A UNITA, o maior partido da oposição que o MPLA (ainda) permite em Angola, classificou hoje como “politicamente motivadas” as acusações do porta-voz da polícia do MPLA (que deveria ser do país) sobre a responsabilidade do partido na desordem após as manifestações de sábado, admitindo mover um processo por calúnia e difamação. O sentido de humor às vezes tem destes delírios.
Numa nota de imprensa, o Secretariado Executivo do Comité Permanente da Comissão Política da UNITA referiu que no sábado, dia em que foi realizada uma manifestação nacional, o porta-voz da Polícia do MPLA acusou o partido, no noticiário da Televisão Pública (outra sucursal do MPLA), de ser o “responsável e organizador dos actos de desordem e arruaça que tiveram lugar em várias cidades do país, com destaque para as cidades de Luanda e Benguela”.
No documento, a UNITA considerou “descabidas, intolerantes e politicamente motivadas as declarações proferidas pelo porta-voz da Polícia Nacional”, denunciando e condenando “veementemente a postura instrumental e parcial assumida pela TPA e TV Zimbo, que em momento algum contactaram a direcção da UNITA para observar um princípio básico do jornalismo credível e independente, ouvir o contraditório, desrespeitando assim a Constituição e a lei”.
Mas contactar a direcção da UNITA para quê? Isso só faria sentido se Angola fosse o que não é – uma democracia e um Estado de Direito.
Nesse sentido, o partido “pondera e reserva-se no direito de mover um processo-crime contra o Porta-Voz da Polícia Nacional pelos crimes de calúnia e difamação”, acrescentou.
“A Polícia Nacional, enquanto órgão republicano deve ter uma postura apartidária, imparcial e responsável e, abster-se de agir como mera instrumentalidade de interesses contrários aos desígnios nacionais”, sublinhou-se na nota. São gafes e mais gafes. Desde logo porque a UNITA sabe que a Polícia não é Nacional, tal como sabe que não é um órgão republicano e que, por isso, não pode ter uma “postura apartidária, imparcial e responsável”.
Por outro lado, o maior partido na oposição “repudia a postura violenta da Polícia Nacional contra os jovens que se manifestaram, no sábado passado, para exigir melhores condições de vida, e recorda a opinião pública nacional e internacional que não foi a direção da UNITA que adotou medidas políticas que agravaram a crise socioeconómica que o país vive hoje”.
“O Secretariado Executivo do Comité Permanente da Comissão Política da UNITA está ciente da estratégia de distracção do partido-Estado em transferir o ónus do fracasso da governação à UNITA, quando este decorre, claramente, da incapacidade e insensibilidade do partido-Estado em responder e corresponder às demandas da sociedade”, observou-se na nota.
O partido considerou ainda que, “num Estado verdadeiramente democrático e de direito, os cidadãos são livres de se associar ou participar de reuniões públicas ou privadas, pelo que o Secretariado Executivo do Comité Permanente da Comissão Política da UNITA entende ser um direito pessoal e inalienável a participação dos seus membros, enquanto cidadãos angolanos, nas referidas reuniões ou manifestações, independente das funções que exercem no partido ou na Assembleia Nacional”.
“O deputado é, antes e acima de tudo, um cidadão com direitos, sobretudo deveres de defender e proteger o povo e velar pela boa execução das leis”, destaca-se no documento, em que se exorta os cidadãos angolanos a “não desistirem da luta por uma Angola democrática, próspera e de dignidade” e se reafirma a “total disponibilidade” do partido “ao diálogo para a consolidação do Estado democrático e de direito”.
A polícia do MPLA, recorde-se, dispersou, no sábado, em Luanda, capital de Angola, a marcha contra a subida do preço da gasolina, fim da venda ambulante e alteração à lei das Organizações Não-Governamentais, com recurso a gás lacrimogéneo, tiros e porrada, originando pânico e desmaios, resultando também em alguns ferimentos e detenções.
Que a Polícia dita nacional é apenas do MPLA é uma realidade muito antiga, data da sua fundação. Recordemos um texto aqui publicado em Agosto de 2012 sob o título “Comandante assume que, afinal, a Polícia Nacional não é de Angola mas sim do MPLA”.
«Se dúvidas existissem sobre a democracia que não existe em Angola, ou sobre o Estado de Direito que Angola não é, basta ver o que diz o comandante da suposta Polícia Nacional de Angola.
O comandante da Polícia Nacional de Angola criticou hoje o “pronunciamento leviano” do líder UNITA a pedir o adiamento das eleições gerais e disse que a sua força está pronta para responder a essa “ameaça” e garantir a votação.
Ou seja, aquilo a que se chama erradamente Polícia Nacional de Angola é, de facto, a Polícia Nacional do MPLA. Mas, como é óbvio, nada disso incomoda a CNE, muito menos os observadores eleitorais e ainda menos a comunidade internacional.
Em conferência de imprensa em Luanda, Ambrósio de Lemos afirmou que a Polícia Nacional “não vai permitir que haja perturbações em função dessa ameaça” às eleições gerais na sexta-feira, garantindo a defesa até às “últimas consequências” do Governo e do seu líder.
Dúvidas? O comandante da dita Polícia Nacional de Angola garante, sem papas na língua e perante a passividade da comunidade internacional, que vai defender até às “últimas consequências” o Governo e o seu líder, José Eduardo dos Santos, candidato do MPLA.
“Somos uma instituição do Governo e a polícia vai defender este Governo até às últimas consequências e muito especialmente o seu líder, porque é um Presidente que está aqui, e não podemos permitir que qualquer pessoa de forma leviana desafie e insulte a mais alta entidade deste país”, declarou o comandante nacional da Polícia.
Ora tomem! A Polícia Nacional de Angola não é uma instituição do país mas, isso sim, “uma instituição do Governo”.
Bem que a CPLP, tal como os países que a integram e ainda a União Europeia, na pessoa do sipaio Durão Barroso, poderiam limpar a cara à merda que tanto lhes agrada no regime angolano.
Isaías Samakuva, líder da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), anunciou o desejo de um encontro com o presidente do partido no poder, José Eduardo dos Santos, para discutir o adiamento das eleições, em resultado de alegadas irregularidades, não se responsabilizado pelas consequências caso o diálogo seja recusado.
Para Ambrósio de Lemos, assumido funcionário do MPLA nas funções de comandante da Polícia, o pronunciamento do líder do maior partido de oposição foi “leviano” e levou-o a questionar o motivo pelo qual a UNITA aceitou anteriormente a data da realização das eleições e a participação na campanha eleitoral.
“Porque fizeram a campanha eleitoral? É uma pergunta que se pode fazer. A campanha eleitoral teve lugar em todo o país e esse senhor terminou-a com esse pronunciamento”, disse o comandante da Polícia Nacional (do MPLA), acrescentando que, “naturalmente, quem de direito irá dar resposta a isso”.
A Polícia Nacional, garantiu, “está pronta e prestará serviços específicos nesta quadra para dar resposta a todos os desafios que atentem contra a estabilidade e a materialização das eleições” e apela “a todas as formações políticas para que os seus militantes e simpatizantes observem as leis, normas e regulamentos estabelecidos”.
“Os pronunciamentos de incitamento à desordem devem ser banidos de qualquer um dos políticos envolvidos neste processo eleitoral”, disse Ambrósio de Lemos, insistindo que, em caso da perturbação da ordem, a sua força não irá esperar para dar “uma resposta para o imediato restabelecimento da segurança pública”.
O comandante nacional da Polícia do MPLA informou que o pronunciamento da UNITA não alterou o plano de segurança previsto para sexta-feira, que envolve um total de 70 mil efectivos em todo o país, e confia que “o povo está maduro, consciente, quer paz” e não vê necessidade de se entrar “numa violência ou numa contenda”.»
Folha 8 com Lusa
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