Os deputados angolanos recomendaram hoje ao executivo “maior rigor” na contratação e certificação da dívida pública e a possibilidade da redução da taxa do IVA de 7% para 5% para “todo o sector produtivo”.
As referidas recomendações constam do projecto de resolução que aprova o Orçamento Geral do Estado (OGE) 2023 apresentado hoje ao plenário da Assembleia Nacional (parlamento) durante a sessão da votação final e global do OGE para este ano.
No domínio da economia, planeamento e finanças, os deputados defendem a inclusão na proposta do OGE dos próximos exercícios de um relatório com informação detalhada de cada projecto evidenciando o seu valor total e fonte de financiamento.
O nível de execução física e financeira, valor de incidência do exercício e o valor residual de cada projecto deve também constar do relatório, recomendam, sugerindo ainda que nos próximos exercícios financeiros, no âmbito do processo de desconcentração financeira, “seja clarificada” e apresentada a origem das receitas fiscais locais.
Recomendam também que sejam adoptadas “medidas céleres” para que a Administração Geral Tributária cumpra com o prazo estipulado de reembolso do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) e seja estudada a possibilidade de redução da taxa do IVA de 7% para 5% “para todo o sector produtivo”.
Maior rigor na contratação e certificação da dívida pública consta também entre as recomendações dos deputados, que defendem que o processo de regularização do pagamento das dívidas “deve priorizar” os que estão em atraso às pequenas e médias empresas.
“Que seja revisto o quadro legal sobre o Regime Jurídico de Autofacturação tendo em atenção que o Decreto Presidencial n.º 194/20 que regula a matéria em causa termina a sua vigência em 31 de Dezembro de 2022 de modo a se evitar que sejam aplicadas multas aos contribuintes por consequência desse vazio legal”, observam.
Na resolução, apresentada antes da votação final do OGE 2023, que passou na globalidade com 124 votos a favor, 86 votos contra e nenhuma abstenção, os deputados alertaram ainda as autoridades ao risco de sobreendividamento “em função da subida das taxas de juro no mercado financeiro internacional”.
No domínio da saúde, os parlamentares recomendaram o reforço das verbas do Instituto Nacional de Luta contra o Cancro, “pelo facto de o número de casos estar a aumentar e na sua maioria convergir para a província de Luanda para tratamento”.
“Que por remanuseamento sejam reforçadas verbas para o combate à malária, tripanossomíase, tuberculose, VIH, lepra e as doenças crónicas não transmissíveis, programa de saúde comunitária, programa de vacinação e para as doenças tropicais negligenciadas”, referem na resolução apresentada pelo deputado Joaquim de Almeida.
Pedem ainda às autoridades para que “equacionem melhor” as propostas dos cadernos reivindicativos dos órgãos sindicais do sector da educação, como o Sinprof (Sindicato Nacional dos Professores) e o Sinptenu (Sindicato dos Professores e Técnicos do Ensino não-Universitário), “de forma a evitar-se as constantes greves dos seus profissionais”.
Em relação à componente da acção social, os deputados recomendam que o Programa Kwenda (programa de transferências monetárias às populações mais vulneráveis) seja “mais inclusivo”, com prioridade para “as pessoas com deficiência e com grau de vulnerabilidade acentuada” e que, “adicionalmente sejam desenvolvidos programas que envolvam além da transferência de renda o desenvolvimento de micro projectos com a componente de formação e capacitação”.
A necessidade do reforço das verbas atribuídas ao sector da defesa e segurança, “para melhor apetrechamento” do sector com meios técnicos e tecnológicos, está igualmente entre as recomendações dos deputados ao executivo angolano.
Sugerem ainda que este ano “seja revista e actualizada a pensão de mérito do antigo combatente e veterano da pátria assim que terminar o processo de cadastramento”.
O OGE 2023, aprovado hoje na globalidade, estima receitas e fixa despesas de 20, 1 bilhões de kwanzas (38,3 mil milhões de euros), sendo 13,4 bilhões de kwanzas (25,5 mil milhões de euros) receita fiscal e 6,6 bilhões de kwanzas (12,5 mil milhões de euros) receita financeira.
Apenas o MPLA (no poder há 47 anos), Partido de Renovação Social (PRS), FNLA e do Partido Humanista de Angola (PHA) votaram favoravelmente o documento. A UNITA, maior partido na oposição que o MPLA ainda permite, voltou a reprovar o OGE.
Entretanto, a ministra das Finanças, Vera Daves, disse hoje que a auditoria à dívida pública tem sido feita em permanência pela Inspecção Geral da Administração do Estado (IGAE), respondendo à UNITA que voltou a solicitar esta inspecção.
“Quem agora certifica a dívida pública comercial é a IGAE, ou seja, os atrasados sempre que tiverem ocorrido fora do sistema não respeitando as regras de execução orçamental é a IGAE que tem a missão de inspeccionar, que é um órgão inspectivo”, respondeu Vera Daves aos jornalistas.
Questionada no parlamento sobre a intervenção da UNITA, a governante referiu que o órgão que tutela só efectua pagamentos com o aval da IGAE.
“Só quando a IGAE nos envia o certificado a dizer que está tudo bem, nós pagamos. De modo que, em termos práticos, esta auditoria está a acontecer processo a processo, o Ministério das Finanças não paga nada sem a IGAE confirmar que a dívida está pronta para pagamento”, explicou.
Na sua declaração de voto contra o Orçamento Geral do Estado (OGE) 2023, a UNITA referiu que sem auditoria a dívida pública angolana se torna “odiosa”, considerando que a dívida pública é “uma das fontes de financiamento do défice orçamental”.
“Contudo, com um rácio da dívida pública/PIB [Produto Interno Bruto] estimado em 56,1% até Dezembro de 2022, embora esteja abaixo dos 60% do PIB, é preocupante o peso do serviço da dívida, 45% do total das despesas previstas para o presente exercício económico”, disse a deputada Albertina Ngolo, na declaração de voto do seu partido.
“E, infelizmente, de forma irresponsável o executivo continua a contrair novas dívidas, o que nos faz questionar sobre a sua sustentabilidade a médio e curto prazos”, acrescentou.
“E se considerarmos ainda a negação pelo executivo das solicitações de auditorias à dívida pública, nos termos da lei e da doutrina internacional, essa dívida pública torna-se odiosa, não pode merecer o nosso voto favorável”, afirmou a deputada da UNITA.
A deputada desafiou também as autoridades do MPLA a explicarem os destinos de 5 mil milhões de dólares (4,6 mil milhões de euros), montante que diz ser do diferencial do preço do petróleo relativo ao segundo semestre de 2022.
“Esperamos que em sede do relatório de balanço de execução do terceiro e quarto trimestres do OGE 2022, o executivo explique claramente aos angolanos o que fez com os cinco mil milhões de dólares do diferencial de petróleo, considerando o inicialmente previsto no mesmo exercício”, apontou a parlamentar.
Folha 8 com Lusa