MAIS UM DESCOBRIDOR DA PÓLVORA

O director executivo da Halo Trust, James Cowan, descobriu a pólvora e registou a patente. Diz ele que Angola “tem de ser ver livre das minas” para desenvolver o ecoturismo e a agricultura e promover a diversificação económica no Corredor do Lobito, afirmou o responsável de uma organização não-governamental britânica. É obra! Sobretudo porque ninguém tinha chegado a esta conclusão…

O director executivo da Halo Trust, que se apresenta como a maior e mais antiga organização de desminagem do mundo, esteve em Luanda e conversou com a Lusa sobre os principais desafios que se colocam ao desenvolvimento destas actividades, entre os quais o financiamento.

“Viemos fazer uma avaliação dos progressos e encorajar os nossos parceiros e doadores a continuarem a financiar o nosso trabalho”, disse James Cowan. E disse muito bem. Quanto mais tempo demorar a concluir o processo de desminagem, mais tempo (em princípio) a torneira financeira continuará aberta.

Operando em 30 países, a Halo Trust celebrizou-se em 1997 quando a princesa Diana foi a Angola e caminhou num dos seus campos minados, no Huambo, para chamar a atenção do mundo para o problema, passos que foram seguidos 20 anos mais tarde pelo seu filho Harry numa visita ao mesmo local.

A Halo Trust está em Angola desde 1994 e já destruiu mais de 118.000 minas terrestres, em mais de 1.050 campos minados, numa área equivalente a 41 quilómetros quadrados, sobretudo nas áreas rurais, operando actualmente em seis das 18 províncias de Angola: Luanda, Huambo, Bié, Namibe, Huíla e Cuando Cubango.

A dimensão do país é, a par do financiamento, outro dos grandes desafios para a operação da Halo Trust. “É um país enorme e com minas em todo o lado”, enquanto noutros países como a Ucrânia, Zimbábue ou Camboja, as minas estão circunscritas a determinadas áreas, indicou o responsável da Halo Trust.

“O nosso trabalho é limpar todo o país, mas a questão da distância cria desafios logísticos, alguns dos lugares onde trabalhamos, no sudeste do país, na área do Okavango (rio Cubango) são extremamente remotos, as estradas estão em mau estado, é muito exigente para os veículos e para as próprias equipas”, salientou.

James Cowan lembra também que Angola viveu conflitos durante décadas, primeiro lutando pela independência contra o regime colonial português e depois numa longa guerra civil em que enfrentou também intervenções estrangeiras da África do Sul, Cuba e União Soviética, que deixaram o país semeado de diferentes tipos de minas.

“Isso significa que os nossos funcionários têm de ser tecnicamente muito especializados, algumas destas minas são das mais perigosas do mundo”, referiu, sublinhando que a desminagem é (desde que haja que pague) uma prioridade para o Governo angolano, que tem investido muito nestas actividades nos últimos anos.

A Halo Trust obteve em 2019 um contrato de 60 milhões de dólares para um período de cinco anos que termina no próximo ano e procura agora um novo contrato com verbas reforçadas e prazo mais alargado.

“Se o país quer diversificar a sua economia, quer recuperar a agricultura, quer construir o Corredor do Lobito – que não é apenas um caminho-de-ferro, atravessa as comunidades – se quer investir no ecoturismo, e desenvolver esta capacidade como o Botsuana, não se pode ter minas terrestres. Botsuana não tem minas. A Zâmbia não tem minas. A África do Sul não tem minas. Moçambique não tem”, apontou.

“Se não nos livrarmos dessas minas, não haverá confiança”, insistiu o director da Halo Trust, dando o mote à sua tese, plagiada de La Palice, de que antes de morrerem todas as pessoas estavam… vivas.

O extenso Corredor do Lobito, via-férrea que se inicia no terminal do Lobito e atravessa Angola percorrendo cerca de 1.300 quilómetros até à fronteira com a República Democrática do Congo, atravessa vários campos minados, segundo o responsável da Halo Trust, que identificou estas áreas como prioritárias.

Em todo o país subsistem cerca de mil campos minados e a Halo Trust está focada em zonas onde se concentra a população ou existe necessidade económica, tornando as áreas seguras para a prática agrícola. Ao longo dos anos, a Halo Trust limpou mais de 5.500 quilómetros de estradas nacionais e emprega cerca de 1.600 trabalhadores angolanos nas brigadas de desminagem.

Parte desta força de trabalho é feminina. São cerca de 900 mulheres, muitas delas responsáveis pelos seus agregados familiares que conseguem assim sustentar as suas famílias e seguir uma carreira.

“É um investimento nelas e um benefício para os seus filhos”, realça James Cowan, declarando-se “muito orgulhoso” do sucesso destas mulheres.

Os “desminadores” são treinados por equipas da Halo Trust e aprendem a distinguir entre os diferentes tipos de minas, avaliando a proximidade à superfície, idade, quantidade de metal, usando detectores sofisticados.

A Halo Trust está também a investir noutro tipo de tecnologias mais avançadas, incluindo veículos robóticos e drones e até inteligência artificial para “varrer” as imagens aéreas e de satélite fornecidas pelos drones.

“Se ensinarmos as máquinas a identificar as minas, podemos fazer a desminagem de forma mais rápida. Estamos focados na tecnologia para tornar os nossos sistemas mais rápidos e mais seguros”, sublinhou James Cowan, indicando que o risco de acidentes é muito baixo.

O maior risco, acrescentou, é não fazer a desminagem. Deixar a mina no terreno representa risco para os civis e para as espécies animais, por isso grande parte trabalho da Halo é fazer a chamada educação para os riscos, sensibilizando as comunidades.

“Estamos empenhados em ter o mínimo de acidentes possível, há sempre alguns, o último foi em maio, felizmente não matou ninguém, mas tentamos aprender as lições para perceber o que correu mal”, afirmou.

Quanto às minas, são destruídas ou usadas com fins demonstrativos na formação, depois de ser retirado (quem diria, não é?) o explosivo.

Quanto à Halo Trust, depois de terminar o trabalho e desmobilizar as equipas locais, está também apostada em deixar competências aos trabalhadores que os tornem mais qualificados para encontrar emprego noutros sectores, como motoristas, mecânicos, operadores de rádio ou gestores de informação, assegurou James Cowan.

Angola, nas mãos do MPLA há 49 anos, deverá falhar o prazo para limpar todo o seu território de minas antipessoal, previsto para 31 de Dezembro de 2025, estima o relatório “Landmine Monitor 2023”, divulgado em Genebra. Anormal seria se, para além do aumento exponencial de pobres, o MPLA cumprisse com algum dos seus compromissos.

De acordo com o estudo anual da Campanha Internacional para Banir as Minas Terrestres, sedeada na cidade suíça, Angola limpou em 2022 um total de 5,87 quilómetros quadrados e destruiu 3.342 engenhos explosivos (contra 5,91 quilómetros quadrados limpos em 2021 e 3.617 minas destruídas), registos muito abaixo dos 17 quilómetros quadrados de libertação anual de terras prevista no seu plano de desminagem.

“A libertação anual de terras de Angola desde 2019 tem sido inferior à libertação anual de terras projectada de 17 quilómetros quadrados, detalhada no seu plano de trabalho para 2019-2025”, aponta o relatório.

“Angola declarou que está a envidar todos os esforços para cumprir o seu prazo” actualmente estabelecido para a limpeza total do seu território – 31 de Dezembro de 2025 -, mas “acredita-se que conseguirá realisticamente concluir a desminagem dos campos de minas conhecidos até 2028, com a possibilidade de alargar o prazo até 2030, dependendo da disponibilidade de fundos”, sublinha o estudo.

Angola foi ainda o 13º país que mais assistência financeira internacional recebeu em 2022, cerca de 12 milhões de dólares (11,24 milhões de euros), e um total 54,9 milhões de dólares (51,4 milhões de euros) entre 2018 e 2022, montante que a coloca em 15º lugar no ranking dos países mais apoiados.

Angola (é claro!) não forneceu qualquer informação sobre a sua contribuição nacional em 2022 para o seu programa de desminagem, embora apoie financeiramente a Agência Nacional de Acção contra Minas (ANAM). O governo angolano é também o maior doador da Fundação Halo Trust.

DESMINAGEM AO SERVIÇO DO PETRÓLEO E DO GÁS

O Presidente (não eleito) de Angola, general João Lourenço, autorizou em Outubro de 2022, a despesa de 16,5 mil milhões de kwanzas (35,2 milhões de euros) para serviços de desminagem nas vias de acesso e zonas de recolha de amostras geológicas e geofísicas na bacia de Etosha/Okavango.

No despacho presidencial 248/22, de 26 de Outubro, o Presidente formaliza a abertura do procedimento de contratação simplificada para a celebração de dois contratos.

O primeiro contrato visou a aquisição de serviços de desminagem das vias de acesso às zonas de recolha de amostras de dados geológicos e geofísicos nas porções Este da bacia do Etosha/Okavango no valor de 8,5 mil milhões de kwanzas (18,1 milhões de euros).

No segundo contrato, foram adquiridos serviços de desminagem das vias de acesso às zonas de recolha de amostras de dados geológicos e geofísicos, nas porções Oeste da bacia do Etosha/Okavango no valor de oito mil milhões de kwanzas (17 milhões de euros).

As despesas da execução desses contratos seriam asseguradas com recursos próprios da ANPG – Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis.

A bacia de Etosha/Okavango inclui as províncias do Cuando Cubango, Cunene, Moxico e Lunda-Sul, área cujos estudos iniciados em 2010 dão conta da “forte possibilidade de ocorrência de petróleo bruto e gás natural”, segundo a ANPG.

A Agência Nacional contra as Minas disse em Setembro de 2021 que Angola necessitava de 200 milhões de dólares (170,8 milhões de euros) para se ver livre de áreas minadas conhecidas até 2028. Um país falido nada consegue fazer sem estender a mão à ajuda estrangeira. Só tem dinheiro para os nababos dos seus dirigente e para a construção de elefantes brancos, como é o caso do Aeroporto Internacional (genocida) Agostinho Neto.

A informação foi avançada durante um workshop sobre a Gestão de Risco Residual (desminagem) pelo responsável pela área de intercâmbio comercial da agência, Adriano Gonçalves, segundo o qual Angola ainda é considerado um dos países mais afectados por minas terrestres no mundo e o país mais afectado a nível de África. E a guerra terminou há 22 anos.

“Este rótulo de ser um dos países mais minados do mundo e o mais minado em África só poderá ser alterado de forma convincente através da informação regular dos progressos alcançados pelo país nos grandes fóruns, nomeadamente na convenção de Otawa, seguindo as normas internacionais e nacionais, bem como a partilha de informação de acordo com o artigo 6º da mesma Convenção”, referiu Adriano Gonçalves no seu discurso de abertura do evento.

Adriano Gonçalves salientou que num passado mais recente, todas as províncias do país estavam afectadas, com menor ou maior número de áreas minadas, mas actualmente devido ao grande trabalho de libertação de terras que se tem levado a cabo ao longo dos anos, bem como a actualização aprimorada da base de dados central, que faz reconciliações regulares de dados com os operadores, já há províncias sem áreas minadas conhecidas, nomeadamente Malanje e Huambo.

“Fazendo uma análise sobre o nível de libertação de terras, por ano, que temos estado a fazer, que são de 10 quilómetros quadrados, nós teríamos uma projecção de até 2028, isto levaria 70 quilómetros quadrados, numa referência de dez quilómetros quadrados por ano, seriam mais sete anos o que nos leva a concluir que Angola seria livre de áreas minadas conhecidas em 2028”, frisou.

O responsável realçou que “se for feito um aumento significativo do financiamento aos operadores, o que se estima cerca de 200 milhões de dólares, em que isto permitiria o aumento da capacidade de libertação de terras, tendo em consideração a garantia dos financiamentos feitos já pelo Governo angolano e doadores, Angola teria a possibilidade de cumprir com a assinatura da Declaração de Maputo de 2014, em que todos os Estados-parte da Convenção de Otava declararam que até 2025 se tornariam livres de áreas minadas conhecidas”.

Folha 8 com Lusa

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