Dirigentes religiosos e de organizações não-governamentais da sociedade civil angolana pediram ao MPLA que realize, de facto, as promessas eleitorais repetidas durante as campanhas eleitorais e, mesmo antes, desde 11 de Novembro de 1975.
Durante um encontro de apresentação do programa de governo de quem é governo há 47 anos, o MPLA, vários dirigentes criticaram algumas das propostas mas, mais do que isso, a não concretização de promessas feitas há cinco anos, quando João Lourenço chegou ao Poder, por ordem expressa e pessoal de José Eduardo dos Santos, que acabou por ser apunhalado pelas costas pelo próprio João Lourenço.
“Precisamos de ver coisas concretas feitas”, resumiu o padre Celestino Palanca, da Comissão Nacional de Justiça e Paz, criticando que o (suposto) combate à corrupção se tenha reduzido ao esforço na recuperação de activos em vez de “mudanças estruturais” na sociedade.
As questões ambientais são – dizem os próprios – preocupação da Igreja Católica, que aponta o desmatamento exacerbado e a seca como problemas estruturais aos quais o executivo não tem dado resposta. “É como se estivéssemos a falar com outro governo”, desabafou Celestino Palanca.
António Mussaqui, secretário-geral da Aliança Evangélica de Angola, seguiu a mesma argumentação e questionou o MPLA sobre a concretização das promessas, caso vença as eleições de quarta-feira. Pois é. Quem não conseguiu cumprir durante 47 anos de governo, 20 dos quais em paz total, alguma vez cumprirá seja o que for?
“O que é que nos garante que algumas questões que são problemas mandato após mandato se vão resolver?” — perguntou à conselheira presidencial Fátima Viegas, que esteve em parte da cerimónia. Nada garante, como nunca garantiu. Mas o importante é prometer, na esperança de que os angolanos – com a ajuda das igrejas – continuem a votar com a barriga… vazia e a troco de um saco de arroz.
Poucos apoios para deficientes e idosos, falta de desenvolvimento do interior, o pouco acesso a infra-estruturas básicas de água e saúde bem como problemas na educação básica e no ensino superior foram alguns dos problemas elencados pelos dirigentes presentes.
Perante estas observações, Fátima Viegas respondeu que “será feita uma súmula e as questões serão levadas acima, a quem de direito”. Ou seja, embora prometendo tudo e mais alguma coisa, os angolanos vão continuar a aprender a morrer sem ir ao hospital e a viver sem… comer.
Na sua intervenção, a dirigente disse que o MPLA é hoje um “partido mais aberto à sociedade” e este tipo de encontros visa “melhorar as propostas” do comité central. Ou seja, até ao advento de João Lourenço o MPLA era criminosamente incompetente às segundas, quartas e sextas, e às terças, quintas e sábados era incompetente criminosamente. Com o novo “querido chefe”, passou a ser tudo isso também aos domingos…
Na apresentação de hora e meia das propostas do governo, por três dirigentes do MPLA e elementos de gabinetes governamentais, foi repetido por todos que o objectivo é manter uma continuidade relativa ao primeiro mandado de João Lourenço, admitindo vários problemas estruturais, mas sem nunca fazer referência a executivos anteriores do MPLA, que governa Angola desde 1975.
A cerimónia foi iniciada por uma oração de um sacerdote que agradeceu a iniciativa do MPLA: “Que o senhor Deus abençoe o novo governo” e “abençoe o Presidente da República e todo o elenco do executivo para que possamos todos promover a paz e a concórdia”, disse na cerimónia, a cinco dias das eleições, o pastor Matias Teixeira Vinte, da Igreja Adventista, sem revelar o seu número de militante do MPLA.
SEIS POR MEIA DÚZIA, MAIS DO MESMO
O líder do MPLA, João Lourenço, também Presidente da República, Titular do Poder Executivo e Comandante-em-Chefe das Forças Armadas, aposta no que chama de “obra feita” para preservar o poder do partido que governa o país desde 1975 e mostrar que ainda tem o povo (20 milhões têm a barriga vazia) ao seu lado.
João Lourenço, que se recandidata a um segundo mandato como Presidente da República, substituiu nas listas do MPLA o seu número 2, trocando o actual vice-presidente Bornito de Sousa pela pouco conhecida, Esperança… da Costa.
Já o programa, que tem como lema “A força do povo” traz poucas novidades centrando-se em propostas generalistas e na repetição das promessas que o MPLA faz há 47 anos. Ou seja, é mais do mesmo ou, com a ajuda de especialistas pagos a peso de ouro com o dinheiro do Povo, a troca de seis por meia dúzia.
O documento faz referência às principais realizações da acção governativa no período entre 2017 e 2022 e está estruturado em torno de sete eixos estratégicos, através dos quais o MPLA diz pretender implementar as suas políticas: Consolidar a paz (que já tem 20 anos) e o Estado Democrático de Direito (que continua a ser uma miragem); Promover o desenvolvimento equilibrado e harmonioso do território (o país continua sem realizar as que seriam as primeiras eleições autárquicas); Promover o desenvolvimento do capital humano (que continua a valorizar os néscio do partido e a ostracizar os génios que o não sejam); Reduzir as desigualdades sociais (que há 47 anos continuam a manter a sociedade dividida entre angolanos de primeira e de segunda), erradicando a fome – que João Lourenço diz ser “relativa” – e a pobreza extrema (20 milhões de pobres); Preservar o meio ambiente; Assegurar a estabilidade macroeconómica; Assegurar a defesa da soberania e da integridade territorial.
O MPLA compromete-se em matéria de promessas a implementar as autarquias locais, sem avançar com datas, implementar uma nova Divisão Político-Administrativa, para aproximar os cidadãos aos centros de decisão política e “trabalhar na busca de um modelo de gestão territorial, capaz de salvaguardar uma maior autonomia administrativa e económica para a Província de Cabinda”.
Sem quantificar a criação de empregos (em 2017 prometeu a criação de 500 mil empregos), o MPLA propõe reduzir, pelo menos para 25%, a taxa de desemprego face aos atuais 30% e aumentar o número de centros de formação profissional, bem como lançar um programa de estágios profissionais e criar uma plataforma para ofertas de emprego.
No domínio da protecção social, o MPLA propõe-se estudar a possibilidade de juntar numa única entidade os três níveis de protecção social, “evitando a dispersão de recursos”, reforçar os mecanismos de protecção social, bem como a protecção dos direitos dos grupos vulneráveis (crianças, pessoas com deficiência e idosos), reorientar a assistência social para quebrar os ciclos de pobreza e definir os serviços básicos que o Estado deve prestar e “reduzir, ao máximo, a taxa da população que vive abaixo do limiar de pobreza”, sem estabelecer metas.
Em termos económicos compromete-se a reduzir para, até 60%, o rácio de dívida em percentagem do Produto Interno Bruto, assegurar um crescimento real médio anual de, pelo menos, 3,5% para o PIB global, e 4,6% para o PIB não petrolífero e aumentar as receitas fiscais não petrolíferas, por via do alargamento da base tributária.
Aumentar a taxa de electrificação para 50%, priorizando as zonas industriais e agrícolas; aumentar de 56% para 70%, a população com acesso a serviços básicos de água potável e aumentar de 50%para 60%, a população com acesso ao saneamento básico, são outras linhas orientadoras do programa de governo para cinco anos.
O MPLA propõe-se ainda “reforçar os mecanismos, os recursos e as alterações culturais necessárias para controlar a corrupção e fortalecer a imagem e o posicionamento de Angola e do Estado angolano no mundo” e fortalecer a sociedade civil e as suas organizações através do acesso à informação, à participação na formulação, execução, acompanhamento e avaliação das políticas públicas.
Na área da justiça, promete dinamizar as acções de registo civil, em particular à nascença; prevenir e reduzir os níveis de criminalidade e de corrupção e aprovar legislação que facilite o ambiente de negócios, em especial a titularização da propriedade sobre o usufruto da terra e dos bens imóveis para facilitar o acesso ao crédito.
No campo da comunicação social, o MPLA pretende constituir a figura de Provedor da Comunicação Social e reforçar o papel da Entidade Reguladora da Comunicação Social, o que pressupõe que – se vencer – a TPA, a RNA, o Jornal de Angola e outros apêndices continuaram a ter toda a liberdade para serem criados de luxo do MPLA.
Ou seja, João Lourenço continua a apostar tudo na tese de que o MPLA é Angola e que Angola é DO MPLA. É por isso que o único herói nacional é Agostinho Neto, o assassino responsável pelo massacre de milhares e milhares de angolanos em 27 de Maio de 1977. Provavelmente, se o MPLA vencer, para além de já ter o seu nome dado ao Aeroporto de Luanda, o genocida poderá “assistir” à mudança de nome do país para “República Agostinho Neto”.
Enquanto isso, continuamos a ver João Lourenço dizer que vai festejar a vitória com uma cabidela de galo negro, e o seu ministro de Estado e Chefe da Casa Militar, general Francisco Furtado, a dizer que quem criticar o MPLA “vai levar no focinho”…
Folha 8 com Lusa