Para memória presente e futura, reproduzimos os discursos do general João Lourenço e de Emmanuel Macron no jantar de Estado que o Presidente francês ofereceu, em Paris, ao seu homólogo do reino do MPLA. Começamos pelo do general que, para além de Presidente do país, é também presidente do MPLA, Titular do Poder Executivo e Comandante-em-Chefe das Forças Armadas supostamente apartidárias.
Permita-me que saúde Vossa Excelência, em nome da delegação que me acompanha, e que exprima a minha satisfação pelo convite que me foi endereçado para visitar o Vosso belo país, a França.
É uma honra poder dirigir-me ao Senhor Presidente, nesta que constitui a minha segunda visita de Estado à República Francesa, que ocorre cerca de dois anos após a visita que efectuou à República de Angola, reflectindo a importância mútua que atribuímos à relação entre os nossos dois países.
É-me grato dizer que hoje fizemos um balanço exaustivo e amplamente positivo da nossa cooperação bilateral, alinhámos as nossas visões relativamente aos projectos prioritários em curso e traçámos metas para o incremento das parcerias já existentes, de modo a torná-las cada vez mais benéficas, correspondendo assim ao real potencial das duas partes e aos seus respectivos interesses.
Durante os encontros realizados ao longo do dia, abordámos temas de grande relevância, no âmbito dos quais foi possível estabelecermos uma série de compromissos, sendo que uma parte dos mesmos está já reflectido nos importantes instrumentos jurídicos que assinámos esta tarde e cuja implementação ajudará a dinamizar a nossa cooperação nos mais variados âmbitos, onde destaco os da Agricultura, da Saúde, dos Desportos, da Segurança Interna, do Ambiente, do Ensino Superior e outros.
É minha opinião de que dispomos de um vasto campo de cooperação que não se esgotou nos acordos já assinados e, por isto mesmo, considero que deveremos continuar a trabalhar com vista a concluirmos as negociações dos instrumentos jurídicos que não foram assinados durante a presente visita, porquanto os consideramos de extrema importância para a consolidação da cooperação em importantes sectores.
Gostaria de realçar o facto de o ambiente de negócios na República de Angola ser bastante favorável ao investimento privado estrangeiro em todos os domínios da economia nacional.
Tendo em conta o enorme potencial que existe no meu país, nas áreas da agricultura, da energia e águas, da prospecção e exploração de recursos minerais, da indústria de um modo geral, da indústria agro-alimentar e outras, gostaria de lançar aos empresários da República Francesa o desafio de olharem para o mercado angolano e avaliarem as possibilidades que oferece para realizarem negócios com bons resultados.
Espero, por isto, poder sensibilizar os empresários do vosso país durante o Fórum de Negócios que terá lugar amanhã, no sentido de encorajá-los a investirem nas áreas do seu interesse na economia angolana.
Para esse efeito, quero referir que Angola veria com bons olhos a iniciativa da criação de uma Câmara de Comércio e Indústria Angola – França, para que esta plataforma sirva como base de facilitação de negócios e de contactos entre os empresários angolanos e franceses.
Dentro deste mesmo espírito, regozijo-me com o facto de a República de Angola ter sido admitida, no passado mês de Outubro, como Membro Observador da Organização Internacional da Francofonia, o que vai criar uma aproximação maior entre Angola e a França, e entre Angola e os países francófonos de uma maneira geral.
Durante as conversas que realizei no decurso da minha visita, foi possível trocarmos opiniões sobre os problemas que perturbam actualmente a paz e a segurança em vários pontos do nosso planeta, onde os povos que aí habitam, as economias e as regiões em que estão inseridos, são profundamente afectados por conflitos que precisam de ser resolvidos pela via do diálogo.
Tivemos a oportunidade de falar da situação que prevalece no Leste da RDC, da guerra no Sudão e de outras situações preocupantes que ocorrem no continente africano, sobre os quais coincidimos a respeito da necessidade de se manterem as diligências que estão a ser desenvolvidas por Angola relativamente à República Democrática do Congo, que abrem perspectivas muito animadoras para se encontrar oportunamente uma solução definitiva para esse conflito.
Sobre o Sudão, vimos que é urgente a África e a comunidade internacional em geral agirem articuladamente para se buscar uma solução para uma guerra que se agrava a cada dia, devendo se encontrar rapidamente um entendimento entre as partes em conflito na base dos genuínos interesses do povo do Sudão.
A respeito da Ucrânia, por se tratar de um conflito que ocorre no coração da Europa e pelas suas incidências negativas, não só aqui no vosso continente, como também noutras partes do mundo, falámos bastante da necessidade de se alcançar a paz definitiva para a Europa, pela via negocial.
Dentro de aproximadamente um mês, assumirei a Presidência pro tempore da União Africana, com uma visão unificadora de todas as Nações do Continente, tendo como base o interesse em procurarmos soluções que contribuam o máximo possível para o fim dos conflitos que ainda perduram em África, para que, deste modo, nos concentremos na concretização dos esforços de desenvolvimento e de resolução dos problemas que ainda bloqueiam o nosso caminho em direcção ao progresso social, económico, científico, técnico e tecnológico.
Queremos muito trabalhar com os nossos parceiros externos, numa base em que esteja sempre patente o respeito mútuo, a complementaridade de acções assentes em objectivos comuns, de modo a que a cooperação entre os nossos países funcione num contexto de vantagens recíprocas.
Antes de terminar e porque acaba de acontecer, queremos aproveitar para saudar o acordo de paz alcançado entre Israel e Hamas, que vai pôr fim ao sofrimento do povo palestino da Faixa de Gaza, permitir à libertação dos reféns em mãos do Hamas e de prisioneiros palestinianos, bem como também permitir o início da reconstrução de Gaza.
Vai também dar a possibilidade, pensamos, de abrir o caminho para a solução definitiva do longo conflito, a criação de um Estado palestiniano que possa coabitar lado a lado com Israel.
Quero reiterar ao povo francês os meus agradecimentos pelo acolhimento caloroso e amistoso que me foi reservado a mim, à minha esposa e à delegação que me acompanha nesta visita à França, durante a qual pude sentir toda a simpatia e amizade com que recebem os visitantes.
Peço-vos, assim, que ergamos as nossas taças para fazermos um brinde à amizade, à solidariedade e a um futuro próspero para os nossos dois países e povos, bem como à estabilidade, para que possamos realizar plenamente os nossos objectivos de vivermos num mundo de paz e de concórdia.
Discurso do Presidente Emmanuel Macron
Hoje celebramos Angola com o fervor das grandes amizades. Sim, esta noite, damos-lhe as boas-vindas, Senhor Presidente, a si e à sua nação, cujo destino é tão singular.
Está visita de Estado ocorre num momento de recomposição do mundo que descrevi há alguns dias nesta mesma sala, perante os nossos embaixadores. Desordens geopolíticas, tecnológicas e até filosóficas estão a solapar a confiança na Democracia, na paz e na liberdade. Para fazer face a estes desafios, é crucial a nossa relação com África. Crucial para forjar novas relações baseadas em intercâmbios mutuamente benéficos, que nos permitam enfrentar juntos os grandes desafios de amanhã: clima, segurança, economia, demografia.
Desde os nossos primeiros intercâmbios em 2018, percorremos um caminho que nos permitiu forjar uma relação mais forte e mais vibrante do que nunca. Disso testemunham a minha visita a Luanda em Março de 2023 e a presença de Vossa Excelência hoje em Paris. Mas esta relação vai muito mais além de nós. É uma relação animada pelos empresários, professores, artistas, designers, desportistas, actores institucionais, mulheres e homens que formam o rosto da nossa amizade. Esta noite celebramo-los.
São eles que criam os laços entre os nossos dois países. Um grande escritor português, António Lobo Antunes, escreveu que Angola era, no imaginário europeu, “a outra margem do mar”. Neste mar, neste oceano, estamos todos a construir pontes sólidas que nos permitirão encarar o futuro com confiança.
Estas pontes são, antes de mais, relações económicas fortes e em crescimento. Nem todos sabem que a França é o primeiro investidor em Angola. Setenta empresas francesas estão presentes no vosso país, empregando 15 mil pessoas, com um stock de investimento de 18 mil milhões de Euros. Estamos a reforçar as nossas parcerias em sectores tão variados como a energia, a saúde, a agricultura, a água, a eletricidade, os transportes e até o espaço, com o fornecimento de um satélite. A França e a Europa estão também ao vosso lado para o desenvolvimento do Corredor do Lobito, uma das chaves do futuro de Angola e da região, e no qual estão em primeira linha os investidores europeus.
Este espírito de fraternidade e de respeito abrange também a cultura viva e contemporânea. Congratulo-me com o apoio da nossa embaixada aos jovens artistas angolanos, aos seus projectos e ambições, como o festival Angojazz em Luanda, um festival anual de jazz iniciado por músicos angolanos e que adquiriu uma dimensão internacional.
Esta noite, quis prestar homenagem à cultura angolana, nomeadamente à kizomba, o estilo de dança e música que Angola gostaria de ver classificado como Património Mundial da UNESCO.
Não esqueço o francês, uma língua que partilhamos, falada por uma parte da população angolana e que Vossa Excelência pretende desenvolver, seguindo a dinâmica da adesão de Angola à grande família francófono na cimeira de Villers-Cotterêts em Outubro passado. Duas novas escolas Eiffel, que oferecem uma excelente formação científica bilíngue francês-português aos jovens angolanos de todas as classes sociais, serão inauguradas em Angola em 2025 e 2026. Saúdo a acção da Primeira-Dama, madrinha desta rede que continuaremos a apoiar e a desenvolver.
Minha senhora, Vossa Excelência e a minha esposa visitaram hoje o Castelo de Versalhes, onde admiraram as estátuas do século XVIII que retomaram o seu lugar no Castelo em 2022, graças a Angola, que restituiu à França as obras que os acasos da História haviam deixado na sua posse – um gesto de amizade que a França recebeu com amizade.
Senhor Presidente, Vossa Excelência está também a construir a sua influência através do papel que pretende que Angola desempenhe no mundo. Queremos aqui prestar homenagem à sua determinação inabalável na condução de processos regionais ao serviço da paz, como o Processo de Luanda entre a República Democrática do Congo e o Ruanda. E como, em breve, irá assumir a presidência da União Africana, quero dizer-lhe que pode contar com o nosso apoio, recordando que assumiremos a presidência do G7 em 2026.
Numa altura em que Angola tem um papel tão decisivo a desempenhar em prol do futuro do continente africano, quero prestar homenagem ao seu passado glorioso. Gostaria de citar um excerto do poema “Havemos de Voltar” que Agostinho Neto, o pai da Independência, escreveu da sua cela em Lisboa para sonhar com o dia feliz em que regressaria a uma Angola livre e independente.
Esse dia feliz chegou e foi seguido por um sucesso impressionante a que estamos a assistir 50 anos após a vossa independência. Outros dias felizes virão, marcados com o selo da liberdade, da fraternidade e do progresso. Esta é a esperança que nos une, Excelentíssimo Senhor Presidente, e que une aos nossos dois povos.
França e Angola, estamos juntos!