TPA e TV Zimbo fazem informação, não jornalismo

O Grupo Parlamentar da UNITA quer ouvir o ministro das Telecomunicações, Tecnologias de Informação e Comunicação Social e os responsáveis dos canais televisivos TPA e TV Zimbo, devido à (não) cobertura noticiosa dada por estes meios relativamente aos incidentes de Cafunfo. O pedido de audição foi entregue no gabinete do Presidente da Assembleia Nacional que, depois de receber “ordens superiores”, dirá de sua justiça.

Em causa está a garantia constitucional (irrelevante no contexto em que o MPLA é Angola e Angola é do MPLA) relativa à igualdade de tratamento pela imprensa (do MPLA) do trabalho da oposição democrática, que a UNITA entende ter sido violada pela Televisão Pública do MPLA (eufemisticamente dita de Angola – TPA) e a TV Zimbo (idem), um canal do grupo Medianova, que pertencia aos generais “Dino” e “Kopelipa” e ao ex-vice-presidente Manuel Vicente e que passou para as mãos do Estado do MPLA (versão João Lourenço) em Julho de 2020.

“Entre outros factos, omitiram a posição da UNITA sobre o massacre de Cafunfo apresentada em comunicação do presidente Adalberto da Costa Júnior e em conferências de imprensa do grupo parlamentar, além da visita dos deputados à vila mineira de Cafunfo, onde estiveram retidos por três dias sem uma referência nos órgãos em causa”, critica o grupo parlamentar.

Outro facto apontado é o tratamento dos comunicados dos órgãos de cúpula dos dois partidos sobre o massacre de Cafunfo, tendo a TPA e a TV Zimbo lido na íntegra o do Bureau Político do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA, no poder há 45 anos e dono destas duas correias de propaganda e transmissão) e omitido o do Comité Permanente da UNITA, principal partido da oposição que o MPLA ainda permite (não se sabe por quanto tempo) em Angola.

A vila mineira de Cafunfo foi palco de incidentes (massacres, mais exactamente) entre a polícia e angolanos de segunda categoria no passado dia 30 de Janeiro, de que resultaram um número indeterminado de mortos e feridos, estando sob um forte dispositivo das forças de segurança desde essa altura.

Nesse dia, segundo a polícia do MPLA, cerca de 300 pessoas ligadas ao Movimento do Protectorado Português Lunda Tchokwe (MPPLT), que há anos defende a autonomia daquela região, tentaram invadir uma esquadra policial, munidos de sofisticado material bélico que, como se verificou, era do tipo canhangulo (espingarda antiga ou de fabrico artesanal, de um só cano comprido e estreito, que se carrega pela boca), obrigando as forças de ordem a defender-se, provocando seis mortes.

A versão policial é contrariada pelos dirigentes do MPPLT, partidos políticos na oposição, Igreja Católica, organizações internacionais e sociedade civil local, que alegam ter sido uma tentativa de manifestação, previamente comunicada às autoridades, e que os manifestantes estavam desarmados.

Na passada terça-feira, deputados da UNITA, da CASA-CE e do PRS, anunciaram que os incidentes de Cafunfo resultaram em 23 mortos, 21 feridos e 10 pessoas desaparecidas, afirmando que as forças policiais “dispararam indiscriminadamente contra os cidadãos”.

Na quarta-feira, a UNITA reviu estes números, ao divulgar um relatório dos cinco deputados que se deslocaram a Cafunfo, mas foram impedidos de entrar, referindo que pelo menos 28 pessoas morreram de forma “bárbara, hedionda e fria” e 18 ficaram feridas.

O Grupo Parlamentar da UNITA pede que as entidades em causa — o ministro, Manuel Homem, e os gestores da TPA e TV Zimbo sejam ouvidos pelas 6ª e 10ª comissões de trabalho especializadas da Assembleia Nacional, que tratam de matérias ligadas à Comunicação Social e aos Direitos Humanos.

“Macacos” do MPLA estão em todos os galhos

Para os efeitos achados necessários, informamos todas as sucursais do MPLA, nomeadamente a ERCA e o Departamento de Informação e Propaganda do MPLA, que a expressão “cada macaco no seu galho” significa que “cada indivíduo deve ocupar o lugar profissional, social, etc. que lhe compete, preocupando-se apenas com aquilo que lhe diz respeito”.

Subscrevendo a tese de que “produzir informação não é fazer jornalismo”, tomamos a liberdade de republicar o texto seguinte

“A liberdade de expressão exige um nível de responsabilidade acrescido e uma maior literacia mediática, que possibilite a cada cidadão distinguir o tipo de informação que consome. Produzir informação não é fazer jornalismo e, por si só, não faz do produtor de informação um jornalista”, afirma o Sindicato dos Jornalistas (SJ) de Portugal.

Segundo o SJ, “neste contexto, a Comissão da Carteira Profissional de Jornalista e o Sindicato dos Jornalistas alertam para a proliferação de meios e formas de comunicação no meio digital que se apresentam como sendo órgãos jornalísticos não o sendo e que transmitem informação não verificada, sem fundamento científico e/ou sem qualquer independência face a interesses nunca revelados, porque nada os obriga a isso”.

“O jornalismo é uma actividade sujeita a escrutínio público e legal, que começa na formação do profissional e se desenvolve, na tarimba, diariamente, com alto grau de exigência técnica e ética, devendo o jornalista profissional cumprir o Código Deontológico dos Jornalistas e agir dentro do quadro ético-legal previsto no Estatuto do Jornalista, consolidado na Lei 1/99, de 13 de Janeiro. O desrespeito pelas normas que regem a actividade está sujeito a um quadro sancionatório regulado na lei, além da responsabilização ética, hierárquica e até judicial (em alguns casos)”, prossegue o SJ.

Assim, “dentro do cumprimento do quadro ético-deontológico, o jornalismo é a marca de água que distingue informação de desinformação, o contraste que autentica os factos face às falsificações que o contexto das redes sociais promove, não obstante o esforço de algumas em conter a pandemia da desinformação”.

“O jornalismo tem um papel fundamental no Estado de Direito e o seu compromisso é com a (busca da) verdade. Por isso a Constituição assegura o direito dos jornalistas às fontes de informação e à protecção da sua independência. A independência é um valor fundamental do jornalista e primeiro garante da veracidade da informação que produz”, diz o Sindicato dos Jornalistas portugueses.

Conclui o SJ que, “posto isto, a Comissão da Carteira Profissional de Jornalista e o Sindicato dos Jornalistas condenam a usurpação do bom nome colectivo dos Jornalistas e apelam às autoridades competentes, nomeadamente à Procuradoria-Geral da República e à Entidade Reguladora para a Comunicação Social, que investiguem e fiscalizem as condutas e os grupos que promovam a desinformação”.

Este texto, divulgado pelo SJ de Portugal, deve merecer a atenção do Sindicato dos Jornalistas de Angola, bem como de todas as entidades ligadas ao sector, começando pelo Ministério das Telecomunicações, Tecnologias de Informação e Comunicação Social, já que por cá é comum as organizações oficiais confundirem a obra-prima do Mestre com a prima do mestre-de-obras.

De facto, tal como em Portugal, em Angola (ou a partir de Angola, ou tendo como fulcro Angola) existe uma enxurrada de meios que se auto-intitulam de comunicação social (TPA, TV Zimbo, por exemplo) e que mais não são do que bordéis onde o dinheiro compra tudo. Não é, aliás, difícil ver que são antros putrefactos de negócios que nada têm a ver com Jornalismo.

Basta ver, se alguém estiver preocupado com isso (no caso angolano o Sindicato dos Jornalistas, a ERCA – Entidade Reguladora da Comunicação Social Angolana e a CCE – Comissão de Carteira e Ética) que esses meios não têm – por exemplo – Ficha Técnica, nem Estatuto Editorial nem Código de Ética e Deontologia específico.

Folha 8 com Lusa

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