguma disparidade no bairro Lage, onde o cidadão Elson Kassinda, diz comprar o pão pequeno ao preço de 33,3 Kwanzas.

“No fim do ano passado e princípio deste, o pão custava 25 Kwanzas, portanto está a subir. A subida, do pão é generalizada a outros bairros da cidade do Lubango e da província da Huíla.

As causas, estão evidentemente relacionadas com a subida do preço dos produtos que constituem matéria prima na produção do pão (farinha de trigo, sal, combustíveis, etc.), que por sua vez têm como base o deficit de divisas (dólar), no mercado financeiro formal e ao dispor dos importadores”, explicou Elson Kassinda.

Kassinda acrescentou que “o deficit é causado pela existência de esquemas ilícitos, no mercado financeiro nacional, que desviam os “dólares” disponibilizados pelo BNA (Banco Nacional de Angola), das instituições legais para o mercado informal, onde preços de câmbio são especulativamente adoptados”.

A partir do Lubango, Kassinda aponta como soluções do problema ao curto prazo: a adopção de medidas de transparência no processo de incrementação das referidas divisas do BNA para o mercado financeiro formal, de forma a estancar a fonte de alimentação do mercado informal, e a especulação, dando assim maior capacidade de importação as empresas vocacionadas e consequencialmente o aumento da oferta de matéria-prima ao mercado de produção do pão.

“Abrir uma linha de crédito ao empresariado afim, no intuito de robustecer o seu poder de compra”, disse, acrescentando que ao longo prazo, deve-se potencializar o mercado nacional, produtor destas matérias-primas, reduzindo a importação de tais (produtos) e baixando por via disso o preço da sua comercialização e do pão.
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Padarias fechadas

Nas suas rondas, tentando comparar os preços do pão em várias localidades, o Folha8 visitou a padaria “Anacarol – Comércio e Indústria de Panificação, Lda”, na rua Kwamme Nkrumah, nº 86, no município da Mainga, em Luanda, e encontrando a mesma encerrada há um mês.

“Caro cliente, a padaria Anacarol informa a todos os seus clientes e amigos que encerramos para obras no dia 13 de Julho do corrente ano, a fim de melhorar os nossos serviços. Queremos desde já apresentar as nossas mais sinceras desculpas,” lê-se num comunicado colado na mesma panificadora.

No quintal da padaria Anacarol encontram-se empoeirados algumas máquinas, que há cada dia enferrujam.

Pesquisando mais informações, encontramos um artigo publicado pelo jornal O País, intitulado: “Máfia na compra de trigo leva padarias à falência”, dando conta que muitas padarias estão a falir por causa de esquemas que tomam conta da compra de farinha de trigo em Luanda.

“Para conseguir a principal matéria-prima usada na produção de pão, os gerentes de padaria têm de dar ‘gasosa’ de até 2000 Kwanzas por cada saco. Em cada município e bairro da cidade capital vê-se pelo menos uma padaria que foi à falência e/ou que esteja a caminhar para esta fase. As que aguentam vêm-se obrigadas a praticar preços altos”, reportou.

Consequentemente, o encerramento de padarias resultou no desemprego de muitas pessoas.

Entre as padarias que encerraram as portas, de acordo com a notícia, constam a padaria Sudu Nafan, localizado no bairro Calemba II, as duas padarias que abasteciam o condomínio Jardim do Éden (uma delas chama-se Bom Preço) no Camama II, e a padaria da Morvic na rotunda do Camama.

Também na lista das padarias que foram à falência, estão a padaria Ango Lukelo no bairro Golf II, e nas imediações da praça do Papá Simão, no município do Cazenga, as padarias Ki Pão e DMS Comercial também não sobreviveram à carência da farinha de trigo.

Portanto, num processo que começa pela falta de divisas no país, impossibilitando a importação da farinha de trigo, tornando o produto escasso nas padarias que fabricam o “pão nosso de cada dia”, o consumidor, sendo os destinatários, chega a pagar pelas consequências da crise económica e financeira no país.

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