O Presidente da Zâmbia, Hakainda Hichilema, certamente inspirado pela homenagem protocolar ao assassino António Agostinho Neto e ao ditador José Eduardo dos Santos, diz que o seus país está interessado em investir na refinaria do Lobito, em construção na província de Benguela, considerando não fazer sentido importar combustíveis de outras partes do mundo quando tem um vizinho produtor.
Hakainda Hichilema, que realiza uma visita oficial de 72 horas a Angola, manteve hoje um encontro com o seu homólogo angolano, general João Lourenço, e falou à imprensa no final da reunião de trabalho das delegações dos dois países, que assinaram seis instrumentos jurídicos para o reforço da cooperação entre os dois Estados.
O chefe de Estado zambiano salientou que o petróleo é um dos principais produtos de consumo, sublinhando a importância dos combustíveis para a economia da Zâmbia.
“Não sei como é que nós conseguimos manter esta situação de comprar combustíveis da Arábia Saudita e de outras partes do mundo e não a nível do nosso vizinho. Acredito que todos estão chateados com isto, porque o mercado está aqui próximo, e a Zâmbia também se devia sentir mal, que não estejamos a comprar ao nosso familiar que está na próxima esquina, na mesma casa, isto é inaceitável”, frisou.
De acordo com o programa de visita, Hakainda Hichilema desloca-se amanhã a Benguela (a prometida Califórnia do MPLA), onde deverá visitar o Corredor do Lobito e as obras de construção da refinaria do Lobito.
Por sua vez, o general João Lourenço disse que as obras de construção da refinaria do Lobito deverão estar concluídas em 2026, destacando a importância da execução de outros projectos para melhor servir o país vizinho em termos de combustíveis.
“Os combustíveis são importantes para o desenvolvimento de qualquer economia, os combustíveis é energia. É muito natural que a Zâmbia, sendo nossa vizinha, tenha bastante interesse em adquirir esses combustíveis em Angola, no país vizinho, sobretudo quando Angola tiver capacidade maior de refinação do petróleo bruto que extrai”, referiu o Presidente angolano.
O general João Lourenço informou que foram retomados os trabalhos para a conclusão da refinaria do Lobito, e neste intervalo, outros projectos que devem ser executados, nomeadamente a construção do canal ferroviário Luacano/Jimbe, para fazer chegar os combustíveis da refinaria do Lobito à Zâmbia por via-férrea, em cisternas sobre carris.
Canal ferroviário. Envio de combustíveis por via-férrea. Em cisternas sobre carris. Será que o presidente Hakainda Hichilema percebeu? Não seria melhor fazer um desenho?
“Mas uma solução melhor do que essa de transportar os combustíveis por via-férrea é sem sombra de dúvidas a construção de uma ‘pipeline’ entre a cidade do Lobito e a Zâmbia”, afirmou o general João Lourenço. Apesar de ser “um” (e não “uma”) pipeline (é um nome masculino), o raciocínio é erudito.
Segundo o (nosso) general João Lourenço, este projecto, que tem vindo a ser pensado há algum tempo, mantém-se de pé, e a sua construção está sob responsabilidade da parte zambiana, “que inicialmente tinha indicado uma empresa, mas que por qualquer razão essa empresa acabou por ser substituída por uma outra”.
“Acredito que este passo de substituição da primeira empresa terá a ver com certeza da necessidade de se imprimir uma maior velocidade no projecto de construção da/do ‘pipeline'”, frisou.
Da parte angolana, garantiu o general presidente, serão dadas todas as facilidades no sentido de se construir a ligação em tempo útil, ou seja, antes da conclusão da refinaria do Lobito.
Na conferência de imprensa, o Presidente angolano manifestou-se confiante que as economias dos dois países vão evoluir se “houver trocas comerciais fáceis, se houver investimento angolano na Zâmbia e se houver investimento zambiano em Angola”. Excelente. Linguisticamente excelente. Desta vez João Lourenço não disse se “haver trocas”, se “haver investimento”…
“É para isto que estamos a trabalhar e acreditamos que desta vez não estamos aqui para apenas nos limitarmos a assinar acordos de cooperação, apenas a manifestar intenções de interesse, mas estamos aqui para fazer as coisas acontecerem”, salientou.
O general João Lourenço disse também que Angola conta com o país vizinho, com o qual partilha uma fronteira comum de 1.110 quilómetros, para o repovoamento de gado, matéria de que a Zâmbia é “muito forte”.
“Nós queremos ir beber a sua experiência, Angola tem a necessidade de repovoar o país em gado, particularmente gado bovino, para além da possibilidade de comprarmos carne da Zâmbia como produto acabado para consumo imediato do nosso mercado”, destacou.
Por mera curiosidade, não aplicável em Angola, recorde-se que a Zâmbia pôs fim a uma lei que proibia os cidadãos de difamar o seu chefe de Estado, uma promessa do presidente Hakainde Hichilema, eleito em 2021 após décadas na oposição. Pelos vistos, em matéria de os cidadãos terem direito à indignação, não aprenderam nada com os donos de Angola (o MPLA, obviamente).
O presidente Hakainde Hichilema assinou no dia 23 de Dezembro o decreto de abolição de algumas leis da era colonial, o que suscitou reacções entusiásticas por pare de organizações não-governamentais e activistas dos direitos humanos.
Hakainde Hichilema “aprovou o código penal de 2022, que aboliu a pena de morte e o delito de difamação do presidente, presentes nos livros de estatutos da Zâmbia desde a era pré-independência”, disse o porta-voz da presidência, Anthony Bwalya, em comunicado.
Folha 8 com Lusa