MPLA AINDA NÃO SABE QUE JÁ… MORREU!

O grupo parlamentar da UNITA (o maior partido da oposição que, a muito custo, o MPLA ainda permite) arrasou hoje – entre outras questões – a proposta de divisão da província de Luanda, que considerou “uma manobra” do MPLA para distrair as atenções da crise interna e má governação do Presidente angolano.

Eis, na íntegra, o comunicado do grupo parlamentar da UNITA em que é apresentada uma radiografia do estado do MPLA e que, em síntese, permite concluir que o MPLA já morreu… mas não sabe:

«Na semana passada, o País foi surpreendido com o anúncio da realização de um Congresso Extraordinário do MPLA, marcado para Dezembro próximo. Ao mesmo tempo, anunciou-se também que o seu Grupo Parlamentar foi orientado a apresentar um Projecto de Lei para mais uma alteração à divisão político-administrativa do País.

Assim, nos últimos dias, o Grupo Parlamentar da UNITA tem sido interpelado por diversas organizações e cidadãos individuais, que se mostram bastante preocupados e perplexos com esta nova proposta de divisão administrativa do País, em particular da província de Luanda, numa altura em que o Parlamento já devia estar preparado para a aprovação final da Lei da Institucionalização Efectiva das Autarquias Locais.

Convidamos hoje a imprensa para partilhar com os angolanos o nosso ponto de vista sobre estas questões, que se resume em dois pontos:

1º – A questão do Congresso Extraordinário convocado para Dezembro é uma questão política muito importante, que denota a existência de uma crise de liderança no seio do MPLA, com potencial para afectar a estabilidade política e social do País.
2º – O tema da divisão político-administrativa de Luanda, que abarca a criação de uma nova província, constitui apenas uma manobra dilatória para distrair os angolanos da crise interna que o MPLA atravessa.

Os angolanos não se devem deixar distrair. O anúncio de mais uma alteração na divisão político-administrativa do País não é uma questão importante neste momento que deva preocupar as pessoas, porque não tem impacto nenhum na evolução da política nacional nem na gestão da crise económica e social que o País vive. O que é importante e deve merecer a nossa atenção colectiva é a crise de liderança que o Partido-Estado atravessa e a grave crise económica e social que o País vive.

Qual é a agenda do Executivo? Quais são as prioridades do País e quais são as prioridades do Executivo? Quais são as principais preocupações das pessoas, das famílias e das empresas? Qual é o foco do Sr. Presidente: governar ou fazer a gestão do Poder? O que é que o País quer e o que espera dos governantes?

Desde a Independência a divisão administrativa de Luanda já foi alterada 4 (quatro) vezes, sem ter tido qualquer impacto na estabilidade política, económica ou social. Desta vez, também, a medida não é importante, porque não terá qualquer impacto na redução da pobreza e do desemprego, não vai baixar os preços da cesta básica, nem vai melhorar a qualidade da democracia. Ela visa apenas desviar as atenções dos angolanos da contradição principal que o Partido-Estado enfrenta neste momento, a crise de liderança e o término abrupto do mandato do Presidente do MPLA, antes do tempo.

Vamos resumir aqui as razões da crise de liderança do MPLA. Há muito que o MPLA se afastou dos seus fundamentos, e tornou-se uma oligarquia, uma grande empresa de vários interesses para fazer negócios em nome do Estado, com recursos do Estado, mas para benefício próprio. O grupo que actualmente controla o Estado deixou de adjudicar contratos para as empresas dos outros membros do Regime, acusando-os de corrupção. Porém, falhou redondamente no combate selectivo da corrupção e, no final, foi absorvido por ela a tal ponto de, em poucos anos, ter já um recorde significativo de casos de corrupção, em violação da Constituição e da Lei.

O Presidente da República transformou o Estado angolano em agente corruptor, que promove, estrutura, alimenta e institucionaliza a corrupção, tanto a corrupção activa como a corrupção passiva.

Consequentemente, o País está a ser governado por um Governo frágil, falhado e perigoso. A crise social atingiu níveis catastróficos sem retorno, caracterizados por:
▪ Inflação descontrolada e custo de vida insuportável;
▪ Elevados níveis de pobreza sem precedentes;
▪ Degradação do sistema de saúde;
▪ Desinvestimento na qualidade do sistema público de educação;
▪ Desorganização do sistema económico e financeiro;
▪ Deterioração contínua das vias rodoviárias;
▪ Inexistência do sistema de saneamento básico;
▪ Aniquilamento de políticas de prevenção;
▪ Destruição da base dos princípios ético-morais da sociedade.

A retórica sobre o combate cerrado à corrupção foi simplesmente um apanágio para ludibriar e manipular a opinião pública nacional e internacional, porquanto seria impossível que um sistema corrupto fosse capaz de combater o fenómeno por si criado, pois, o próprio Regime vive e sobrevive através da corrupção: corrupção eleitoral, corrupção política, corrupção financeira, corrupção cultural, corrupção moral etc..

Além disso, foi violado o compromisso para a promoção da estabilidade, do progresso social e do bem-estar de todos os angolanos. Ao promover e consolidar a partidarização e o controlo directo ou indirecto, aberto ou velado, das instituições do Estado por um Partido político, o Presidente da República destrói, subverte e atenta contra o Estado democrático de direito.

Ao furtar-se ao cumprimento da Constituição e das Leis que asseguram a boa governação para promover políticas erradas de governação e bloquear a fiscalização dos seus actos de governação pelos órgãos competentes do Estado, o Presidente da República em funções, enquanto Titular do Poder Executivo, tornou-se no único responsável político pela crise geral de governação que o País vive. Ele é o principal responsável político pelas altas taxas de desemprego, pela fome generalizada, pelo aumento constante e insustentável dos preços e também pelo aumento imparável da Dívida Pública. Estes aumentos beneficiam o Regime que faz negócios monopolistas com o Estado e alimentam o empobrecimento estrutural e contínuo dos angolanos, das famílias e das empresas.

A Constituição da República passou a ser utilizada, não como fundamento para o exercício do poder republicano, mas como instrumento para manter o poder oligárquico. E, deste modo, subverter o sistema constitucional de governo da República de Angola.

Foi nestes termos que 90 Deputados à Assembleia Nacional, em nome e em representação de todos os angolanos, e utilizando os poderes que a Constituição confere, assumiram a proposta de iniciativa dos processos de acusação e destituição do Presidente da República, apresentando um Requerimento com as razões da destituição, mais de 170 provas documentais e 10 testemunhas.

A Presidente da Assembleia Nacional decidiu não registar o documento no Diário da Assembleia nem o distribuir para conhecimento e apreciação dos Deputados. Ainda assim, agendou uma reunião para sábado, 14 de Outubro de 2023, com o único objectivo de criar uma Comissão Eventual para elaborar o Relatório Parecer inerente à Proposta de Iniciativa do Processo de Acusação e Destituição do Presidente da República.

A afirmação tornada pública segundo a qual a Assembleia Nacional “deliberou” “rejeitar liminarmente a Proposta de Iniciativa do Processo de Acusação e Destituição do Presidente da República” é falsa. E, por ser falsa, criou um contencioso que o GPU submeteu ao Tribunal Constitucional para decisão. O processo está lá, até hoje, a aguardar decisão.

É nossa convicção que, nestes últimos meses, entretanto, muitos dirigentes do MPLA leram o Requerimento e viram as provas irrefutáveis de violação da Constituição que ele contém. Concluíram que a crise está a piorar a cada dia que passa, a pobreza, o desemprego e a fome aumentam todos os dias, a criminalidade também aumenta, em especial a roubalheira, quer a grande roubalheira, por via dos contratos públicos, quer a pequena, nas empresas, e nos bairros. Sentem que o Presidente precisa de ser travado, para não continuar a afundar o País. Sabem que a vontade pelo terceiro mandato está lá, mesmo que o líder não a manifeste directamente, porque não pode.

No fundo, muitos dirigentes do MPLA terão concluído que HÁ MESMO RAZÕES BASTANTES PARA A DESTITUIÇÃO DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA.

Consequentemente, aumentaram as críticas abertas ao Presidente e novos candidatos à liderança do MPLA começaram a emergir agora, em 2024, cerca de dois anos antes da data aprazada para o Congresso.

Em Maio último, a imprensa noticiou que o MPLA realizaria um Congresso Extraordinário neste ano de 2024. Dias depois, o seu porta-voz declarou que não estava nos planos do Partido qualquer possibilidade de um Congresso Extraordinário neste ano. Um mês depois, a 21 de Junho, o mesmo porta-voz veio anunciar que, afinal, haverá mesmo um Congresso Extraordinário neste ano. Tudo indica que o referido Congresso deverá eleger um novo presidente do MPLA, antes do término do mandato do Presidente em funções, em 2026. É esta a natureza da crise de liderança no MPLA.

Pela segunda vez desde a Independência, um Presidente do MPLA será substituído a meio do mandato. Será por vontade própria? Ou foi forçado pelos seus pares? Pela segunda vez, a partir de Dezembro próximo, Angola viverá um período em que o Chefe de Estado e do Governo não será o Presidente do MPLA.

Como será a coabitação? Que agenda vai o Presidente da República executar? Vai adjudicar alguns contratos aos outros membros do Regime ou vai continuar a beneficiar apenas os seus apoiantes e bajuladores?

Vai abrir a Comunicação Social Pública ao pluralismo e à democracia ou vai continuar a colocar os Órgãos Públicos de Comunicação Social ao serviço do Partido do Regime? Vai tratar os Partidos políticos todos como iguais ou vai continuar a privilegiar o seu Partido? Quem vai dirigir o Grupo Parlamentar do MPLA: o Presidente do Partido ou o Presidente da República?

São estas, em nosso entender, as questões importantes do Estado da Nação que os angolanos devem discutir no espaço público, incluindo, naturalmente, as redes sociais. Há muitas perguntas no ar, muitas incertezas, muita expectativa. Haverá certamente um novo momento político no País, que, se for bem aproveitado, Angola poderá dar um salto para frente, rumo à mudança positiva.

É neste quadro de incertezas, ansiedade e temores que surge o anúncio da nova divisão político-administrativa da província de Luanda. Está claro que é só para distrair as pessoas da questão essencial, que é a crise de liderança, a crise de governação, a crise económica e social que assola o País.

O Regime está desorientado, já não sabe o que fazer. Ora são aeroportos sem aviões, ora são muros instantâneos e milionários, ora são autocarros de $ 600 mil, ora é o aluguer milionário de aviões de luxo, ora são divisões administrativas de províncias ou municípios sem fundamento nem cabimento!

Numa sociedade sem serviços mínimos, onde as pessoas não têm comida nem água potável, as pessoas morrem de fome, com altos índices de delinquência, inflação galopante, custo de vida insustentável, miséria por todos os cantos, justiça corrupta, saneamento básico deficitário, estradas esburacadas, qual é o benefício concreto de haver mais um traçado no mapa que se chame província?

Com mais uma província no papel, será que as pessoas vão passar a ter mais comida em casa? A qualidade da educação vai melhorar? A inflação vai baixar? Os salários e as pensões vão aumentar? A corrupção vai diminuir? Certamente que não. Por isso, não façamos o jogo do Regime. Não nos deixemos distrair com banalidades. Quantas vezes a divisão administrativa da província de Luanda já foi alterada?

Desde a Independência, já houve quatro (4) alterações, e nenhuma delas melhorou as condições de vida das pessoas.

A primeira alteração foi aprovada pela Lei n.º 3/80, de 26 de Abril, que criou a Província do Bengo. O seu objectivo declarado era “melhorar a direcção unitária da capital, estabelecer uma ligação directa das suas instituições com o Governo, bem como criar as estruturas administrativas necessárias para dinamizar a Reconstrução Nacional na capital, activar os serviços locais, melhorar as condições habitacionais, de sanidade, de higiene e aumentar a segurança e a vigilância em todos os domínios”. Já lá vão 44 anos, e o objectivo não foi alcançado.

A segunda alteração aconteceu em 2011, com a aprovação da Lei n.º 29/11, de 1 de Setembro, que alterou a divisão político-administrativa das Províncias de Luanda e do Bengo e a sua delimitação territorial. Foi aí que os municípios de Icolo e Bengo e Quiçama passaram a integrar a província de Luanda. Teve algum impacto na melhoria das condições de vida das pessoas? Certamente que não.

A terceira alteração ocorreu em 2016, através da Lei n.º 18/16, de 17 de Outubro, que criou os municípios de Kilamba Kiaxi e Talatona.

Agora, em 2024, quando o País inteiro estava à espera da implementação efectiva das Autarquias Locais em todos os 164 municípios do País, o Partido-Estado fez aprovar a quarta alteração administrativa da província de Luanda, no quadro do Objectivo 3.2 do seu Programa de Desconcentração e Descentralização Administrativa, que prevê a criação de apenas duas novas províncias e passou a dividir Luanda em 23 municípios, no lugar dos nove actuais.

Porém, mesmo antes da lei ter sido discutida na especialidade, e já depois de o Grupo Parlamentar da UNITA ter apresentado o Projecto de Lei de Institucionalização Efectiva das Autarquias Locais para todos os 164, surge este anúncio de mais uma alteração à divisão político-administrativa do País, só para evitar o debate autárquico e distrair as atenções dos cidadãos da crise de liderança que o Regime enfrenta.

O Regime está profundamente dividido, sem agenda, sem legitimidade e sem qualquer capacidade para continuar a governar. Já não está a pensar no País, porque, se estivesse, teria posto já as autarquias a funcionar e, pelo menos, estaria aliviada a pressão sobre o Presidente da República.

O Presidente da República deve estar a atravessar uma crise de confiança, um daqueles momentos da vida em que a pessoa já não sabe quem está consigo e quem não está. Todos aparecem a sorrir, mas você não sabe se é o riso da bajulação, da falsidade ou da traição
.
Mas é preciso garantir que todo este processo decorra em paz e em fraternidade. Somos todos irmãos e queremos o melhor para o nosso País. É Angola que está em causa. A segurança pessoal de todos deve estar garantida. As ideias, as propostas e as diferenças devem continuar a ser discutidas com respeito e elevação.

Quanto à crise de liderança, esperamos pelo veredicto do Tribunal Constitucional e continuaremos a trabalhar junto dos colegas do Grupo Parlamentar do MPLA para que tenham a coragem de fazer o mesmo, colocando-se abertamente do lado certo da História, cumprindo e fazendo cumprir a Constituição.

Desejamos sinceramente que o MPLA seja bem-sucedido na sua primeira experiência eleitoral de organizar eleições transparentes com candidaturas múltiplas e que transforme a crise actual numa oportunidade para democratizar a si mesmo e consequentemente desbloquear o processo de democratização de Angola.»

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