A empresa petrolífera italiana, ENI, deve cerca de 428.777,58 dólares, equivalente a 358.243.668,09 de Kwanzas, de indemnização, aos ex-funcionários da empresa. A decisão foi sentenciada pelo Tribunal Supremo angolano em Maio de 2021.
Por Domingos Miúdo
A informação foi avançada, em exclusivo ao Folha 8, por Morais Sebastião, ex-trabalhador da ENI em Angola, que, por sinal, é tido como um dos notáveis contabilistas do ramo petrolífero no país, e que foi também quadro desta companhia durante 25 anos.
O Tribunal sentenciou, entretanto, que a multinacional italiana, deve pagar a cada despedido os salários intercalares referentes a seis meses, nos termos do n.º 3 do art.º 209.º, e a indemnização por antiguidade, ao abrigo da alínea a) do n. º1 do art.º 239.º, ambos da Lei Geral do Trabalho cessante.
Feitos os cálculos, conforme manda a lei, no total, a empresa sob a liderança de Guido Brusco, só a Morais Sebastião, poderá pagar mais de 190 mil dólares, tendo em conta o tempo de trabalho e o salário que o contabilista auferia na época, que eram USD 9.396,69.
Estão nesta condição quatro funcionários angolanos, afectos, na altura, à Comissão Sindical da empresa italiana de hidrocarbonetos, ENI, e despedidos por defenderem reajustes salariais, à luz da crescente desvalorização da moeda nacional.
Os visados, na época, fizeram chegar em Outubro de 2015 um documento ao director‐geral da empresa, o italiano Guido Brusco, no qual vinha expressa a vontade dos cerca dos 200 trabalhadores angolanos verem os seus salários melhorados, que estariam indexados ao dólar.
O pedido dos funcionários da empresa italiana em Angola era “justo e legítimo”, conforme refere Morais Sebastião, visto que as demais multinacionais que actuavam em Angola no mesmo segmento do mercado, nomeadamente a Exxon, Chevron e Total já efectuavam os respectivos reajustes salariais.
Após várias semanas de espera, e devido ao silêncio a que se terá remetido à direcção da empresa, os funcionários em causa entenderam encaminhar as suas reivindicações para a sede da empresa em Milão; um gesto que, entretanto, viria a custar‐lhe a instauração de vários processos disciplinares.
Depois de terem sido ouvidos, em meados do mês de Dezembro de 2015, em sede dos processos disciplinares, teriam sido humilhados, a ponto de serem “escoltados” até à porta de saída da ENI por efectivos da empresa de segurança privada que prestava serviços à empresa italiana. “Fomos tratados como vulgares criminosos, além de escoltados, não nos foi dada a oportunidade de irmos desligar os nossos computadores”, descreveu Benvinda Mota, ex-funcionária também implicada no processo.
“Nem um cão que ladra é escorraçado daquela forma. Sem saber de nada, como qualquer um dia normal de serviço, sentado na minha cadeira de trabalho em frente do computador, a trabalhar, chegaram com o segurança, senhor Morais, nos acompanha, e lá fomos directamente para a administração, posto lá, disseram: “o senhor está despedido”, sem nenhuma satisfação”, contou o ex-trabalhador.
Em princípio a isso, os despedidos recorreram ao Tribunal de Trabalho na eventualidade de repor a legalidade, e como injustiçados a busca de justiça, o tribunal decidiu a favor dos ex-trabalhadores, julgado o caso como despedimento improcedente, dado a isso a justiça apelou pela reintegração ou indemnização dos implicados, contudo, sem a obediência da ENI.
Ainda assim, Morais Sebastião e os seus colegas não baixaram a cabeça nem cruzaram os braços e muitos deitaram a toalha ao tapete, continuaram na perseverança.
A empresa, na pessoa do advogado Jair Fernandes, recorreu ao Tribunal Supremo por não concordar com a decisão do Tribunal de Trabalho, todavia, o veredicto pareceu “déjà vu”, pois, foi exactamente o que o anterior tribunal decidiu: despedimento improcedente. Uma derrota ao dobro.
Apesar dos tribunais implicados terem decidido a favor dos ex-trabalhadores, isto em Maio de 2021, até ao momento estes continuam a não ter as suas indemnizações efectivadas tudo por conta da desobediência da ENI à decisão do Tribunal Supremo e do Tribunal de Trabalho.
“Depois da decisão dos tribunais, o que uma empresa séria deveria fazer seria nos convocar para, na ocasião, negociarmos, caso mantivessem a vontade de nos despedir, mas não é isso que fizeram”, sublinhou.
Para os ex-trabalhadores, os responsáveis que estariam na linha da frente a inviabilizar o processo seriam a Ana Solange, na altura a directora dos recursos humanos da empresa, e o advogado Jair Fernandes, entretanto, preferem denomina-los de “mafiosos”.
Recordar que, os despedimentos ocorreram em Dezembro de 2015, há cerca de nove anos que a petrolífera busca ignorar o caso para o abafar. O tempo consumiu-lhes todos os créditos que tinham sobre a multinacional italiana, daí que, mantêm-se incrédulos à garantia que vem directo da direcção que afirmou que o departamento jurídico da empresa já tomou o conhecimento e tudo estará a fazer para repor a legalidade e ordem.
Um ano após ter saído da empresa, isto em Dezembro de 2016, a ENI optou por aquilo que o sindicato reivindicava, que lhes custou os despedimentos. Isto foi um dos pormenores cruciais que muito influenciou na sentença dos tribunais.
Por outras palavras quer dizer que o gestor italiano só reconheceu o seu erro um ano depois de ter mandado para a rua os quatro sindicalistas da empresa que lutavam em prol dos interesses dos seus colegas angolanos. O anúncio dos reajustes foi feito no decurso de uma reunião realizada em Dezembro de 2015, na sede desta empresa, no município da Ingombota, em Luanda, durante a qual Guido Brusco assegurou que a partir de Janeiro de 2017 os funcionários da ENI passariam a beneficiar dos salários indexados ao dólar, à luz da cotação oficial do mercado.
Morais Sebastião revelou que o abandono forçado da empresa poderia ter-lhe custado a vida não fosse os colegas que o socorreram a tempo. Contudo, a morte não foi generosa para com a sua mãe e, posteriormente, a sua mulher, ambas sucumbidas após a pesada notícia sobre o despedimento do filho e esposo. Os filhos foram forçados a abandonar a universidade porque já não teria como os custear.
A ENI (Ente Nazionale Idrocarburi, em português Empresa Nacional de Hidrocarbonetos) é uma multinacional petrolífera italiana, existente desde 1953. A empresa actua nos sectores de petróleo, gás natural, petroquímico e bioquímico, produção e comercialização de energia eléctrica a partir de combustíveis fósseis, cogeração e fontes renováveis. A Eni está cotada nas bolsas de Milão e de Nova Iorque e o Estado italiano detém uma participação minoritária no capital social (aproximadamente 30%).
A ENI é membro do consórcio de gás no país e é igualmente parceira da Sonangol, e das multinacionais Chevron, BP (British Petroleum) e Total no projecto Angola LNG.
Conforme os dados, até pelo menos em 2021 a Eni operava em 69 países, tem 32 689 colaboradores e um facturamento de aproximadamente 76 bilhões de euros.
A ENI ocupa a 216ª posição na lista Fortune Global 500 em termos de facturamento e a 461ª na lista Forbes Global 2000 por capitalização de mercado. Além disso, a Eni está no Top 100 Global Energy Leaders da Thomson Reuters e no Top 25 da Thomson Reuters para o sector de Petróleo e Gás.
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