A UNITA condenou hoje que o considera ser uma “onda de prisões arbitrárias” no país e apelou ao governo, sobretudo ao Presidente da República, João Lourenço, para que incentive o diálogo nacional. Não seria melhor fazer o mesmo apelo ao Presidente do MPLA (João Lourenço), ao Titular do Poder Executivo (João Lourenço) e ao Comandante-em-Chefe das Forças Armadas (João Lourenço)?
AS declarações foram feitas hoje pelo secretário-geral do principal partido da oposição que o MPLA ainda permite em Angola, Álvaro Chikuamanga Daniel, numa conferência de imprensa em que a UNITA apresentou a sua posição sobre o momento político que o país vive.
O responsável da UNITA lamentou a “prisão recorrente” de activistas (perigosos a ponto de ter sido preso até uma criança de sete meses) e sublinhou que se está perante uma violação do estado democrático de direito, defendendo um amplo diálogo social.
“Este país tem uma direcção, um governo, um Presidente. Aquele que devia incentivar o diálogo nacional devia ser o Presidente da República, devia ser o promotor destas conversações, mas infelizmente notamos um défice de dialogar com as forças vivas da Nação”, disse.
Entre as “prisões arbitrárias” a UNITA apontou os casos dos activistas detidos nos dias 10 e 11 de Janeiro na sequência da greve dos taxistas e, mais recentemente, a 9 de Abril na sequência da manifestação contra a contratação da Indra, empresa que há muito presta relevante apoio técnico e logístico para que o MPLA arrase os adversários e que volta a estar nestas eleições gerais previstas para Agosto de 2022, apelando à sua libertação.
Em causa estão também membros da UNITA, no município do Sanza Pombo, onde se registaram confrontos entre militantes desta força política e o partido do poder há 46 anos, o MPLA, tendo sido presas mulheres com crianças ao colo.
“São actos repugnantes, que constituem um expediente recorrente do regime autocrático no poder, para aterrorizar, condicionar, silenciar opositores e vozes críticas da sociedade”, segundo a UNITA.
O partido do “Galo Negro” considerou “alarmante” que 30 anos após institucionalização do multipartidarismo “o regime mantenha a mentalidade e a prática de partido único” e não respeite a vontade dos cidadãos criando barreiras “contra a sã convivência política, social e económica.
A UNITA condenou também “a postura musculada adoptada pelo Executivo para lidar com as greves no sector público”, recordando que greves e manifestações são direitos constitucionais. Isto, é claro, se Angola fosse o que ainda não é: Um Estado de Direito.
“A UNITA insta o executivo a dialogar de forma honesta com os trabalhadores do sistema de saúde, educação e ensino, com vista a solucionar as questões que estes sectores vitais vivem e assegurar serviços universais de qualidade aos cidadãos”, apela o partido.
A UNITA demarcou-se também de supostas milícias às quais tem sido associada em panfletos que circulam nas redes sociais, alguns dos quais com o símbolo da Polícia Nacional, e pediu às autoridades que investiguem a origem das imagens.
Segundo a UNITA, tem circulado “nas redes sociais, e em alguma imprensa”, imagens que insinuam a existência de milícias, supostamente financiadas pela UNITA, algumas das quais recorrendo aos símbolos da Polícia Nacional o que “torna o assunto mais grave”.
“Esses indícios, em ambiente pré-eleitoral, associados a actos e discursos que incitam à intolerância e à violência, representam a reedição da estratégia de manipulação, característica do regime, com o propósito de desviar a atenção da opinião pública nacional e internacional, dos reais problemas dos cidadãos”, acusa o partido, rejeitando qualquer associação da sua imagem a quaisquer actores que pretendam perturbar a estabilidade política e social do país” e pede uma investigação “aos promotores destas acções caluniosas e difamatórias”.
Instado pelos jornalistas a apresentar esses panfletos, o secretário-geral da UNITA exibiu um panfleto onde é visível um grupo de homens armados, com a legenda “altamente perigosos financiados pela UNITA”, bem como um símbolo da Polícia Nacional (PN)
“Se isto é da autoria da PN porque é que não aborda a direcção da UNITA para se defender contra esta informação? Por que não investiga estes assuntos para aparecer com dados irrefutáveis?” – questionou.
Por outro lado, continuou, “se a PN se demarca disto por que permite que isto circula nas redes sociais”, disse, pedindo um esclarecimento das autoridades sobre estas questões que “interessa ao partido e a comunidade nacional e internacional.
O político considerou este tipo de difamação bastante perigoso numa fase como esta (período pré-eleitoral em Angola), tendo em conta “o histórico, aquilo que aconteceu no passado)
“Temos de evitar que o nosso país volte a situações de conflito por irresponsabilidade de alguns. Isto é muito grave para a estabilidade social e política”, realçou, acrescentando que já foi endereçada uma carta à PN.
Na declaração do secretariado executivo do comité permanente, a UNITA refere que o contexto de competição eleitoral “exige um ambiente de abertura, isenção e respeito pela diferença, da parte das instituições públicas e privadas” e afiram o seu compromisso com a paz e os valores da democracia.
“É desprestigiante para Angola e ultrajante para o seu povo, a repetição de ciclos de violência política, em anos eleitorais, que apenas acomodam a agenda da manutenção do poder político e não o interesse nacional”, lamenta o partido.
TER MEMÓRIA DÁ RAZÃO À FORÇA DA… RAZÃO
“Media silenciados e opositores reprimidos” é o título de um Artigo de Louise Redver, da IPS, publicado no Esquerda.net no dia 16 de Março de 2012, e que agora reproduzimos “ipsis verbis”:
«Activistas pelos direitos humanos alertam para a deterioração do clima político em Angola, após o raide policial ao jornal “Folha 8” e os ataques contra manifestantes da oposição no fim de semana passado.
No dia 12, dois computadores foram apreendidos nos escritórios da Folha 8, uma das poucas publicações privadas críticas do governo. A polícia tinha ordem para investigar “crimes de ultraje contra o Estado”. O fechamento do jornal e o interrogatório de seu editor, William Tonet, que também teve confiscada a bateria do seu telemóvel, aconteceram 48 horas depois que jovens angolanos tentaram realizar manifestações em Luanda e na cidade costeira de Benguela.
As marchas foram convocadas para protestar contra as irregularidades no processo eleitoral, entre elas a nomeação de um membro do partido do governo para dirigir a Comissão Nacional de Eleições. Apenas umas dezenas de pessoas se reuniram em cada cidade, mesmo assim não foi permitido que nenhum protesto completasse o caminho previsto. Em Benguela, polícias fortemente armados dispersaram os manifestantes e fizeram várias prisões. Em Luanda, onde nos dias anteriores houve relatos de rusgas em domicílios e ameaças aos organizadores, grupos armados não identificados realizaram ataques de rua contra os activistas, com saldo de várias pessoas seriamente feridas.
“Estamos especialmente preocupados com o que ocorre em Angola, porque este é um ano eleitoral, no qual as pessoas devem ter direito de se expressar livremente”, afirmou Lisa Rimli, da Human Rights Watch. “As pessoas não podem realizar manifestações públicas, o que é seu direito segundo a Constituição, e o facto de os jornais privados serem atacados também é muito preocupante”, acrescentou esta pesquisadora para Angola da HRW, organização humanitária com sede central em Nova York. Rimli disse estar especialmente alarmada pelo tipo de violência cometida contra os manifestantes. “Os atacantes estavam armados e batiam nas cabeças das pessoas. Foi muita sorte ninguém morrer”, acrescentou.
A Polícia Nacional angolana responsabilizou pela violência grupos armados rivais e “vândalos”, e um porta-voz prometeu completa investigação dos fatos. Em Luanda começou a circular um panfleto de um suposto grupo juvenil assumindo os ataques e dizendo que seu objectivo era fazer “respeitar as eleições” e preservar a paz. Porém, Luaty Beirão, um popular rapper angolano que organizou a marcha em Luanda, e que foi atingido na cabeça, declarou que ele e seus amigos foram atacados, na verdade, por membros mascarados de uma força bem treinada.
“Logo que chegamos ao local do encontro pudemos ver um grupo de pessoas batendo ao acaso, e vieram até nós nos provocando para lutar”, contou Beirão à IPS. “Como nos negamos, mudaram o tom e disseram que se fôssemos embora e cancelássemos a manifestação nos deixariam em paz. Também nos negamos e, então, vieram para cima da gente. Só lembro de ter recebido um golpe na cabeça e cair no chão, e depois ouvir vários disparos para o ar”, acrescentou.
Beirão, de 30 anos, que recebeu vários pontos na cabeça, disse que “a polícia não estava em parte alguma, e pela forma como fomos cercados era possível ver que sabiam o que faziam, não eram arruaceiros comuns”. A poucos quilómetros de distância, o secretário-geral do pequeno partido de oposição Bloco Democrático, Filomeno Vieira Lopes, que se dirigia ao local do protesto, também foi atacado e levado a um hospital com ferimentos na cabeça e no braço.
“Considerando que 2012 é um ano eleitoral, estes acontecimentos são realmente preocupantes”, disse Sizaltina Cutaia, do escritório angolano da Iniciativa por uma Sociedade Aberta para a África Austral. “Nos revelam a situação em que está a participação política em Angola, onde a liberdade de reunião e manifestação é sistematicamente negada aos cidadãos. Trata-se de uma verdadeira ameaça à democracia”, afirmou.
Até agora, os protestos políticos eram raros em Angola. Poucos se atreviam a criticar as autoridades por medo de perder seus empregos ou a pouca estabilidade conseguida desde que, em 2002, terminou a guerra civil que durou três décadas. Entretanto, desde Março do ano passado movimentos de jovens começaram a sair às ruas exigindo uma distribuição equitativa dos dividendos da paz neste país rico em petróleo, e em resposta à debilidade da oposição no parlamento.
Além de se queixarem da desigualdade e da má qualidade dos serviços públicos, os jovens pedem a renúncia do presidente José Eduardo dos Santos, no poder há 32 anos e que comanda o Movimento Popular para a Libertação de Angola (MPLA), que governa o país desde sua independência, em 1975. “Para nós, o grande problema é Santos. Tem que ir embora”, disse Beirão. “Queremos que renuncie. Trinta e dois anos é muito tempo para um homem governar um país. A juventude está farta do que ocorre aqui. As pessoas podem fingir que está tudo bem, mas não está. Nosso país não é governado de forma adequada, não há investimento em saúde nem em educação, e muitas pessoas estão sofrendo”, destacou.
Angola é uma das economias de crescimento mais rápido na África. A previsão é que seu produto interno bruto cresça 12% este ano. Metade da população, no entanto, permanece na pobreza e sem acesso a água potável, e o país tem uma das taxas de mortalidade infantil mais altas do mundo: uma em cada cinco crianças morre antes de completar cinco anos. “As pessoas sabem que as coisas não estão bem, mas têm muito medo de perderem empregos e famílias”, explicou Beirão, cujo pai foi membro do MPLA. “Para mim, os que se mantêm em silêncio simplesmente são cúmplices das injustiças que acontecem aqui”, ressaltou.»
Folha 8 com Lusa
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