A AFRICANIDADE NÃO SE DEFINE PELA COR DA PELE

José Eduardo Agualusa, Orlando Castro e Mia Couto são mais patriotas que muitos negros “pan-africanistas” radicados na Europa. É hora de questionarmos: o que faz de alguém um verdadeiro patriota africano? No nosso continente, onde as linhas de cor muitas vezes são confundidas com as de identidade, precisamos de repensar noções de pertença e amor à Pátria.

Por Malundo Kudiqueba Paca

Este é um tema que se impõe, principalmente quando falamos de figuras como Eduardo Agualusa, Orlando Castro e Mia Couto. Estes escritores, embora brancos, são tão africanos quanto qualquer negro. O que os define não é a cor da pele, mas sim o compromisso profundo que têm com a verdade e o desenvolvimento das suas nações. E, numa era em que a África enfrenta complexos desafios, o patriotismo tem de transcender superficialidades e envolver a alma.

Um “pan-africanista” de sofá, que observa África de longe, na segurança de um país europeu, não tem autoridade moral para criticar aqueles que, como Eduardo Agualusa, Orlando Castro e Mia Couto, vivem e respiram África todos os dias. É uma contradição flagrante que um negro radicado na Europa critique brancos africanos que vivem e defendem o continente.

Quem é mais africano? Quem está na terra ou quem apenas fala dela? O patriotismo, como nos mostram Agualusa, Castro e Couto, não é uma questão de aparência, mas sim de presença e propósito. Estes autores levam nas suas palavras uma preocupação genuína com o futuro de Angola, Moçambique e do continente africano em geral. Na sua obra, Eduardo Agualusa expressa essa pertença: “Sou africano. Amo esta terra, com todas as suas contradições e feridas, e é aqui que quero ser enterrado.” Esta é a declaração de um homem que não se limita a viver em África, mas que carrega África dentro de si.

Ao longo dos últimos tempos, têm surgido vozes que questionam a africanidade destes homens, como se a cor da pele fosse um atestado de compromisso com a pátria. É uma visão limitada e perigosa. Afinal, se há algo que Agualusa, Castro e Couto demonstram com clareza é que o verdadeiro patriotismo não se vê, sente-se. “A cor da pele não passa da casca que nos cobre”, como disse um dia Mia Couto, que sempre soube colocar a África no centro das suas obras. Ser africano não está em como parecemos, mas em como vivemos, amamos e nos sacrificamos pela terra que nos acolhe.

Estes escritores têm sido criticados, até atacados, por aqueles que não conseguem ver para além da superfície. Mas a verdade é que, através dos seus livros e artigos, eles têm sido mais patriotas do que muitos dos que, munidos de discursos vazios, tentam desacreditá-los. Estes autores escolheram enfrentar as realidades incómodas e expor os problemas das suas sociedades, sem receio das consequências. São vozes que nos ajudam a ver África como ela é, sem filtros, mas também com esperança e propósito. Em vez de esconderem a dor, a injustiça e a corrupção que afectam os seus países, eles expõem essas feridas com a coragem de quem acredita na cura. É fácil ser patriota em discursos inflamados, mas poucos têm a ousadia de falar a verdade quando esta pode ferir.

Num continente que busca a paz e a prosperidade, não há lugar para o tribalismo e para as divisões raciais. Ser africano é partilhar o amor por esta terra, é lutar pelo seu crescimento e pelo bem-estar de todos os seus cidadãos. Mia Couto sintetizou este ideal: “A África não é uma cor. É uma forma de ser, de estar, de sentir.” Esta é uma afirmação profunda e necessária, que desafia a noção de que a identidade africana é definida por aparência ou linhagem.

Eduardo Agualusa e Orlando Castro são angolanos, tal como Mia Couto é moçambicano, mas cada um deles é também um embaixador de uma África aberta, consciente e destemida. Estes homens defendem valores que vão para lá das fronteiras geográficas e culturais. Através das suas palavras, mostram-nos que o patriotismo é, em última análise, um compromisso com a verdade e com o sonho de uma África livre e próspera. E isto, por si só, já é mais do que muitos dos que os criticam podem dizer.

Ao longo da história, muitos heróis africanos enfrentaram preconceitos, divisões e ataques – não por serem brancos ou negros, mas por desafiarem o status quo. Agualusa, Castro e Couto não fogem a esta tradição. “Só é verdadeiramente livre quem não tem medo da verdade,” disse Orlando Castro, e é esta verdade que ele, Agualusa e Couto procuram revelar nas suas obras, mesmo que isso lhes traga incompreensões e críticas.

Num continente onde a diversidade é um dos nossos maiores tesouros, devemos valorizar aqueles que, independentemente da sua cor, carregam a África no coração e dedicam as suas vidas ao seu futuro. Estes homens são tão africanos como qualquer outro cidadão negro, pois ser africano é um estado de espírito, uma luta diária, uma missão. E, como já disse Mia Couto, “há muitos tipos de cor na vida, mas só uma cor é comum a todos os africanos: a cor da dignidade.”

A realidade é que “há brancos africanos que são mais patriotas do que muitos negros que se dizem defensores de África, mas que vivem a milhares de quilómetros de distância, confortavelmente instalados na Europa.” Esta é uma verdade desconfortável para alguns, mas a cor da pele nunca foi e nunca será um indicador absoluto de patriotismo ou de dedicação ao continente. Aqueles que verdadeiramente amam África estão presentes, enfrentam os seus problemas de frente, com tudo o que isso implica – a insegurança, as dificuldades económicas, os desafios sociais e políticos. É uma contradição flagrante que alguém, estando a salvo numa sociedade europeia, critique esses “brancos africanos” que dedicam as suas vidas ao continente.

A africanidade não se define pelo lugar de nascimento ou pela cor da pele. O próprio conceito de patriotismo vai muito além da etnia ou da origem. Quem é mais africano? Quem vive em África, com todas as suas complexidades e desafios, ou quem fala dela de longe, sem a viver, sem a experimentar, sem a sentir verdadeiramente? O que é mais fácil: levantar a voz a partir de um ponto seguro ou abraçar África de corpo e alma, independentemente da cor, da condição, ou dos preconceitos que isso possa acarretar?

É fácil falar de África quando se está longe das suas crises diárias. É fácil criticar aqueles que, como Eduardo Agualusa, Orlando Castro e Mia Couto, têm a coragem de enfrentar as realidades mais duras do continente e de as expor nas suas obras. Estes homens falam das feridas da sua terra não como um insulto, mas como uma forma de a curar. Eles usam as palavras para mostrar uma África verdadeira, sem ilusões e sem máscaras, uma África que luta por uma identidade forte e justa. Quem critica à distância não conhece a verdadeira face do sacrifício que é amar e defender África quando se vive nela.

O “pan-africanismo de sofá” tem-se tornado um fenómeno cada vez mais visível nas redes sociais, onde as discussões inflamadas e os ataques gratuitos substituem o debate sério e informativo. Mas, a verdade é que “o patriotismo não é uma questão de cor de pele, mas sim de presença e compromisso. O compromisso com o continente não se mede pela aparência, mas sim pela entrega, pelo sacrifício e pela esperança.

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