No final de Agosto, o Governo e o Presidente da República comemoraram o sucesso da operação de resgate de 116 afegãos que trabalharam com as forças portuguesas em Cabul (Afeganistão), mas, na realidade, os 4 militares destacados para a missão só conseguiram trazer menos de metade dos afegãos previstos e deixaram os mais vulneráveis para trás.
Em exclusivo ao programa Sexta às 9, hoje transmitido, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, assume uma contabilidade que nunca tinha sido tornada pública.
Portugal só trouxe 56 dos 116 afegãos que estavam na lista prioritária, que incluía grávidas e bebés de colo. A maioria ficou para trás. Sem autocarros, os mais vulneráveis não conseguiram chegar ao aeroporto e alguns ainda perderam os documentos.
Mas Augusto Santos Silva, ou não fosse um dos maiores peritos portugueses em mentir, recusa reconhecer o que é evidente – o fracasso da missão.
O ministro dos Negócios Estrangeiros garante que Portugal não desistiu de ninguém e assegura que emitirá cartas-convite para dar lugar ao acolhimento dos afegãos que estavam na lista portuguesa e que ainda permanecem no Afeganistão. Mas, neste momento, não há nenhum plano de evacuação.
Os últimos emails das autoridades portuguesas para estes afegãos foram enviados a 4 de Setembro. O desespero aumenta à medida que os talibãs insistem em procurar, porta a porta, todos os que colaboraram com as forças internacionais.
O Sexta às 9 investigou o caso e traçou a anatomia da missão portuguesa em Cabul e as consequências na vida dos afegãos que foram abandonados e também dos que conseguiram embarcar, mas foram separados da família no aeroporto de Cabul.
Recorde-se, recorrendo ao jornal português Público que o ministro da Defesa, João Gomes Cravinho (o tal que disse que Jonas Savimbi foi um Hitler africano), diz que a missão Portuguesa em Cabul foi um sucesso. “Portugal sai de cabeça erguida”, disse por sua vez o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa.
“Muito obrigado”, começou por sublinhar João Gomes Cravinho, na recepção aos militares portugueses, elogiando o trabalho das forças portuguesas. “Ao longo de quase 20 anos, Portugal desenvolveu dívidas de cidadãos afegãos que trabalharam e apoiaram as nossas forças nacionais destacadas”, explicou o ministro da Defesa. “Esta força nacional, com quatro homens apenas, foi a Cabul cumprir essa dívida de gratidão”, destacou.
“Foi uma missão plenamente sucedida”, repetiu o Presidente, Marcelo Rebelo de Sousa, elogiando os esforços das forças portuguesas. “Portugal sai de cabeça erguida”, salientou o líder português, notando que a viagem a Cabul representou o “cumprimento de um princípio moral”. “Quem esteve connosco [no Afeganistão] merecia que nós estivéssemos com eles e elas na situação mais difícil das suas vidas”, explicou Marcelo Rebelo de Sousa. “Isto são as forças armadas portuguesas. Isto é Portugal”, concluiu.
João Gomes Cravinho é um perito de longa tradição socialista e certamente merecedor de um doutoramento “honoris causa” pelo MPLA. Por alguma razão este figurão comparou, em Novembro de 2005, em entrevista ao Expresso, Jonas Savimbi (que tinha morrido três anos antes) a Hitler.
Em tempos, a Comissão de Negócios Estrangeiros do Parlamento português quis ouvir o então secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação (João Gomes Cravinho) sobre a situação na Guiné-Bissau. Na altura, o caso do ex-chefe da Armada guineense, Bubo Na Tchuto, foi é revelador do que Portugal (não) pensa sobre a Guiné-Bissau.
Em Janeiro de 2010, quando oficialmente Bubo Na Tchuto era procurado pela justiça e se tinha refugiado na sede da ONU em Bissau, João Gomes Cravinho disse que o caso veio “expor completamente a fragilidade das instituições” guineenses.
Basta ler (se alguém tiver paciência para isso) o que Gomes Cravinho disse uma vez, nem que seja há um par de anos, para se saber que sempre que fala da Guiné-Bissau usa as mesmas ideias, os mesmos argumentos, a mesma teoria e, é claro, a mesma passividade.
O então secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação de Portugal só altera os nomes dos protagonistas. Na altura foi Bubo Na Tchuto, tal como já foram, entre outros, Hélder Proença, Baciro Dabó, Tagmé Na Waié e João Bernardo “Nino” Vieira.
E por falar em Gomes Cravinho, recordam-se que ele afirmou no dia 4 de Dezembro de 2007 que a União Europeia devia libertar-se da “bagagem colonial” na relação com África, reconhecendo que o continente “é hoje um igual” com “progressos notáveis” nos últimos anos?
E por falar em Gomes Cravinho, é de crer que um dia destes irá dizer que “Nino” Vieira foi outro Hitler africano. Isto porque o então secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação de Portugal, hoje ministro da Defesa, tem coragem suficiente para fazer destas afirmações sobre pessoas depois de eles terem morrido. Sobre os vivos, por muito mais que eles se assemelhem a Hitler, Cravinho apenas sabe estar calado.
No dia 18 de Janeiro de 2010, João Gomes Cravinho afirmou que o Governo português acompanhava com a «atenção normal» a situação na “província” de Cabinda, defendendo que o importante era a detenção de responsáveis de ataques criminosos.
Não estava nada mal. Até parece que, para os donos do reino lusitano, falar de Cabinda ou de Zoundwéogo é exactamente a mesma coisa. Lisboa esqueceu-se, continua a esquecer-se, que os cabindas, tal como os angolanos, não têm culpa que as autoridades portugueses (grande parte delas do Partido Socialista) tenham, em 1975, varrido a porcaria para debaixo do tapete.
Quando interrogado sobre se o Governo português considerava preocupantes as notícias de detenções de figuras alegadamente ligadas ao movimento independentista na província de Cabinda, João Gomes Cravinho – hoje, corrobore-se, ministro da Defesa -afirmou que «preocupante é quando há instabilidade e violência, como aconteceu com o ataque ao autocarro da equipa do Togo» a 8 de Janeiro de 2010.
Sim, é isso aí. Portanto, o MPLA pode prender quem muito bem quiser (e quer, continua a querer, todos aqueles que pensam de maneira diferente) que terá, como é óbvio, o apoio e a solidariedade das autoridades portuguesas.
Tal como fez em relação a Jonas Savimbi depois de este ter morrido, Gomes Cravinho não tardará (provavelmente só está à espera que eles morram) a chamar Hitler, entre outros, a Raul Tati, Francisco Luemba, Belchior Lanso Tati, Jorge Casimiro Congo, Agostinho Chicaia, Martinho Nombo ou Marcos Mavungo. Já o pode dizer, infelizmente, sobre Raul Danda.
João Gomes Cravinho explicou na altura que, «em relação ao mais» Lisboa acompanha o que se passa «pelas vias normais», isto é, pela comunicação social e pelos relatos feitos pela embaixada portuguesa.
Ou seja, Portugal está-se nas tintas. E quando Cravinho diz que Lisboa acompanha o que se passa pelos relatos feitos pela embaixada portuguesa estava a esquecer-se que a embaixada lusa se limitava, como se limita hoje, a ampliar a versão oficial do regime angolano.
Como se já não bastasse a bajulação de Lisboa ao regime angolano, ainda temos de assistir à constante passagem de atestados de menoridade e estupidez aos portugueses por parte de alguém que, depois do desastroso papel como secretário de Estado, chega a ministro da Defesa.
Folha 8 com RTP e Público