O Sindicato Nacional de Professores (SINPROF) angolanos disse hoje, em Luanda, que vai submeter à Organização Internacional do Trabalho (OIT) provas das ameaças de que estão a ser alvo os docentes que aderiram à greve. Mas alguém acredita que um governo do MPLA, que há 47 anos é um paradigma do respeito pelas mais puras e sublimes regras da democracia, seria capaz disso?
Guilherme Silva, presidente do SINPROF, diz que “neste momento vive-se um terror psicológico de Cabinda ao Cunene, do Luau ao Lobito, no seio dos professores. Enviam SMS, telefonemas, avisos, convocatórias, enfim, nós estamos a juntar todas as provas e estamos a denunciar também junto de instituições internacionais, entre as quais a OIT, onde Angola tem assento, que Angola está a violar a Convenção 87, do livre exercício e da liberdade sindical”.
Em conferência de imprensa, onde anunciou a suspensão da greve iniciada na quarta-feira passada, Silva referiu que os professores estão a ser ameaçados com faltas e que a entidade patronal está a fazer mapas, levantamentos, a chamar pessoas, o que considerou ser “uma forma psicológica para que os professores regressem à escola à força”.
“É o que estão a fazer no sentido de sermos subjugados, como se fossemos escravos e os professores já entenderam. Neste momento, a couraça do medo se foi, temos a coragem e, acima de tudo e sobretudo, a Constituição da República e a lei a nosso favor”, frisou. É claro, presume-se, que também os professores sabem que acima da Lei e da Constituição está o interesse dessa outra organização supranacional e de carácter (quase) divino que dá pelo nome de MPLA.
Guilherme Silva acusou o Ministério da Educação de estar “a violar sistematicamente a lei”, através dos gabinetes provinciais e direcções municipais da educação, “sufocando os professores com documentos, com processos, com SMS”.
“E temos essas provas todas, estamos a juntar todas as provas e no devido momento nos posicionaremos”, indicou. É caso para perguntar se, por acaso, essas provas (como aconteceu com as actas-síntese) não estão nas mãos do clã manico(mial) ou do tribunal (in)constitucional…
Um documento do Ministério da Educação dirigido ao governador da província do Cuanza Sul e partilhado nas redes sociais solicitava aos directores e secretários provinciais da Educação que controlassem os funcionários, com base no artigo 4 da Lei da Greve, e procedessem ao desconto salarial correspondente aos dias de paralisação de aulas aos que aderiram à greve.
Na perspectiva do Ministério da Educação, a declaração de greve decretada pelo SINPROF rompe o memorando de entendimento assinado entre as partes a vigorar até Janeiro de 2023 e ignora os esforços e a abertura ao diálogo na resolução das questões reivindicadas, algumas das quais em tratamento por outros departamentos ministeriais, como poderá ser o caso da Polícia Nacional e do SIC…
O caderno reivindicativo, inicialmente com 10 pontos que sintetizam os principais problemas do sector, foi submetido pelo SINPROF ao Ministério da Educação, em Outubro de 2019, tendo em Março deste ano sido adicionados outros quatro pontos.
De acordo com o presidente do SINPROF, durante os cinco dias de greve não houve qualquer encontro, tendo recebido na terça-feira o convite do Ministério da Educação para um encontro de concertação na quinta-feira.
O sindicalista apelou ao Executivo, através do Ministério da Educação que apresente soluções concretas para os pontos reivindicados por forma a se encontrar uma saída.
“A greve tem um culpado, o culpado é o executivo, porque isso não é de hoje. Compete ao executivo através do Ministério da Educação solucionar as questões dos professores, porque o que estamos a defender é a dignidade dos professores, as condições de trabalho, haver merenda escolar para as nossas crianças, fundamentalmente no ensino primário, que vão à escola sem comer nada e ficam todo dia, até sem sequer beber água”, disse.
Guilherme Silva informou que a segunda fase da greve poderá iniciar-se em 6 de Dezembro caso até lá não haja respostas positivas da parte da entidade patronal.
VOTO DE CONFIANÇA DOS PROFESSORES OU DA CNE?
No passado dia 22, a ministra da Educação, Luísa Grilo, pediu “ponderação e voto de confiança” aos professores do ensino geral, quando estes anunciaram a greve, garantindo que o executivo estava a trabalhar para solucionar as suas reivindicações. Há 47 anos que o MPLA promete “resolver os problemas do Povo”. O resultado está à vista. Só acredita quem quer.
O “executivo está a trabalhar no sentido de responder às preocupações apresentadas, algumas delas já foram solucionadas, outras estão em via de solução, e então apelava aos meus colegas a alguma ponderação, um voto de confiança, porque estamos a trabalhar para dar solução às suas reivindicações”, afirmou a ministra.
Luísa Grilo, que falava na província do Zaire, onde presidiu ao acto do Dia Nacional do Educador, referiu que o órgão que dirige ainda não recebera por escrito informações relativas à greve nacional dos professores.
“Ouvimos efectivamente, mas continuamos a conversar com os nossos parceiros do sindicato, ainda na sexta-feira (18 de Novembro) reunimos com o sindicato para encontrarmos mecanismos de diálogo permanente, por um lado, e por outro encontrarmos as soluções que sirvam as duas partes, mas nós dissemos que estamos abertos a dialogar”, assinalou a governante.
Aumento salarial, melhoria das condições de trabalho, pagamento de subsídios e a regulamentação da monodocência constam entre as reivindicações dos professores angolanos, cujo caderno reivindicativo vem sendo negociado há três anos.
“Poucas questões foram atendidas e mesmo as atendidas não foram na sua plenitude, de tal forma que os professores agastados sinalizaram para partirmos para esta medida de pressão”, argumentou.
Admar Jinguma, secretário-geral do SINPROF acrescentou: “Sempre fomos abertos ao diálogo e sempre que somos chamados não apresentamos qualquer formalismo, agora é importante dizer que estas conversações no final não têm surtido efeito”.
Recorde-se que no dia 30 de Março de… 2017, o SINPROF classificou como intimidação aos docentes uma circular distribuída pelo Ministério da Educação, em que se alertava para as consequências da adesão à greve geral, entre 5 e 7 de Abril.
Em declarações à Lusa, o secretário provincial de Luanda do SINPROF, Fernando Laureano, confirmou que o sindicato recebeu “com espanto” esta posição, falando numa “conduta de intimidação aos professores em todo o país”.
Em comunicado, o Sindicato lamentava que “ao invés de pautar por uma conduta patriótica, no sentido de resolver por via do diálogo, os diferendos reclamados pela classe docente”, o Ministério da Educação “optou por uma conduta de intimidação aos professores em todo o país, por intermédio dos directores provinciais, municipais e de escolas, contrariando assim os alicerces que norteiam um Estado democrático e de direito”.
“Por este e outros factos, o SINPROF condena veementemente a atitude recorrente optada pelo Ministério da Educação, em pretender desinformar, usando argumentos infundados, na vã tentativa de enganar a classe docente, dizendo que o caderno reivindicativo está totalmente resolvido”, lê-se no comunicado.
Segundo Fernando Laureano, uma circular vinda do Ministério da Educação, do departamento do Ensino Geral, recomenda a todos os directores provinciais, municipais e directores de escolas, para tentarem demover os professores para não aderirem à greve, devendo quem a realizar “arcar com as consequências”.
“Essa circular é assinada pela senhora Juliana Rocha, que é uma das chefes do departamento do Ensino Geral, nós temos o documento”, disse o sindicalista.
Fernando Laureano frisou que o documento já foi encaminhado para a Organização Internacional do Trabalho (OIT), salientando ainda que o presidente do Sindicato, Guilherme Silva, tem estado em contacto com o ministro para o alertar das ameaças.
O sindicalista sublinhou que essa intimidação se faz sentir mais nas províncias, apesar de estar a circular igualmente o documento do ministério em Luanda, onde a maioria dos professores já estão sensibilizados para aderirem à greve.
No comunicado, o SINPROF “encoraja e apela a toda a classe docente no país, a manter-se vigilante e unida, não se deixando intimidar sobre quaisquer tipos de ameaças ou coacções e reitera o seu compromisso da defesa dos interesses e direitos dos professores”.
O sindicato ameaça ainda recorrer oportunamente aos órgãos de justiça para apresentar participação criminal de todos aqueles que nos diversos níveis entrarem em conflito com vários artigos da Lei da Greve.
Folha 8 com Lusa