Deputado do PS advoga a demolição do Padrão dos Descobrimentos, em Lisboa (ainda está a tempo). Ascenso Simões defende que as “revoluções servem para fazer cortes” e sugere que no 25 de Abril “devia ter havido sangue, devia ter havido mortos”. Será possível fazê-lo agora? O deputado que se cuide… (não é literal). Portugal não o fez, mas Angola (pelas mãos de Agostinho Neto, certamente um ídolo para o deputado) cumpriu esse desiderato com os massacres de 27 de Maio de 1977.
A propósito, ou não, desta paradigmática tese, reproduzimos o artigo “O deputado Ascenso Simões é mal pago?”, da autoria de Pedro Tadeu, publicado no Diário de Notícias em 24 de Abril de 2018:
«O deputado Ascenso Simões publicou no Facebook, onde se identifica, à inglesa, como “mp socialist party”, um recibo do seu vencimento relativo a este mês de Abril. Fui ver.
Notei, em primeiro lugar, aquilo que Ascenso Simões tapou: são três frases pintadas, a preto, com o mesmo rigor institucional aplicado por funcionários públicos obrigados a ceder à comunicação social documentos parcialmente em segredo de Estado.
Ascenso Simões escondeu da turba os dados bancários, a situação familiar que justifica a percentagem de retenção na fonte do IRS e o dia em que lhe pagaram o salário… E aqui a minha perplexidade despontou.
Que Ascenso Simões não queira o seu número de conta bancária a circular pela internet parece-me pretensão razoável e sensata.
Que declare no site da Assembleia da República que é casado, e com quem, mas não queira no Facebook divulgar essa informação nem se tem dependentes a cargo, parece-me, nesta partilha em rede social, uma tentativa de defesa da vida privada legítima mas com procedimento um pouco dúbio e eficácia muito pífia… .
Recusar divulgar o dia em que recebeu o salário, que torna público com estardalhaço, é que me parece um completo mistério… Porque raio não quer Ascenso Simões que se saiba o dia em que o Estado português lhe depositou no banco um total de 5614,55 euros? Porque acha problemático saber-se a data em que ADSE, IRS, grupo parlamentar do PS e Segurança Social repartiram 1892,27 euros de descontos feitos ao seu salário de Abril?… Que maluqueira!
Passei à análise das parcelas.
O salário do deputado, antes dos descontos, totaliza 5586,10 euros: 3624,41 são a “remuneração principal”, 1591,37 são “ajudas de custo” e 370,32 euros, lê-se no recibo, são “despesas de representação”. Ascenso Simões escreve que esta última alínea está errada, devia ser “exclusividade”… imagino que estes curtos 370 euros de complemento salarial não sirvam para seduzir quem pode ganhar muito mais somando alguns trabalhos “por fora” às remunerações auferidas pelos dias de discussão no Parlamento.
Estas quantias da “nota de abonos e descontos” referem-se à parte de salário que está sujeita a impostos, segurança social e outras contribuições e, por esta via, Ascenso Simões só levou para casa 3693,63 euros… Repare-se como este valor final é quase igual à “remuneração principal” identificada no recibo: que bela obra de arquitectura salarial!
Mas, anexada a esta folha, vem um “talão de abonos”. Aqui Ascenso Simões recebe dinheiro que não está sujeito a descontos, vai limpinho para o banco: 1371,60 euros relativos a deslocações da residência para a Assembleia (a casa, explica o deputado, fica a 400 km), 376,32 euros em deslocações pelo país em funções parlamentares e mais 172,80 euros em “trabalho político”. A soma dá 1920,72 euros. Este valor, adicionado ao valor líquido do salário, totaliza os 5614,55 euros finais… E, agora, repare-se como esta quantia é quase igual ao salário bruto do deputado: 5586,10 euros. O arquitecto desta obra remuneratória é mesmo genial!
É demasiado um deputado levar para casa 5600 euros? Não. Parece-me, atendendo à responsabilidade do cargo, ao simbolismo das funções, ao nível salarial praticado com quadros de topo de grandes empresas, um valor aceitável.
Acho mal é que nos “vendam” a ideia de que os deputados, coitadinhos, só ganham 3600 euros (o valor do salário-base que costuma ser apresentado como vencimento dos eleitos em São Bento) quando, na verdade, está arquitectada uma forma de receberem muito mais dinheiro.
Acho mal que se monte um esquema de pagamentos em deslocações de valor tão elevado, não sujeito a impostos, que é um péssimo exemplo para difundir no país uma cultura de respeito pelo Estado e pelos pagamentos fiscais.
Acho mal pagarem-se deslocações à residência (livres de impostos), uma vez que já se pagam ajudas de custo (sujeitas a impostos). Admitiria, porém, uma subida deste valor para quem mora nas ilhas ou no estrangeiro.
Acho mal que não se pague um salário-base de nove mil ou dez mil euros para que os deputados, obrigados ao regime de exclusividade, recebam, líquidos, cinco mil euros, depois de pagarem os devidos impostos e contribuições sociais.
Acho que para quem ganhe mais do que aquilo, não é profissional da política e é eleito deputado, se devia apurar um salário bruto semelhante ao que recebia antes de ser eleito.
Acho, sobretudo, que tudo o que penso pode estar errado mas que esta matéria devia ser discutida com decência e frontalidade.
Acho, ainda, patriótico e maravilhosamente anacrónico que o recibo das deslocações da AR ainda faça contas em escudos: o deputado Ascenso Simões, lê-se, recebeu mais de 385 contos para andar, um mês, pelo país. Viva Portugal!»