LUANDA, CAPITAL (TAMBÉM) DA PROSTITUIÇÃO

A província de Luanda continua com um elevado número de adultas e adolescentes vulneráveis, envolvidas em práticas de prostituição, muitas vezes, pagas em dinheiro, por kilapi e em espécie: sal, arroz, óleo, massa alimentar, atum, carne seca e bebidas alcoólicas.

Por Elias Muhongo

O fenómeno tem estado a ganhar contornos preocupantes, tornando-se, a cada dia, numa prática institucional para os mais pobres e carenciados, uns filhos de desempregados, outros de desmobilizados de guerra e, também, os discriminados pelo anacrónico sistema de educação. Diferente de um passado recente, hoje esta prática tem mulheres e homens, que entregam a sua “força física” (corpo) por uma remuneração pela prestação de um contrato a termo certo.

A cidade de Luanda transformou-se num “prostíbulo”, onde à noite, adultas e adolescentes disputam clientes com o convénio de alguns seguranças e donas (os) das roulottes, bares, restaurantes que trabalham nas proximidades, e que emprestam os seus postos de trabalho, para prostituição, em troca de pagamentos.

Em Angola, as “profissionais do sexo”, são uma realidade, mas estão longe de reconhecimento, quer por serem estigmatizadas, como pela falta legislação capaz de regular a actividade, que existe e resiste às sanções administrativas e mesmo policiais. Particularmente, na capital de Angola o índice de prostituição é extremamente elevado e tem estado a ganhar contornos preocupantes, tornando-se a cada dia que passa, numa prática que cresce assustadoramente, naquela que é conhecida como a capital de Angola, Fundada a 25 de Janeiro de 1576 pelo fidalgo e explorador português Paulo Dias de Novais, sob o nome de “São Paulo da Assunção de Loanda”, que completa hoje 447 anos da sua existência.

De lembrar que a prostituição é considerada a mais antiga profissão do mundo e é a troca consciente de favores sexuais por dinheiro. Uma pessoa que trabalha neste campo é chamada de prostituta ou prostituto e é um tipo de trabalhador sexual. A prostituição é um dos ramos da indústria do sexo. É igualmente considerado como tal, sendo as mulheres praticantes, ratadas como profissionais, com direito a pensão de reforma e demais regalias sociais, iguais aos demais trabalhadores. O estatuto legal da prostituição varia de país para país, a ser permitida, mas não regulamentada, a um crime forçado ou não, ou a uma profissão regulamentada. A prostituição é praticada mais comumente por mulheres, mas há um grande número de casos de prostituição masculina em diversos locais ao redor do mundo.

Em Angola, as trabalhadoras do sexo são uma realidade mas estão longe de reconhecimento como profissionais ou prostitutas, quer por serem estigmatizadas, como pela falta legislação capaz de regular a actividade, que existe e resiste às sanções administrativas e mesmo policiais. Em Luanda, existem vários pontos, onde os olhos enxergam o óbvio e, hoje, mais do que nunca, em função da crise que levou e leva ao desemprego, todos os dias milhares de cidadãs. A profissionalização do sexo pode ser um recurso, ao invés de pensarmos que nada existe, neste reino cada vez mais violento. Luanda conhece nos últimos tempos várias zonas que se estão a tornar famosa: Baixa de Luanda, Ilha, Mártires de Kifangondo, centralidades de Luanda, hospedarias, ruas, e outros locais de maior concentração do “negócio” são os bares e pensões.

Para algumas “profissionais” do sexo, abordadas pelo Folha 8, apontam o desemprego, como a real causa do fenómeno bastante visado à noite no centro da cidade de Luanda, enquanto que outras, evocam o desamparo familiar originado por divórcios e separações.

De recordar que no Ordenamento Jurídico Angolano, a prostituição não está tipificada como crime ou delito, mas considera-se ultraje público ou atentado ao pudor, à luz do Artigo 390. Mas muitas destas mulheres reconhecem que são discriminadas, humilhadas, agredidas e até assassinadas, por delinquentes, polícias e até maus pagadores, que cavalgam todos os dias entre ruelas, ruas, becos e esconderijos, onde estas vendem prazer, visando a arrecadação de valores para alimentar e educar os filhos. Moradores das centralidades do Sequele e Kilamba dizem que, “a situação é crítica” em relação aos índices de prostituição. Igualmente, o aumento de casos de prostituição que se regista nos últimos quatro anos na capital do país, deve-se à pobreza e perda de valores em muitas famílias.

“Não falo só de adultas, hoje, vê-se e ouve-se, é uma realidade tanto nos grandes centros urbanos quanto em pequenas cidades, sendo também uma das mais sórdidas violações dos direitos de crianças e adolescentes, inúmeras denúncias de que meninas dos 12 aos 17 anos vendendo os corpos por dinheiro e o fim é alimentar as suas famílias e satisfazer suas necessidades materiais. Mas, infelizmente, poucos intervêm. Alguns questionam no silêncio, outros participam nessa aberração e assassinato a um Direito Humano Fundamental. O Conselho Nacional de Acção Social (CNAS), criada em 2016 pelo Decreto Presidencial n.º 137/16 de 17 de Junho como um órgão de concertação social e de acompanhamento das políticas públicas, de promoção e defesa dos direitos da criança, pessoa com deficiência e outros grupos vulneráveis, dotado de personalidade jurídica, autonomia financeira e administrativa. Nada faz”, analisa a docente universitária Fernanda Matias, residente na centralidade do Sequele.

E acrescenta: “É o órgão a quem competiria velar por essas situações, mas que infelizmente, não adoptou uma política integral com foco na criança, algo conotado pelo Comité dos Direitos da Criança aquando das Recomendações do Comité dos Direitos da Criança para Angola, relativa à Convenção e dois Protocolos adicionais sobre Prostituição e Pornografia Infantil e sobre as Crianças envolvidas em conflito Armado19, em 2018. Mesmo nos relatórios de Direitos Humanos de Angola, Angola confirmou que todas as formas de prostituição, incluindo a infantil, são ilegais. Infelizmente na prática, os que têm a obrigação de denunciar e agir nada fizeram, apenas as ONG locais chegaram em algum momento a expressar a preocupação com a prostituição infantil. Foi codificado por Angola, os “11 Compromissos de Protecção à Criança” onde definem um conjunto de tarefas essenciais e prioridades que deveriam ser desenvolvidas a favor da criança, e coordena as políticas do governo para combater todas as formas de abuso contra as crianças, incluindo o trabalho infantil ilegal, tráfico e exploração sexual, compromisso 8.º nº 3, e). Infelizmente, não passa do papel para pratica”.

Isabel Chissola, estudante da 10ª classe, diz que os colegas sabem que pratica esta profissão à noite: “No princípio, era discriminada, mas hoje já ninguém se mete comigo. Às vezes, recebo conselho dos professores, mas se deixar, como vou viver, como vou estudar? Hoje, sou obrigada a recorrer às redes sociais (Facebook e watshapp) para captar clientes, cheguei mesmo a ponto de fazer “kilapi” com os clientes já conhecidos, por falta de cliente com valores na mão, os prazeres fazem parte da vida humana e todo homem hoje quer sexo, daí que, liberamos os kilapeiros, apesar de sofrer represália, por que ninguém condena quem trabalha com drogas, álcool e muitas vezes transforma as pessoas em alcoólicas, os das tabaqueiras, que causam cancro a milhões de pessoas, mas apontam o dedo a nossa profissão sem saber, que para nós é um grande risco, ficar uma noite inteira na rua, sujeitas a todos os crimes e agressões possíveis, tudo para não entrarmos na vigarice, nem na delinquência”.

Indaga a adolescente de 16 anos, que preferiu o anonimato, que luta, entretanto, para deixar as drogas. “Estou a tentar deixar o uso das drogas, mas não está fácil, porque os meus clientes, na maioria, também consomem drogas”, conclui o seu relato choramingando. Além da prostituição, as raparigas, por serem inimputáveis (menores de idade), são usadas pelos seus promotores para comercializarem drogas leves, com destaque para a liamba. Uma dessas protagonistas é a adolescente “Bela, das rápidas” (nome fictício), de 16 anos, que diz ter entrado para o mundo da prostituição após ter sido violada pelo tio”, disse.

Hoje a capital de Angola caminha com o futuro desprotegido, os mais vulneráveis são as vítimas de todo tipo de abusos e ninguém os protege. Quanto ao dinheiro recebido, dizem que, vai dos 500 kz a 1000 kz sexo oral e vaginal 1000/1500 a 2000 kz, mas se for por noite, é 3000 kz. “O cliente é que paga o sitio, os valores nos ajudam nos usados da compra de material de beleza, roupa, comida e na propina da escola”, dizem.

Às 19 horas são visíveis adultas e adolescentes, aparentemente entre os 12, 17, 20,25 até 40 anos, trajadas de calções curtos, colãs ou outras roupas extravagantes, resistindo as autoridades angolanas que ainda não se fazem sentir a constituição e a fome fala mais alto. Apresentando, com dados, os locais onde são exercidos esses tipos de práticas.

“Para mim, prostituição é já um meio de sobrevivência para muitas mulheres no país. Tenho acompanhado muitas vezes nos canais televisivos, nas rádios e na imprensa escrita reportagens sobre o fenómeno, mas até hoje constato que o problema se agrava ainda mais na nossa cidade capital. Em Cacuaco, Sambizanga, distrito urbano do Zango (Ferrari, Zango 3, Zango 4), na ilha seca onde mãe e filhas juntas fazendo prostituição, na faixa etária dos 14-17 anos de idade; Kilamba local denominado “Povoado” e Bita, onde no primeiro caso, as meninas cobram caro pelos serviços sexuais e no segundo, até 500 Kzs serve como pagamento e a idade no geral é dos 12-17; Kikolo, Rangel, Golfe 2, Calemba 2, Ingombota, Samba e da Camama 1, onde a maioria se prostitui para sustentar suas famílias”, informa e lamenta, Agostinho Kassinda.

A prostituição não está tipificada como crime, embora possa ser avaliada como atentado ao pudor. O sociólogo Benjamim Tchipilica disse que, “fica difícil acabar com a prostituição no país, enquanto a miséria prevalecer e é sabido que, na maioria das vezes, a prostituição vem da pobreza geral, da miséria proletária, da promiscuidade, das habitações colectivas, da falta de educação profissional e de trabalho honesto, dos lares desfeitos e defeituosos, do alcoolismo paterno, da infância desarrimada… desvirginadas muito cedo, antes mesmo da menarca, são varridas de casa pelos pais intolerantes e arbitrários, aliam-se às más companhias, são ultrajadas pelos patrões sem escrúpulos e pelos chefes que exploram sua dependência… que respeitam o anonimato e não lhes pede qualquer qualificação, a não ser a de seus dotes físicos. Para mim, a fome tem sido ausência de sono de muitas prostitutas nos arredores da cidade de Luanda”

Já Manuel Gonçalves, ouvido pelo Folha 8, apela à intervenção das autoridades competentes de forma a criar mecanismos legais que possam proteger as adolescentes “empurradas para a prostituição”.

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