GUERRILHA EM CABINDA SÓ BENEFICIA O MPLA

No final de cada mês, os meus amigos dizem que tomei o mau hábito de fazer uma análise da actualidade política nacional ou internacional, fazendo um paralelismo com o território de Cabinda. Não falhei à minha regra no final de Julho e inicio Agosto, um mês cheio de símbolos para Cabinda, desde o Tratado de Simulambuco de 1885, passando pela Fundação da FLEC até aos famosos Acordos do Namibe. Mas, tal como aconteceu com Cabinda, a França fez a escolha de negar ao Povo do Sahara Ocidental o seu direito à autodeterminação, pisando expressamente certas resoluções da ONU.

Por Osvaldo Franque Buela (*)

Para muitos observadores políticos informados, a posição da França sobre a questão entre Marrocos e o povo Saharaui não surpreendeu mais do que um, dados os dois pesos duas medidas na aplicação do direito internacional há muito adoptado pelo Ocidente, de acordo com os seus interesses geopolíticos e geoestratégicos.

O Presidente Emmanuel Macron, numa carta dirigida ao Rei de Marrocos, tomou posição sobre Marrocos cujas relações diplomáticas normalizou, contra a posição da Argélia que é o principal aliado activo do povo Saharaui, abrindo assim uma grave crise diplomática com a Argélia, cujo aquecimento das relações diplomáticas começava a avançar no caminho certo.

A França considera agora que o plano marroquino “constitui agora a única base para alcançar uma solução política justa, duradoura e negociada de acordo com as resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas”, não sei quais.

Traindo a posição histórica da França, baseada no respeito pelo direito internacional e no direito dos povos à autodeterminação, Emmanuel Macron reconhece a soberania de Marrocos sobre um território reconhecido internacionalmente, a ser descolonizado.

Pessoalmente, é uma decisão que não considero grave politicamente, mesmo que seja tomada por um presidente, à frente de um Estado sem governo ou maioria parlamentar no momento em que decretou pessoalmente uma trégua política durante os Jogos Olímpicos.

Considero esta posição da França historicamente corajosa face aos interesses da França, porque o Presidente Macron só está interessado nos interesses imediatos do seu país e não nos dos Saharauis, nem de uma certa comunidade internacional liderada pelos Estados Unidos que aplica o direito internacional de acordo com os seus próprios interesses, perante uma Europa quase ultrapassada e dividida pela guerra na Ucrânia, pelo conflito israelo-palestiniano e em África a leste da RDC, onde o Ruanda é reconhecido como o principal desestabilizador.

A Argélia, aliado inabalável da Frente Polisário, anunciou de facto a retirada “com efeito imediato” do seu embaixador em Paris poucas horas após o anúncio da nova posição de Paris sobre o Sahara Ocidental, sabendo que isso não mudará fundamentalmente nada no rumo da política externa francesa.

Pessoalmente considero a proposta de Marrocos credível e viável porque visa fundamentalmente investir no desenvolvimento do território Saharaui a nível económico e social, esquecendo completamente a existência dos líderes da Frente Polisário cujos interesses parecem-me já não reflectem socialmente os da juventude Saharaui numa altura em que Marrocos se tornou uma sólida atracção económica, cujo crescimento tende a puxar África para cima.

E A SITUAÇÃO DE CABINDA E DAS FLEC’S, FACE A ESTA POSIÇÃO DA FRANÇA?

Em resposta a esta questão, a França e a União Europeia sempre nos responderam desde 2007, 2012 e 2014 através de ofícios em nossa posse, para eles e para quem quiser saber, dizem que «o problema de Cabinda já foi resolvido internacionalmente».

Liderámos esta campanha com o Presidente Nzita Tiago, o Dr. Joël Bataille como secretário-geral da FLEC e Rodrigues Mingas na altura secretário para informação.

O que nos surpreendeu na altura e que não me surpreende hoje sobre a posição da França é que as respostas da França e da União Europeia a todas as nossas cartas contêm todas uma frase emblemática, gostaria de dizer enigmática que diz : «a província de Cabinda é parte integrante de Angola desde os Acordos de Alvor e que qualquer solução resultante deste conflito deverá ser encontrada com base no diálogo pacífico e no respeito pelos direitos humanos, mesmo que os Acordos do Namibe não tenham trazido a paz esperada».

Gostaria que um único político ou activista de Cabinda me dissesse se desde 2014 temos recebido respostas da França e da União Europeia, se a situação em Cabinda evoluiu no sentido da independência ou nas chamadas e inexistentes zonas libertadas pelas diferentes forças independentistas cabindenses, sabendo que a política é dinâmica.

Esta frase contida nas cartas que aqui citei, deveria chamar a atenção dos políticos cabindenses para melhor interpretação e exploração, mas infelizmente temos poucos ou nenhum político digno desse nome, só temos activistas políticos que até têm dificuldade em colocar o cursor sobre as questões geopolíticas e geoestratégicas de Cabinda.

Hoje, basta percorrer as redes sociais para constatar que os interesses dos dirigentes e presidentes da multidão de FLEC’s que temos já não reflectem com exactidão os interesses desta nova geração de jovens cabindenses formados, para além do sentimento independentista que anima nós todos.

Hoje, ninguém me dirá o contrário, que as estratégias das várias FLEC’s através da resistência armada estão mais no domínio ideológico e populista do que nas realidades que dizem respeito aos reais interesses de uma juventude cabindesa cada vez mais ligada ao mundo, através de meios modernos de comunicações sem fronteiras.

Esta chamada guerra de libertação, com mais de 60 anos, que consiste em matar de vez em quando 5 ou 6 militares das FAA, perdeu a sua eficácia, pelo contrário, tornou-se prejudicial para o povo que dela sofre represálias. Esta guerra das FLEC’s o regime angolano do MPLA de manter Cabinda num estado de pobreza aguda, porque a nível internacional nunca seremos ouvidos por estes métodos, por falta de aliados credíveis.

Ao manter esta estratégia, as FLEC’s alimentam o regime opressor que permanece surdo e mudo aos apelos das mesmas à negociação e fecha a porta a todas as iniciativas a busca de uma solução, por falta de interlocutor, sim porque somos hoje, como ontem, incapazes de nos organizarmos politicamente e fazer que nossas vozes serem ouvidas.

Não estou aqui tentando denegrir, ou subestimar o sacrifício feito por esses irmãos que insistem no caminho das armas, não, mas em cada época e em cada contexto político global, as respostas à nossa causa devem estar à altura dos padrões das questões globais para evoluir, e se a UNITA que era tão forte o fez, as FLEC também o podem fazer e superar o processo caído do FCD para abrir um novo capítulo político na resolução do dossiê de Cabinda.

Manter a resistência armada é continuar a alimentar o MPLA que lucra com esta guerra, que atravessa fronteiras para assassinar os pobres e pacíficos refugiados cabindas nos Congo, chegou a hora de acabar com todas estas mortes desnecessárias, um soldado não tem medo de paz e a única guerra legítima que nos resta travar é a guerra de paz através do entendimento obrigatório entre cabindas, e confrontar o regime com as suas responsabilidades políticas para um novo processo de paz…

Viva Cabinda e a sua gente. Que chegue um processo de paz definitivo.

(*) Refugiado político, França

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