UM SÉCULO NO PODER SERIA O IDEAL!

O MPLA, partido no poder em Angola desde a independência, em 1975, inicia hoje um congresso extraordinário de dois dias entre polémicas relacionadas com pedidos de impugnação e a alteração dos estatutos. Polémicas menores quando, ao fim de 49 anos, o que a seita pretende é continuar válida a tese de que “o MPLA é Angola e Angola é do MPLA”.

Um dos principais documentos a serem analisados durante o congresso é a tese “MPLA, da Independência aos Nossos Dias, os Desafios do Futuro”, que “visa fazer um balanço dos 50 anos de independência e traçar estratégias para enfrentar os desafios actuais e futuros”, segundo um comunicado do partido. Ainda bem que o MPLA garante que “não quer enfrentar os desafios” do passado”…

O congresso vai também concentrar-se em possíveis ajustes aos estatutos do MPLA, prevendo-se uma revisão do artigo 120, segundo o qual o presidente do partido encabeça a lista de candidatos, pelo círculo nacional, e é também candidato a Presidente da República, abrindo portas à bicefalia no poder. Isto porque, segundo a democracia norte-coreana do MPLA, o presidente do partido é quem manda e não o presidente da república, eventualmente eleito de forma nominal, o que nunca aconteceu.

O militante do MPLA António Venâncio, pré-candidato à liderança do partido, anunciou uma acção contra o congresso depois do Tribunal Constitucional (conhecida sucursal do MPLA) indeferir uma providência cautelar para suspender o conclave do partido agendado para hoje e terça-feira.

António Venâncio reagiu, no sábado, à decisão através da sua página no Facebook, afirmando que o VIII Congresso Extraordinário terá lugar sem que os pressupostos estatutários tenham sido respeitados (como se respeitar a lei, os estatutos e até mesmo a Constituição fossem preocupação do MPLA) , tendo em conta que o TC ignorou os direitos dos militantes à informação, que não foram discutidos previamente os conteúdos da agenda de trabalho e que a convocatória não foi feita com a necessária antecedência.

O porta-voz do MPLA, Esteves Hilário, garantiu, na passada quinta-feira, que estão criadas as condições para a realização do congresso e que será cumprida a agenda deliberada pelo Comité Central, que compreende uma análise sobre o que o MPLA fez desde a independência (claramente, segundo o presidente do MPLA, general João Lourenço, fez mais em 50 anos do que os portugueses em 500) à actualidade e o futuro do partido e o ajustamento aos estatutos.

“Um partido político tem dinâmicas próprias e deve adaptar-se sempre ao contexto”, argumentou, considerando a providência cautelar “normal em democracia” e que o MPLA tem dado provas de que é um partido democrático e não expulsa militantes. Democracia “sui generis” por ser inspirada na mais avançada democracia do mundo, a da Coreia do Norte. Se duvidam basta ver que que Kim Il-Sung, falecido em 1994, foi nomeado Presidente Eterno em 1998, que o seu filho (grande amigo do MPLA), Kim Jong-un, acumula quatro cargos: Primeiro-Secretário do Partido dos Trabalhadores, Presidente da Comissão de Defesa Nacional, Comandante Supremo do Exército Popular da Coreia, e Presidente da Comissão Central Militar e governa sob o título de Líder Supremo.

O congresso do MPLA, que celebrou oficialmente 68 anos no passado dia 10 de Dezembro e é o partido do poder desde que Angola se tornou supostamente independente, realiza-se menos de um ano antes das celebrações do 50.º aniversário da suposta independência nacional.

No dia 9 de Outubro o comunicado final da III sessão extraordinária do Comité Central do MPLA exortou os militantes, amigos e simpatizantes, mais ou menos (segundo o Departamento de Informação e Propaganda do partido) 35 milhões…, a “engajarem-se com dinamismo e responsabilidade na preparação deste importante evento”.

No seu discurso de abertura, o presidente do partido, presidente da Re(i)pública, Titular do Poder Executivo e Comandante-em-Chefe das Forças Armadas, general João Lourenço, disse que o país (queria certamente dizer reino) deve orgulhar-se da sua história, da sua trajectória ao longo deste quase meio século de existência, e destacou que, nos últimos anos, Angola vem melhorando a sua reputação e granjeando um grande prestígio na arena internacional, graças não apenas à sua dinâmica diplomacia, mas sobretudo pelas reformas realizadas em diversos domínios da vida política, económica e social do país.

Acresce, importa reconhecê-lo, que o MPLA é detentor do único herói nacional de Angola, Agostinho Neto, bem como do raro privilégio de ter um dos seus presidentes (Agostinho Neto) como o maior genocida (assassino) da nossa história, distinção merecida por ter mandado assassinar cerca de 80 mil angolanos nos massacres de 27 de Maio de 1977

Segundo o general João Lourenço, o executivo lidera um amplo programa das comemorações dos 50 anos da independência nacional (proclamada a 11 de Novembro de 1975), festa nacional que decorrerá ao longo de 2025.

Os festejos vão contar com actividades políticas, culturais, recreativas, desportivas, feiras e exposições, inaugurações de infra-estruturas (mesmo que já tenham sido, como é habitual, várias vezes inauguradas) e empreendimentos económicos e sociais, tendo o seu ponto mais alto em Novembro, quando se conta receber “importantes convidados”, que vão partilhar “a alegria de um povo livre e independente”. Integrarão – presume-se – essa caravana de “importantes convidados” os 20 milhões de pobres existentes, apesar dos esforços do MPLA para que aprendam a viver sem comer.

“Os cidadãos angolanos, partidos políticos, igrejas, associações cívicas, serão participantes activos desse grande acontecimento, para o qual Angola chama todos os seus filhos”, disse o general, antes da sua frugal refeição.

Nessa reunião do CC foram apreciados e aprovados vários documentos, entre os quais o programa geral do congresso e o programa interno do congresso, o cronograma indicativo de acções para o congresso sob a tese “MPLA – da Independência aos Nossos Dias: O Desafio Futuro”.

De acordo com o comunicado, o CC saudou “efusivamente os esforços do executivo, liderado pelo camarada presidente, João Lourenço, na condução da política externa, com vista à promoção e prestígio do país, à atracção de investimentos e ao reforço da paz e segurança em África e no mundo”.

Como sugestão para a ementa dos convidados que chegarão de todo o mundo, recordamos que, em Julho de 2008, os líderes das oito economias mais industrializadas do mundo (G8), reunidos no Japão numa cimeira sobre a fome, causaram espanto e repúdio na opinião pública internacional, após ter sido divulgada aos órgãos de comunicação social a ementa dos seus almoços de trabalho e jantares de gala.

Reunidos sob signo dos altos preços dos bens alimentares nos países desenvolvidos – e consequente apelo à poupança -, bem como da escassez de comida nos países mais pobres, os chefes de Estado e de Governo não se inibiram de experimentar 24 pratos, incluindo entradas e sobremesas, num jantar que terá custado, por cabeça, a módica quantia de 300 euros.

Trufas pretas, caranguejos gigantes, cordeiro assado com cogumelos, bolbos de lírio de Inverno, supremos de galinha com espuma de raiz de beterraba e uma selecção de queijos acompanhados de mel e amêndoas caramelizadas eram apenas alguns dos pratos à disposição dos líderes mundiais, que acompanharam a refeição da noite com cinco vinhos diferentes, entre os quais um Château-Grillet 2005, que estava avaliado em casas da especialidade online a cerca de 70 euros cada garrafa.

Não faltou também caviar legítimo com champanhe, salmão fumado, bifes de vaca de Quioto e espargos brancos. Nas refeições estiveram envolvidos 25 chefs japoneses e estrangeiros, entre os quais alguns galardoados com as afamadas três estrelas do Guia Michelin.

Segundo a imprensa britânica, o “decoro” dos líderes do G8 – ou, no mínimo, dos anfitriões japoneses – impediu-os de convidar para o jantar alguns dos participantes nas reuniões sobre as questões alimentares, como sejam os representantes da Etiópia, Tanzânia ou Senegal.

Os jornais e as televisões inglesas estiveram na linha da frente da divulgação do serviço de mesa e das reacções concomitantes. Dominic Nutt, da organização Britain Save the Children, citado por várias órgãos online, referiu que “é bastante hipócrita que os líderes do G8 não tenham resistido a um festim destes numa altura em que existe uma crise alimentar e milhões de pessoas não conseguem sequer uma refeição decente por dia”.

Para Andrew Mitchell, do governo-sombra conservador, “é irracional que cada um destes líderes tenha dado a garantia de que vão ajudar os mais pobres e depois façam isto”.

A cimeira do G8, realizada no Japão, custou um total de 358 milhões de euros, o suficiente para comprar 100 milhões de mosquiteiros que ajudam a impedir a propagação da malária em África ou quatro milhões de doentes com Sida. Só o centro de imprensa, construído propositadamente para o evento, custou 30 milhões de euros.

Folha 8 com Lusa

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