O representante do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) em Angola disse hoje que a situação das crianças angolanas apresenta melhorias (cinco milhões, por exemplo, estão fora dos sistema de ensino), mas existem ainda muitos desafios, manifestando-se preocupado com os casos de abuso sexual de menores. A Unicef sabe que as nossas crianças, são, continuam a ser, geradas com forme, nascem com fome e morrem pouco depois com fome. Mesmo assim… branquear o crime é a palavra de ordem.
Em declarações à Lusa, Ivan Yerovi diz: “Se olharmos para as estatísticas e os dados dos anos anteriores vemos que a situação da criança melhorou, mas ainda temos muitos desafios, ainda temos muitas crianças que nunca foram vacinadas, temos crianças que sofrem de desnutrição crónica, temos crianças que sofrem violência sexual, temos ainda muitos desafios”.
Ivan Yerovi, que falava à margem da sessão de apresentação do Orçamento Cidadão 2023 realizada no Ministério das Finanças, destacou que apesar dos desafios, anima “o compromisso do Governo para melhorar a situação da criança” que é uma prioridade. Talvez por uma questão de educação cívica, o representante da Unicef meteu a verdade no bolso, passando ao lado do facto de o compromisso assumido pelo Governo (é assim há 48 anos) ser uma acção de propaganda, no caso para a ONU ver e ajudar a vender.
“A situação da criança é uma prioridade, é precisamente a ligação que temos que fazer entre o Orçamento Geral do Estado e o discurso de prioridade”, realçou Ivan Yerovi, passando (mais uma vez) um atestado de matumbez aos angolanos e um certificado de bajulação ao MPLA.
O acesso à escola (muitas das quais, no país real, nem carteiras têm) foi uma das melhorias que Ivan Yerovi citou sobre os avanços na situação das crianças, com “mais crianças que estão a chegar ao ensino primário, por exemplo”. Isto sem, sequer, lembrar que cinco milhões delas estão fora do sistema de ensino.
Segundo o representante da Unicef, a contrapor ao maior número de crianças com acesso à escolaridade, verifica-se o abandono escolar, sobretudo de meninas, devido à gravidez e matrimónio precoce, situação que “preocupa muito”.
“As meninas têm que fazer as tarefas da casa, cuidar dos irmãos mais pequenos, é uma dinâmica, uma situação que temos que abordar, não só o Ministério da Educação, mas também o compromisso dos governadores do nível provincial e dos administradores municipais, que têm uma responsabilidade também”, sublinhou.
Em Angola, segundo dados do Fundo das Nações Unidas para a População (FNUAP), 20% dos 1,4 milhões de nascimentos anuais são meninas, adolescentes, com idades entre os 10 e 19 anos.
O representante da agência das Nações Unidas avançou que o acesso aos serviços básicos é muito mais desafiante, mas existem também problemas nas cidades, que não existem no interior do país. Isto, é claro, num país que é independente há 48 anos.
“Por exemplo, a violência sexual, o maior número de casos de meninas que são abusadas sexualmente é em Luanda, o problema temos na província de Luanda – tem uma razão, que temos muito mais população – mas o número de casos de violência sexual contra crianças não temos nas províncias”, frisou.
Já o acesso à água potável é “por razões óbvias” muito menor no interior do país e maior nas cidades, “o que torna tudo muito relativo quando olhamos para o acesso aos serviços básicos”.
Orçamento Cidadão 2023 (para inglês ver)
O Ministério das Finanças de Angola destacou hoje a importância da publicação do Orçamento Cidadão, em parceria com a Unicef, “uma forma acessível” de partilhar (apenas para efeitos de propaganda e para bajuladores verem) o documento com todos os cidadãos.
A mensagem foi expressa pela secretária de Estado para o Orçamento e Investimento Público, Juciene de Sousa, na primeira sessão deste ano de divulgação do Orçamento Cidadão 2023, um exercício realizado desde 2018.
Segundo Juciene de Sousa, a publicação do Orçamento Cidadão tem sido frutífera, na medida em que facilita “uma compreensão mais nítida e mais ampla sobre a forma como o Estado obtém e aplica os seus recursos”, tendo a vantagem de os 20 milhões de pobres o poderem ler enquanto procuram comida nas lixeiras. Há, aliás, quem diga que até cheira a… caviar.
“Na verdade, há já vários anos que fazemos e publicamos esta versão simplificada do Orçamento Geral do Estado. Mas queremos que tenha mais visibilidade e, portanto, mais utilidade, como forma de reforçar a literacia financeira de todas as angolanas e de todos os angolanos”, referiu.
Descobrindo a pólvora ou, quiçá, a pedra filosofal, Juciene de Sousa sublinhou que o reforço da literacia financeira é muito importante para que se aumente a consciência cidadã. Éobra!
“Ter consciência cidadã é ter consciência, com base em informação completa e fidedigna, sobre os nossos direitos e nossos deveres como cidadão, assim participando activa e civicamente em todas as questões da comunidade”, frisou a governante, acrescentando que “cidadãos mais bem informados e mais conscientes são também cidadãos mais exigentes”.
“Cidadão mais exigentes, munidos de conhecimento rigoroso e de informação credível, exigem mais e melhor de quem os governa e ajudam, portanto, a melhorar a governação”, salientou.
A secretária de Estado realçou que a estratégia de divulgação do Orçamento Cidadão inclui palestras e outras acções dirigidas, em particular, aos jovens estudantes e aos membros de associações juvenis da sociedade civil, realizadas em institutos médios e universidades nas várias províncias.
Por sua vez, Ivan Yerovi considerou que esta iniciativa contribui para o aumento da literacia financeira orçamental e o reforço da transparência em questões orçamentais.
“O Orçamento Geral do Estado deve ser um documento onde cada cidadão ou cidadã deve ter a suas aspirações ou necessidades revistas. Daí a importância de exercícios como estes, que demonstram não só o compromisso com a transparência, mas também assegura a participação do cidadão, que no final de tudo é o principal beneficiário de qualquer acção, projecto, programa, incluídos no orçamento”, disse.
Ivan Yerovi sublinhou que a agência das Nações Unidas apoia as instituições de defesa dos direitos da criança a examinarem as propostas orçamentais, bem como os relatórios de execução, e promove a monitorização pelos cidadãos das despesas e dos resultados, através da preparação e publicação de resumos orçamentais.
“No caso concreto de Angola, o apoio no desenvolvimento e na divulgação do Orçamento Cidadão faz parte do memorando de entendimento entre a Unicef e o Minfin [Ministério das Finanças] focado em acções que promovem a transparência e participação pública no ciclo orçamental e na comunicação sobre a importância do Orçamento Geral do Estado para crianças e jovens e o público em geral, numa linguagem simples e acessível para garantir maior engajamento dos beneficiários”, expressou.
O representante da Unicef em Angola vincou a importância do Orçamento Cidadão porque “apresenta dados sobre o orçamento aprovado e isto é crucial para apoiar o planeamento orçamental no futuro e para acompanhar até que ponto os compromissos assumidos pelo orçamento estão a ser traduzidos em acções directas para beneficiar crianças e os jovens”.
Sobre o Orçamento Geral do Estado de 2023 angolano, Ivan Yerovi disse que se verifica que na dotação orçamental do sector social, a educação foi a que maior fatia absorveu, tendo-se situado nos 32,6%, seguida da saúde com 27,7% e a habitação e serviços comunitários com 22,9%.
“Por sua vez, a protecção social ocupou 14,2%. É notório este aumento e expectável que o mesmo tenha um reflexo positivos na vida das famílias particularmente das crianças”, apontou.
Uma outra nota a ser realçada neste Orçamento Cidadão, tem a ver com a prioridade de políticas que contribuem de forma positiva para a igualdade de género, “trazendo assim uma perspectiva de género no processo orçamental”, observou.
Folha 8 com Lusa