O Bloco Democrático (BD), que integra a Frente Patriótica Unida, lamentou a “posição imediata” do Governo português sobre a decisão do Conselho Constitucional de Moçambique (CC) e desafiou o executivo angolano a “abster-se” de seguir o mesmo caminho.
O BD, em comunicado, “lamenta profundamente” a “posição imediata” do Governo português “legitimando” a decisão do CC, que proclamou a Frelimo e o seu candidato presidencial, Daniel Chapo, como vencedores das eleições de 9 de Outubro.
Para este partido político angolano, a posição do Governo português traduz-se numa “tentativa de impulsionar e liderar a posição europeia que se arrisca a ter critério duplo [sobre as eleições em Moçambique], haja em vista o caso venezuelano e dos governos do espaço CPLP, permitindo que o partido no poder use os meios bélicos e instrumentos ditos legais para conter a onda popular”.
O primeiro-ministro português desejou segunda-feira que a transição de poder em Moçambique decorra de “forma pacífica e inclusiva, num espírito de diálogo democrático”, depois de terem sido divulgados os resultados oficiais das presidenciais moçambicanas.
“Concluído o processo eleitoral pelo Conselho Constitucional e designado Daniel Chapo como Presidente eleito de Moçambique, sublinhamos o propósito de que a transição que agora se inicia possa decorrer de forma pacífica e inclusiva, num espírito de diálogo democrático, capaz de responder aos desafios sociais, económicos e políticos do país”, escreveu Luís Montenegro, numa publicação na rede social X (ex-Twitter).
Por sua vez, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, tinha sublinhado a “importância do diálogo democrático” entre todas as forças políticas de Moçambique e saudado “a intenção já manifestada de entendimento nacional”.
“Acabados de proclamar os resultados oficiais das eleições presidenciais e legislativas pelo Conselho Constitucional de Moçambique, o Presidente da República tomou conhecimento dos candidatos e da força política declarados formalmente vencedores por aquele Conselho”, refere uma nota divulgada na página oficial de Belém na Internet.
Nesta nota, o BD adverte, por outro lado, o Governo angolano a “abster-se de seguir o mesmo caminho [das autoridades portuguesas]”, pois este “é o mesmo caminho para, de forma calculista, debilitar o povo moçambicano através dum processo autodestrutivo como ocorreu em Angola após as eleições de 1992”, apontou.
A organização política, liderada por Filomeno Vieira Lopes, “deplora e condena” também a decisão do CC “avalizando a fraude eleitoral”, que diz ter sido operada pela Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), numa “conjuntura de rotura entre o poder instituído e o povo moçambicano.
Diz apreciar igualmente a resistência do povo moçambicano e a liderança de Eduardo Mondlane na defesa da sua soberania, “contra o regime fraudulento e degenerado moçambicano instaurado pela Frelimo”.
O BD apela ainda ao povo moçambicano para a resistência pacífica, mas determinada e conclusiva com vista a que a verdade eleitoral seja reposta, e pressão de todas as forças democráticas e honestas do mundo a contribuírem para uma solução para a grave situação prevalecente em Moçambique.
O BD pede também ao povo angolano para tirar as “devidas lições e ilações”, pois, frisou, em 2027 (ano de eleições gerais em Angola) “vamos confrontar-nos novamente com as manobras fraudulentas do irmão siamês da Frelimo, o MPLA (no poder desde 1975), na sua ânsia incontrolada de manter o poder a todo o custo”, refere-se no documento.
De acordo com a proclamação feita, Venâncio Mondlane registou 24,19% dos votos, Ossufo Momade 6,62% e Lutero Simango 4,02%.
Pelo menos 56 pessoas morreram em Moçambique desde segunda-feira, na sequência da contestação aos resultados das eleições gerais moçambicanas, e 152 foram baleadas, segundo balanço feito pela plataforma eleitoral Decide.
Recorde-se também que a União Europeia (UE), organização perita e chegar sempre atrasada, mesmo quando é – como foi o caso – avisada antes dos acontecimentos eclodirem, assumiu estar “extremamente preocupada” com a violência pós-eleitoral em Moçambique e “a considerável perda de vidas” até ao momento, pedindo “responsabilização” dos seus autores.
Numa declaração oficial a UE apela à “contenção” das partes, e que “se abstenham de qualquer acção que possa exacerbar ainda mais as tensões”.
Ou seja, a União Europeia beneficia o infractor e castiga a vítima. Nada de novo, é claro, chega da Europa a África. Aliás, como em Angola, os europeus adoram ter nos países africanos dirigentes corruptos e partidos eternizados no Poder (49 anos em Angola com o MPLA, e outros 49 com a Frelimo em Moçambique) pois, e é verdade, é muito mais fácil negociar com ditaduras do que com democracias.
“Apelamos igualmente à responsabilização e à justiça para se resolver os casos de violação dos direitos humanos”, refere a declaração, recordando que “como testemunho do empenho contínuo” em “contribuir para o reforço da democracia em Moçambique”, a UE enviou uma Missão de Observação Eleitoral (MOEUE) às eleições moçambicanas, com cerca de 180 elementos.
“A MOEUE constatou irregularidades durante a contagem dos votos e a alteração injustificada dos resultados eleitorais. A missão apelou aos órgãos eleitorais para que assegurem a máxima transparência do processo de contagem e apuramento”, lê-se na declaração da União Europeia. Ou seja, apesar de saber que houve fraude, pede contenção tanto ao criminoso como à vítima.
Na mesma declaração, a UE refere que “continua disponível para apoiar Moçambique na reforma do sistema eleitoral” e que “as próximas recomendações da MOEUE poderão contribuir para essa reforma”.
Ainda assim, “encoraja o Presidente eleito e a nova administração a iniciarem rapidamente um diálogo construtivo com a oposição e com as organizações da sociedade civil pertinentes” de forma a “restabelecer o contrato social com a população e para fazer respeitar os valores democráticos e os direitos humanos”.
“A parceria União Europeia-Moçambique é abrangente e tem como seu alicerce o povo moçambicano. A UE renova o seu compromisso em apoiar um futuro próspero e pacífico para o povo de Moçambique”, conclui.