IMPORTANTE É O BIM (BILHETE DE IDENTIDADE DO MPLA)

Angola já registou mais de cinco milhões de cidadãos e atribuiu, pela primeira vez, bilhetes de identidade a 2,6 milhões de angolanos, nos últimos dois anos, anunciou hoje o ministro da Justiça e dos Direitos Humanos. É obra. Quando a atribuição de bilhetes de identidade é motivo de euforia no Governo do MPLA, que está no Poder há 46 anos, está tudo dito.

O ministro Francisco Queiroz revelou os dados durante a reunião de balanço do Programa de Massificação do Registo de Nascimento e Atribuição do Bilhete de Identidade e do Programa de Massificação do Registo Predial, no período entre Agosto e Dezembro de 2021.

No período em análise, foram efectuados um total de 1.234.124 de registos de nascimento e atribuídos, pela primeira vez, 644.494 bilhetes de identidade. Nem no tempo colonial se via tal coisa. Mas nesta re(i)pública tudo é possível.

“Assim, desde o início do programa, em Novembro de 2019 até ao mês de Dezembro de 2021, foram registados 5.075.139 cidadãos e identificados, pela primeira vez, 2.635.203 angolanos”, informou o ministro.

O governante do MPLA salientou que, seguindo os dados estatísticos do início do programa, ainda faltam registar 4.040.945 cidadãos e identificar, pela primeira vez, 3.369.188 angolanos. É claro que grande parte destes escravos têm, desde sempre, algo que é muito mais importante do que o Bilhete de Identidade – o cartão de filiado no MPLA.

“Todavia, estes dados de partida têm-se mostrado pouco fiáveis, pois, na prática, há já três ou quatro províncias que atingiram quase 200% de pessoas com bilhetes de identidade”, disse. Pois. Por alguma razão, nos anteriores simulacros eleitorais, muitas secções de voto registaram mais votos no MPLA do que eleitores inscritos. É mesmo o MPLA no seu melhor.

Segundo o ministro, Luanda é a província que maior número de entrega de bilhetes de identidade regista, sendo que o grande número de habitantes “por vezes faz crer que há atraso de emissão e entrega [dos documentos]”.

“Apesar de existirem constrangimentos, tais como as medidas impostas por força da evolução da pandemia da Covid-19, a falta e atrasos no pagamento de subsídio aos brigadistas, os furtos de equipamentos, que se acentuaram nos últimos tempos, e outros, podemos verificar que, de uma forma geral, grande parte da execução do programa deu-se até ao ano de 2021”, destacou Francisco Queiroz.

Durante 2021, foram realizadas visitas de campo a diversas brigadas e postos de quase todas as províncias do país, com excepção de Cabinda, que permitiram constatar o nível de produtividade e as dificuldades vividas pelas equipas do programa, bem como indicar os caminhos para superá-los.

O ano de 2021, prosseguiu o ministro Francisco Queiroz, foi também o ano de maior implementação do programa na diáspora, com várias equipas a deslocarem-se a 16 países, onde montaram 28 postos de identificação dos potenciais angolanos de primeira, faltando a Itália e Espanha, prevendo-se a extensão de mais postos na América do Sul e em África.

“O tempo que nos resta para levar a efeito o programa é de oito meses, devemos redobrar os esforços, no sentido de obtermos números cada vez mais próximos das metas preconizadas, isto de forma a alcançarmos os resultados programados para Setembro de 2022”, disse.

No âmbito do Programa de Massificação do Registo Predial, atingiu-se o número de 84.273 actos de registo predial em todo o território nacional, desde Março de 2021, data do início do programa, até Dezembro do mesmo ano, disse o ministro.

A orgia de gozar com o Povo

Estávamos em Setembro de… 2014. Uma comissão envolvendo onze ministérios iria estudar formas de “massificar” o acesso da população ao registo de nascimento e à emissão do Bilhete de Identidade, segundo um decreto presidencial.

À cabeça deste organismo estaria o então ministro da Justiça e dos Direitos Humanos, Rui Mangueira que, em 2013, tinha anunciado uma campanha de três anos, para promover o registo civil gratuito da população, tendo como meta atingir oito milhões de cidadãos angolanos.

A criação desta comissão interministerial, referia o decreto presidencial, que entrou em vigor de no dia 5 de Setembro de… 2014, visava nomeadamente “fazer face ao actual problema de acesso ao registo de nascimento, identificar os constrangimentos e melhorar o sistema de registo de nascimento”.

A falta de informação sobre o registo civil, as dificuldades logísticas, de pessoal e as grandes distâncias que a população tem de percorrer para aceder a estes serviços eram (são) factores de constrangimento relatados publicamente.

A análise das condições de funcionamento dos órgãos responsáveis pelo registo de nascimento e pela emissão do BI, “avaliando as suas estruturas, o quadro de pessoal, a capacidade de deslocação, os equipamentos e os sistemas de informação e de fiscalização”, serão competências da Comissão Interministerial, que estaria em funções até Setembro de 2017.

“Criar condições para melhorar o sistema actual de registo de nascimento e de emissão do Bilhete de Identidade, através da sua expansão a todo o território nacional e da sua implementação nas unidades de saúde”, lê-se ainda nesse decreto.

Para além do Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos, a comissão envolveu ainda os ministérios da Defesa, Interior, Finanças, Administração do Território, Planeamento e Desenvolvimento Territorial, Assistência e Reinserção Social, Saúde, Telecomunicações e Tecnologias de Informação, Comunicação Social e Relações Exteriores e teria de apresentar resultados trimestralmente ao então Presidente José Eduardo os Santos.

Ao contrário da emissão do cartão de militante do MPLA, que do ponto de vista da funcionalidade prática do quotidiano vale mais do que o BI, já que este nos coloca todos em pé de igualdade e o primeiro separa os angolanos de primeira dos outros, não é fácil obter o Bilhete de Identidade.

Mas o BI é mais uma extensão do cartão do partido do que qualquer outra coisa. Essa estratégia de culto ao chefe que levava o país a ter no Bilhete de Identidade de Cidadão Nacional, as efígies de Agostinho Neto e José Eduardo dos Santos, por sinal, dois presidentes do MPLA, que foram – reconheçamos – competentemente incompetentes na criação de símbolos verdadeiramente nacionais, mostrava a incomensurável distância a que estamos de um verdadeiro Estado de Direito.

A inclusão de uma imagem dos dois dirigentes do MPLA nos Bilhetes de Identidade violava os princípios da democracia, mas como esta foi – no dizer de Eduardo dos Santos – imposta, nem tem validade para quem, por vontade própria, excluiria a efígie do primeiro presidente, tão certo está da sua eternidade que, contudo, João Lourenço fez caducar.

Para mascarar as “fotos máscaras” na banda óptica do Bilhete de Identidade, foi então dado um ar de legalidade através da Lei nº 4/09, feita à medida e por medida, sobre o regime jurídico da identificação civil e da emissão do Bilhete de Identidade do cidadão nacional.

Segundo a sui generis explicação daquele que foi Director Nacional do Arquivo de Identificação Civil e Criminal, Irondino Pinheiro Muxiri, a legalidade resulta da alínea j) do nº2 do artigo 8º, da mesma Lei, onde consta que existirá no BI foto máscaras na banda óptica com representações gráficas de segurança.

Ora, na mais reaccionária e fraccionista prova do autocrático regime que por cá impera, o Ministério da Justiça, como entidade proponente, escolheu, à semelhança do que acontece nas notas do Kwanza, as fotografias do fundador da Nação, Agostinho Neto, e do Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, que então serviram de referência.

Na ânsia de mostrar a justeza, mas sobretudo a legalidade da decisão anacrónica que foi motivo de chacota nos países civilizados, referiu-se que o projecto-lei foi aprovado em Conselho de Ministros e motivo de ovação (consta que até foi ouvida na África do Sul) por parte dos deputados na Assembleia Nacional (do MPLA).

Assim, se o Governo do MPLA e os deputados do MPLA aprovaram a existência das foto máscaras dos dois presidentes do… MPLA, se o MPLA entendeu que Angola é do MPLA, o regime não vê razões para alterar a situação.

Na altura, o Ministério da Justiça justificou que o nosso BI poderá no futuro transformar-se numa galeria de imagens (certamente estariam à época na linha de partido Isabel dos Santos bem como todos os elementos do clã presidencial), à semelhança do que acontece com o “green card”, nos EUA, onde constavam as fotos dos anteriores presidentes e, na altura, de Barack Obama.

Não dizem, contudo, que o “green card” (literalmente “cartão verde”), oficialmente United States Permanent Resident Card (“Carta de Residência Permanente nos Estados Unidos”) é um visto permanente de imigração concedido pelas autoridades daquele país e não um Bilhete de Identidade nacional.

Folha 8 com Lusa

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