Há um ano, o presidente da UNITA, Adalbero da Costa Júnior, acusou o Governo angolano (do MPLA há 48 anos) de ser “corrupto” e “incompetente”, afirmando que é no partido fundado por Jonas Savimbi que recai a missão de inverter este quadro e acabar com o drama (roubo, mais exactamente) “na gestão dos recursos”.
O líder da UNITA sublinhou que Savimbi continua “depois de morto a influenciar e inspirar gerações de jovens” e que “apesar da imensa intoxicação e propaganda contra si (made in MPLA), cresce diariamente a multidão dos que o consideram uma verdadeira inspiração do patriotismo angolano”.
Para Adalberto da Costa Júnior, a sua visão política sobre Angola e o mundo “colocou-o numa posição de alvo a abater, por aqueles que o viam como um obstáculo ao lucro fácil e à exploração desenfreada dos recursos do país” e 22 anos após a sua morte, “o país não se democratizou” apesar das extraordinárias acumulações de capital que deveriam ter servido de alavancas promotoras do desenvolvimento do país.
Por isso, Angola “continua a passar ao lado de uma história de sucesso”. É verdade. Como também é verdade que o MPLA comprou alguns dos generais da UNITA para ajudar a assassinar Jonas Savimbi.
“Todos os angolanos já entenderam que a falta de água e de luz, o desemprego, a exclusão, a pobreza, o subdesenvolvimento, não tem Jonas Savimbi como responsável, mas sim um Governo incompetente, corrupto e antidemocrático”, criticou Adalberto da Costa Júnior, lembrando que a guerra civil acabou há 22 anos.
“Olhemos à nossa volta, que Angola temos nós? Acabou o sofrimento e a miséria? Temos energia e água? A fome acabou? Temos escolas dignas, temos saúde de qualidade”?
O líder da UNITA abordou também o tema da reconciliação nacional, questionando o Governo sobre os patriotas “excluídos” e “ignorados”, nomeadamente Savimbi e Holden Roberto, que chefiava a Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA), outro movimento nacionalista angolano, sem direito a estátuas ou nomes de ruas.
“É assim tão difícil? É esta Angola que sonhámos? É esta Angola que expressa abertura? O que custa um passo de reconciliação deste género”, perguntou Adalberto da Costa Júnior.
Na verdade, que o general João Lourenço não consegue (embora queira) alterar, Angola continua a viver um drama na gestão dos seus recurso, com dívida interna e externa astronómica e a hipotecar o futuro. Isto, é claro, se os angolanos tiverem futuro. Não é certo que o tenham.
Não é possível desenvolver um país, se não tiver plena liberdade, com os seus filhos a saírem e usar todas as oportunidades para procurar outro país para viver, mesmo sem condições.
A IMPORTÂNCIA DE TER MEMÓRIA
Todos sabemos do que o MPLA é capaz. Todos sabemos que o MPLA não sabe viver sem ser no Poder. O regime do MPLA está morto, só ainda não sabe. E, convenhamos, como ainda não sabe não terá problemas em completar o que deixou a meio em 1992: o massacre de cidadãos Ovimbundus e Bakongos, onde morreram 50 mil angolanos, entre os quais o vice-presidente da UNITA, Jeremias Kalandula Chitunda, o secretário-geral, Adolosi Paulo Mango Alicerces, o representante na CCPM, Elias Salupeto Pena, e o chefe dos Serviços Administrativos em Luanda, Eliseu Sapitango Chimbili.
O massacre ocorreu depois de uma fase de paz que se seguiu aos acordos do Alto Kauango e de Bicesse, celebrados em Maio de 1991. A guerra civil entrou então numa nova fase e prolongou-se por mais dez anos.
“Foi naturalmente um dia horrível. Estava-se a discutir a paz”, recordou em Outubro de 2012 à DW Filomeno Vieira Lopes, líder do Bloco Democrático. Ele lembrava-se bem da data que interrompeu o processo de paz em Angola.
Filomeno Vieira Lopes estava fora de casa quando começaram os bombardeamentos. Foi apanhado de surpresa, sobretudo numa altura em que se tentava encontrar soluções políticas para o problema. “Matava-se tudo. Matavam-se todos os que tivessem alguma ligação com a oposição.”
Milhares de apoiantes e até dirigentes da UNITA foram assassinados em Luanda e em outras localidades do país, mas a sanha do MPLA, cujo ADN assassino já mostrara todo o seu potencial em 1977 (nos massacres de 27 de Maio), também não poupou a FNLA.
“Foi a primeira vez, na história da guerra civil angolana, que políticos morrem em combate”, escreveu o jornalista Emídio Fernando no livro “Jonas Savimbi: No lado errado da História”.
De facto, como antes, como agora, como no futuro, o MPLA quis neutralizar todos os que pensavam de maneira diferente do regime.
Foi uma tentativa de decapitar a UNITA. Tanto que fala-se em milhares de mortos, eventualmente até em cerca de 50 mil. É certo que também o próprio vice-presidente da UNITA, Jeremias Chitunda, tal como Mango Alicerces [secretário-geral da UNITA] e Elias Salupeto Pena [sobrinho do líder do partido, Jonas Savimbi] foram mortos nesse massacre. Na história do MPLA, os massacres, ou as purgas, ou o que se lhe quiser chamar, são uma regra estratégica do regime, mesmo até para os próprios simpatizantes do MPLA que, eventualmente, se atrevam a pensar de forma diferente dos líderes.
O tema, como outros, ainda é tabu em Angola e desconhecido pelas novas gerações, embrutecidas, formatadas e manipuladas pelo MPLA.
Estes massacres, quer os de 27 de Maio de 1977, quer os de 1992, são os mais visíveis pelo número de vítimas, mas o MPLA tem muitas outras histórias porque ao longo da guerra – embora a UNITA obviamente também tenha cometido grandes erros – o MPLA, até pelo poder militar que tinha, massacrou muita gente inocente. A paz e reconciliação em Angola nunca se conseguirá com base na mentira ou com a construção de memoriais.
Um dia destes o MPLA vai provar que o massacre do Pica-Pau em que, no dia 4 de Junho de 1975, perto de 300 crianças e jovens, na maioria órfãos, foram assassinados e os seus corpos mutilados no Comité de Paz da UNITA em Luanda… foram obra da UNITA.
Como irá provar que o massacre da Ponte do rio Kwanza, em que no dia 12 de Julho de 1975, 700 militantes da UNITA foram barbaramente assassinados, perto do Dondo (Província do Kwanza Norte), perante a passividade das forças militares portuguesas que garantiam a sua protecção, foi obra da UNITA.
Ou de, entre 1978 e 1986, centenas de angolanos terem sido fuzilados publicamente, nas praças e estádios das cidades de Angola, uma prática iniciada no dia 3 de Dezembro de 1978 na Praça da Revolução no Lobito, com o fuzilamento de 5 patriotas e que teve o seu auge a 25 de Agosto de 1980, com o fuzilamento de 15 angolanos no Campo da Revolução em Luanda.
Ou de, em Junho de 1994, a Força Aérea ter bombardeado a Escola de Waku Kungo (Província do Cuanza Sul), tendo morto mais de 150 crianças e professores, bem como entre Janeiro de 1993 e Novembro de 1994 ter bombardeado indiscriminadamente a cidade do Huambo, a Missão Evangélica do Caluquembe e a Missão Católica do Kuvango, tendo morto mais de 3.000 civis.
É verdade, reconhecemos, que tudo o que de mal se passou, passa ou passará em Angola é sempre culpa da UNITA. Desde logo porque as balas das FALA matavam apenas civis e as das FAPLA/FAA só acertavam nos militares inimigos. Além disso, como também é sabido, as bombas lançadas pela Força Aérea do MPLA só atingiam alvos inimigos e nunca estruturas civis.
Como dizia um dos sipaio do MPLA, que para ser director do Pravda do regime (Jornal de Angola) teve de ser operado e passar a ter o cérebro no intestino, de seu nome José Ribeiro, “quem viveu tantos anos sob o regime de Jonas Savimbi e agora prospera à sombra do mundo da mentira elevada ao nível mundial, jamais consegue perceber o sentido da liberdade nem respeitar os direitos dos outros”.
Terá sido, aliás, por influência desta tese de José Ribeiro que o actual ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal e ex-ministro da Defesa, João Gomes Cravinho, disse, em entrevista ao jornal português Expresso, que Jonas Savimbi era um “Hitler africano”.