O líder da UNITA, Adalberto da Costa Júnior, o maior partido da oposição que o MPLA ainda permite (não se sabe por quanto tempo) em Angola, disse hoje que ainda não foi contactado para debater a questão do gradualismo, o principal impasse para aprovação da proposta de lei que institucionaliza as autarquias locais.
A discussão na especialidade da proposta de lei que institucionalizará um dia (quando o MPLA quiser) as autarquias locais sofreu “um interregno” para consulta das lideranças, como admitiu hoje o líder do grupo parlamentar do MPLA, Américo Cuononoca que agora, para não parecer estrangeiro, move influências para que digam que se escreve… “Kuononoka”.
“Não é novidade, a nossa grande divisão é a questão do gradualismo e a questão do gradualismo é uma posição que continuamos a defender, a necessidade da simultaneidade, não mudamos a este nível”, disse Adalberto da Costa Júnior, que falava hoje à rádio pública angolana, na qualidade de deputado à Assembleia Nacional. Segundo o líder da UNITA (estrangeiro, de acordo com os etílicos delírios do Bureau Político do MPLA) , “o diálogo é necessário, absolutamente indispensável”.
“Mas, infelizmente, não existe este tipo de abertura, pelo menos não chegou ao nível das lideranças, no que nos diz respeito, não houve qualquer contacto”, frisou.
O político salientou que a UNITA “tem vindo a pressionar permanentemente” sobre a “absoluta necessidade” de não se continuar a adiar esse debate, porque a lei em causa e o resto do pacote todo foram aprovados em Abril de 2019, na generalidade, o que “nada justifica que dois anos depois não tenha sido ultrapassada a questão”.
Convenhamos que a questão só será ultrapassada quando o MPLA tiver a certeza que arrasará a concorrência, o que parece ser uma possibilidade cada vez mais longínqua, a não ser que o Governo peça ajuda a Paulo de Almeida para usar os mísseis intercontinentais que, por determinação do ministro Eugénio Laborinho, estão a ser munidos com sensores de última geração que permitirão matar apenas estrangeiros, começando por todos os que pensem em votar na UNITA.
Por sua vez, o líder da bancada parlamentar do MPLA, partido no poder há 45 anos , disse que a proposta de lei já foi avançada para a discussão na especialidade, mas algumas divergências originaram um interregno nos debates.
“Parámos para consultarmos as nossas lideranças, mas o ponto já está agendado, com certeza que no próximo mês vamos arrancar com as discussões na especialidade, sem dúvida alguma”, afirmou.
De acordo com Américo Cuononoca, “as bancadas neste momento estão a consultar as direcções dos partidos, e depois de receberem as orientações vão tornar à especialidade” para a conclusão do pacote legislativo autárquico.
As primeiras eleições autárquicas em Angola, previstas pela última vez para 2020, não se realizaram, justificou o Governo, por falta de condições para a sua concretização, nomeadamente a pandemia da Covid-19 e a não conclusão da aprovação do pacote legislativo autárquico.
O modo de implementação das autarquias locais em Angola divide o MPLA, partidos políticos da oposição e organizações da sociedade civil, com o partido no poder a defender o gradualismo, ou seja, a votação apenas em alguns municípios a serem definidos pela Assembleia Nacional.
A UNITA defende a realização simultânea das autarquias nos 164 municípios que compõem o país.
Em Abril de 2019, por ocasião da aprovação, na generalidade, da proposta de lei sobre a institucionalização das autarquias locais, o então ministro da Administração do Território e Reforma do Estado de Angola, Adão de Almeida, reafirmou o gradualismo na implementação das autarquias no país, um processo que previa “lento, porém sólido”.
Adão de Almeida frisou que na Constituição da República de Angola a institucionalização das autarquias locais obedece ao princípio do gradualismo, salientando que a proposta legislativa “prevê que se procure abranger o máximo possível de realidades municipais”.
De acordo com o então titular da pasta da Administração do Território e Reforma do Estado, o artigo terceiro da proposta de lei contempla municípios pequenos e grandes, mais e menos populosos, com mais e com menos arrecadação de receita, os predominantemente urbanos e os predominantemente rurais, além de outros critérios.
Recorde-se que, em Setembro de 2020, os membros do Conselho da República de Angola consideraram, na sua maioria, que não havia condições para realizar as primeiras eleições autárquicas em Angola… “por falta de condições”.
Segundo a porta-voz da estrutura, Rosa Cruz e Silva, as eleições autárquicas angolanas serão realizadas no momento em que as condições para o efeito o permitirem. Até lá, como nos últimos 45 anos, o MPLA continuará a ser o dono do reino, e nem sequer se aplica o adágio “quem parte e reparte e não fica com a melhor parte, ou é tolo ou não tem arte.” De facto, o MPLA parte e reparte e fica… com tudo.
O documento saído da reunião extraordinária do Conselho da República realizada no dia 8 de Setembro passado para analisar o impacto da Covid-19 em Angola refere que devem continuar os trabalhos de preparação e organização das autarquias. Trabalhos que não precisam de ter pressa, pois têm à sua frente mais 55 anos, tempo que falta para o MPA atingir a glória divina de estar ininterruptamente no poder durante um século.
Por sua vez, o ministro da Administração do Território, Marcy Lopes, disse que o processo de preparação das eleições compreende um leque alargado de actos que devem ser harmonizados.
“Para que esse processo de implementação das autarquias locais ocorra efectivamente concorrem vários elementos: o primeiro foi denominado por pacote legislativo autárquico, foram aprovadas oito leis e existe depois uma outra componente que é a do registo eleitoral oficioso”, disse.
Marcy Lopes informou que na altura estava a ser feita a ligação (sempre sujeita aos caprichos da energia eléctrica… mesmo que “potável”) entre a base de dados de cidadãos maiores e a base de dados do bilhete de identidade, de modo a relacionar cada eleitor com uma determinada autarquia, no quadro do Plano Integrado de Intervenção nos Municípios (PIIM).
O governante apontou igualmente a formação de recursos humanos e o processo de desconcentração administrativa na lista de tarefas ainda por realizar. Tarefas, é claro, morosas e que demorarão anos a serem conseguidas. Daí a necessidade de mais 55 anos…
“Em termos globais existem várias tarefas que estão a ser implementadas pelo executivo”, referiu. Para Marcy Lopes, “será mais avisado ao invés de definir um timing, definir-se uma série de pressupostos para que este processo seja efectivamente concretizado”.
Cremos, contudo, que há uma solução simples e eficaz. Nas eleições de 2017, dos 164 municípios do país o MPLA ganhou em 156. Ora aí está. E nos 164 municípios só não ganhou 180 porque não quis. 180 se só existiam 164? Perguntarão os nossos leitores. Pois é. Mas se o MPLA já nos habituou a ter em determinados círculos eleitorais mais votos do que eleitores inscritos, se consegue até que os mortos votem no MPLA… Portanto, o problema seria solucionado com a atribuição de entre 164 e… 180 municípios ao MPLA.
“Ao invés de dizermos que daqui a dez meses vamos realizar autarquias locais, é mais prudente dizer que vamos dar continuidade ao processo de criação destas condições e tão logo estejam todas elas criadas, possam permitir que o Presidente da República convoque eleições”, disse.
Segundo Marcy Lopes, marcar uma data para a realização das eleições sem todas as leis aprovadas, corre-se o risco de “incorrer numa situação de incumprimento de um prazo que foi inicialmente estabelecido, sem se ter em conta que, por via das limitações existentes actualmente com a pandemia (Covid-19) e as limitações definidas pela cerca (sanitária), impedem que muitas destas tarefas sejam realizadas num espaço de tempo que seja adequado e expectável para todos”.
Na abertura da reunião, o Presidente João Lourenço considerou que, apesar de consensual a necessidade de se implantar o poder local autárquico, por via de suporte legal, a verdade é que não se conseguiu ainda realizá-las.
João Lourenço lembrou que em Março de 2018, numa reunião do Conselho da República, levantou a intenção de se realizar eleições autárquicas em 2020.
“Reconhecemos todo o esforço levado a cabo pela Assembleia Nacional na aprovação de parte do pacote legislativo autárquico, mas, sem que se aponte necessariamente culpados, convenhamos que nem tudo está feito, o trabalho não está ainda concluído”, disse.
Para João Lourenço, não é possível num Estado democrático e de direito (onde? onde?) realizar-se quaisquer tipos de eleições sem suporte legal. E isso é… muito bom.
Folha 8 com Lusa