DA CALIFÓRNIA AO… LOBITO

O governo angolano (do MPLA há 48 anos) atribuiu a concessão da gestão do terminal do Porto do Lobito, por um período de 20 anos, à Africa Global Logistics, informou o ministério dos Transportes num comunicado.

A concessão da gestão, manutenção e exploração do terminal polivalente de contentores e carga geral do Porto de Lobito foi atribuída através de um procedimento de contratação simplificada (ajuste directo) tendo a proposta da Africa Global Logistics SAS (AGL) ficado classificada em primeiro lugar.

A Africa Global Logistics integra o grupo Mediterranean Shipping Company (MSC Group), líder global no transporte marítimo, que opera em mais de 155 países, empregando mais de 100.000 trabalhadores.

A empresa conta com 23.000 trabalhadores e centra a sua actividade na gestão e manutenção portuária, concessões ferroviárias, operações logísticas e agenciamento marítimo, estando presente em 49 países.

É responsável pela operação de 21 concessões portuárias (incluindo 17 terminais de contentores, sete terminais Ro-Ro e dois terminais de produtos florestais) e duas concessões ferroviárias, uma nos Camarões (Comrail) e outra na ligação entre a Costa do Marfim e o Burkina Faso (Sitorail).

A “Califórnia” ainda… mexe!

Em Maio de 2021, o Porto do Lobito, empresa estatal angolana em Benguela, lançou o concurso internacional para a gestão e exploração do seu terminal polivalente de contentores e carga geral, para um período de 20 anos, anunciou a empresa.

Na altura a empresa referiu que o concurso era aberto à participação de entidades internacionais a coberto da Lei dos Contratos Públicos e da Lei do Investimento Privado, para a gestão em regime de “porto senhorio”, durante 20 anos.

A empresa manifestou desde logo preferência por candidatos com experiência neste mercado, com solidez financeira acima dos 25 milhões de dólares (20,5 milhões de euros) de capitais próprios e um volume de negócios médio anual não inferior a 100 milhões de dólares (82,3 milhões de euros) nos últimos três exercícios.

Os concorrentes tiveram de elaborar e apresentar como condição elegível os planos de exploração e de organização do referido terminal, incluindo o ordenamento e a organização funcional da área de concessão, e as normas referentes às exigências ambientais, de higiene e de segurança.

Além destas exigências, as empresas deveriam ainda apresentar a sua perspectiva de construção, reparação e conservação do espaço objecto da licitação, assim como a instalação ou substituição dos equipamentos necessários à execução do contrato.

De acordo com o prospecto do concurso, a entidade adjudicatária pretendia que as concorrentes ou as suas subsidiárias, cuja participação fosse de, pelo menos, 25% em pelo menos três operações de concessão de terminais portuários nos últimos anos, tenham capacidade neste tipo de operações.

A empresa estatal sublinhou que a concessão dos terminais em concurso representa “uma força motriz para o rejuvenescimento do corredor do Lobito, que integra Angola, República Democrática do Congo e Zâmbia”, pretendendo o Governo angolano manter-se num dos principais eixos de circulação de matérias-primas e mercadorias nestes territórios.

“A estratégia do executivo angolano em colocar a concurso o terminal polivalente de contentores e carga geral, segue uma lógica de racionalidade económica, para tornar mais intenso e dinâmico o comércio dos países integrantes do sistema e rentabilizar as principais infra-estruturas de transporte que integram o corredor do Lobito, que são o Porto do Lobito, o Caminho-de-Ferro de Benguela e o Aeroporto internacional da Catumbela (Benguela”, salientava-se no documento.

O concurso, destacava a empresa, apresentava “inúmeras vantagens, como a integração da economia angolana no âmbito do mercado comum regional, o escoamento da produção de minério da República Democrática do Congo e da Zâmbia, através do oceano Atlântico, bem como a promoção do processo de diversificação económica para Angola e a nível regional.

O Porto Comercial do Lobito, com três terminais, nomeadamente o de contentores, com uma capacidade de 12 mil unidades de contentores de 20 pés (TEUS) por ano, o mineiro, com capacidade operacional de 3,6 milhões de toneladas por ano, e o Porto Seco, um terminal de segunda linha, com capacidade estática de oito milhões de TEUS/ano, movimenta acima de 600 mil toneladas de produtos trimestralmente.

A província de Benguela, no litoral sul do país, representa o segundo maior centro económico e industrial de Angola, cujas potencialidades económicas aliadas ao processo de requalificação do corredor do caminho-de-ferro e o de concessão do terminal portuário, representa um valor estratégico determinante para a integração económica regional e para o futuro de Angola.

“Todos estes aspectos reforçam claramente o papel do corredor do Lobito como uma das principais plataformas de acesso aos restantes países da África Austral”, sublinhava-se.

Um (valioso) contributo para a Califórnia do MPLA

Em Benguela, na pré-campanha eleitoral (acto simbólico – como se sabe – para fingir que em Angola existe uma democracia de facto), João Lourenço afirmou que o então governador provincial e hoje porta-voz do Departamento de Informação e Propaganda do MPLA, Rui Falcão, era obrigado a ‘’transformar a região numa Califórnia em Angola’’, capaz de mexer com a economia e gerar empregos. Isto porque João Lourenço considerava que o agro-negócio, a pesca, a indústria e o turismo podiam elevar Benguela à categoria de uma região norte-americana, a Califórnia.

Na altura ficou a saber-se que Lisboa e Benguela poderiam vir a ter voos directos (em 2020), dependendo da conclusão do processo de certificação do aeroporto da Catumbela. Recorde-se que já em Fevereiro de 2014 este aeroporto, inaugurado dois anos antes, estava à espera de receber a certificação de aeroporto internacional por parte do Instituto Nacional da Aviação Civil.

Na altura, faltava o terminal de carga, instalações para alfândega e montagem de algum equipamento. Em declarações feitas em Fevereiro de 2014, o presidente do Conselho de Administração da Enana, Manuel Ceita, foi peremptório: “Já existe a ordem por parte da tutela para se resolver essa questão e nós vamos cumpri-la.”

Segundo o actual ministro dos Transportes, Ricardo de Abreu, citado no Jornal de Angola, a certificação do aeroporto internacional da Catumbela, 20 quilómetros a norte da cidade de Benguela, capital da província homónima, estava numa fase “avançada” de negociações, devendo estar concluído até ao fim do ano ou, o mais tardar, no início de 2020…

Ricardo de Abreu falava na sequência da visita que o Presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, efectuou às províncias da Huíla e Benguela, tendo adiantado ter tido conversas com as autoridades portuguesas sobre a possibilidade de a ligação aérea directa se concretizar, o que dependeria também de um estudo de viabilidade económica.

As duas províncias, vizinhas, albergam uma das maiores comunidades portuguesas em Angola, sobretudo empresários ligados às áreas industriais e agrícolas, região que aloja também o Porto do Lobito, um dos maiores do país, e o Caminho-de-Ferro de Benguela (CFB).

O “hub”, a concretizar-se em pleno – já estava em funcionamento, embora ainda de forma deficitária -, vai permitir não só escoar a produção agrícola e industrial do interior angolano, via caminho-de-ferro, como também a dos países da região, como República Democrática do Congo, Zâmbia e Zimbabué (tal como fora previsto na altura colonial).

Em 1899, o governo português iniciou a construção da ferrovia para dar acesso ao interior e às riquezas minerais do então Congo Belga. Após a morte de Cecil Rhodes, em 1902, Robert Williams, um amigo de Rhodes, tomou conta da construção e completou a ligação a Luau, em 1929, constituindo a empresa Companhia do Caminho-de-Ferro de Benguela SARL.

O acto solene do início da construção do CFB foi realizado no dia 1 de Março de 1903, junto à ponte sobre o rio Cavaco (então Ponte D. Carlos), tendo sido presidido pelo Governador-Geral de Angola, Cabral Moncada.

O primeiro trecho operacional da CFB iniciou-se em 1905, ligando o Lobito à Catumbela, graças à chegada ao porto do Lobito da primeira locomotiva, a nº 1, em Novembro de 1904, vinda de uma metalúrgica de Leeds, no Reino Unido.

A linha mostrou ser um sucesso, revelando-se muito rentável para as potências coloniais, especialmente por ser a ligação mais curta para transportar as riquezas mineiras do Sul do Congo para a Europa. Em 1931, o porto do Lobito recebeu por via férrea o primeiro carregamento de cobre proveniente do Catanga.

Segundo Ricardo de Abreu, se tudo correr normalmente, as ligações aéreas directas de e para Lisboa, bem como de e para outras capitais africanas, poderão ser uma realidade a partir do aeroporto da Catumbela, inaugurado em 27 de Agosto de 2012.

“Acredito que sim, por aquilo a que assistimos ao longo da visita do Presidente Marcelo Rebelo de Sousa. Há a possibilidade de termos a Catumbela a fazer ligações directas a Lisboa e outras capitais”, sublinhou, citado pelo Jornal de Angola.

Ricardo de Abreu adiantou que estava também em curso a alteração do próprio regime de exploração dos aeroportos de Angola, o que irá permitir acelerar o processo de certificação não só da Catumbela como de outros aeródromos do país.

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