Governo impotável e inimputável

A Empresa Pública de Águas de Luanda (EPAL) vai instalar, provisoriamente, pontos colectivos de água para os moradores do bairro São João, após a divulgação da escassez de água naquela zona do município do Cazenga. Em Angola, com excepção do Governo do MPLA (lixeiras, malária, fome, pobres, desemprego, corrupção), tudo é provisório… até mesmo os angolanos.

Em nota de esclarecimento, datada de 25 de Junho, a empresa diz que tomou conhecimento pela comunicação social (não afecta a marimbondos e caranguejos) da matéria sobre a situação daqueles moradores a “retirarem água de uma tubagem na via pública”.

Segundo a EPAL, trata-se de uma “rotura provocada pelos moradores através de uma antiga tubagem de água”, que se transformou “num ponto de abastecimento de água de alguns moradores da zona”.

A empresa pública afirma que o bairro São João “foi contemplado no projecto de ligações domiciliares, mas por insuficiência do volume de água no Centro de Distribuição de Água do Cazenga, apenas uma parte do bairro recebe água em dias alternados”.

O bairro São João faz parte do distrito urbano do Hoji-ya-Henda, município do Cazenga, um dos mais populosos da capital angolana.

Crianças, jovens e adultos lutam numa tubagem pública na berma da estrada, por eles danificada, para conseguir água que, há semanas, não jorra naquela circunscrição do município do Cazenga.

Vários bairros, distritos e municípios de Luanda enfrentam a escassez de água potável e a alternativa, para muitos, tem sido percorrer longas distâncias com recipientes à cabeça em busca da água.

Entre disputas e acesas discussões e mesmo expostas ao perigo de atropelamento, por esta estar à berma da estrada Porto Santo, mulheres, homens e crianças daí não arredavam o pé.

“Estamos há muitos anos sem água aqui no bairro, sou residente do bairro, cresci aqui e é complicado. Esta confusão vem porque não há colaboração”, contou Ana Adriano.

A moradora do bairro São João lamentou a falta de água na circunscrição, que dura há semanas, e assumiu que os moradores “decidiram destruir a tubagem principal”, escavada a dois metros de profundidade.

A carência de água naquela localidade foi igualmente descrita e deplorada por outros moradores que pediram a “intervenção urgente das autoridades”, temendo, sobretudo, pela propagação da Covid-19 por “falta de uma regular higienização”.

Um processo de “reforço do abastecimento de água”, iniciou-se em Fevereiro de 2020, refere a EPAL, garantindo que o mesmo “melhorou substancialmente o abastecimento de água em parte do bairro”.

“Face a esta situação, a EPAL vai instalar, provisoriamente, pontos colectivos para servir a população da referida zona, enquanto decorrem os trabalhos para levar água às residências em falta”, lê-se na nota.

O Governo angolano, adianta a empresa pública, “gizou vários projectos estruturantes para a melhoria do abastecimento de água potável à província de Luanda, em particular o projecto de construção da terceira fase da Estação de Tratamento de Água de Candelabro”.

O referido projecto, “que vai beneficiar o município do Cazenga”, assegura a EPAL, tem conclusão prevista para Dezembro próximo, sublinha ainda o documento assinado por Albertina Baptista, directora de Comunicação e Marketing da EPAL.

MPLA é que sabe o que é ou não potável

Em 2018, cerca de metade dos agregados familiares (47%) angolanos não tinham acesso a fontes de água potável e muitas crianças passam horas a caminhar diariamente para aceder a esse líquido. Quem o disse na altura foi a UNICEF. Quem reafirma que hoje está tudo na mesma… ou pior somos nós.

Segundo o ministro angolano da Energia e Água, João Baptista Borges, cerca de 60% da população em Angola, estimada em mais de 28 milhões de habitantes, tem acesso a água potável. A potabilidade da água é variável de acordo com as ordens superiores do MPLA que, aliás, já tentou institucionalizar também a electricidade… potável.

João Baptista Borges disse, em 2018, à margem do 8º Fórum Mundial da Água que decorreu no Brasil, que a principal preocupação do Executivo é aumentar a taxa de acesso nas zonas urbanas, que deverá atingir 85%, nos próximos cinco anos. Para a população das zonas rurais, a meta é atingir uma taxa de 80%, segundo o ministro.

Um comunicado emitido em 21 de Março de 2018 pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) em alusão ao Dia Mundial da Água, referia que devido à falta de fontes de água potável muitas crianças não têm oportunidade de ir à escola.

Segundo a UNICEF, “esta jornada pode ser perigosa”, tendo em conta que os utensílios utilizados para acarretar água pelas crianças podem pesar, geralmente, cerca de 20 quilos.

“Para algumas, essa rotina diária para colectar água pode consumir as suas vidas. Elas temem ataques e temem caminhar longas distâncias, e perdem a oportunidade de ir à escola ou de brincar com os amigos”, lê-se no comunicado.

Em tempos de crise e de instabilidade, a UNICEF fornece o acesso à água potável, saneamento e higiene para crianças em todo o mundo, mesmo nos locais de difícil acesso, sublinha o documento.

Em 2017 a UNICEF forneceu água potável a perto de 30 milhões de pessoas em emergências humanitárias, 284.184 das quais se encontravam em Angola.

“Pelo menos 263 milhões de pessoas no mundo levam mais de 30 minutos para ir e voltar para colectar água. Em Angola, isso ocorre com 19% dos agregados em áreas urbanas e 43% dos agregados em áreas rurais, dentre aqueles sem acesso à água para beber dentro de casa”, salienta.

No entanto, a UNICEF realça que houve uma evolução no acesso à água dos agregados familiares em Angola entre 2015-2016 comparativamente a 2008-2009, aumentando 12 pontos percentuais (42% para 54%), crescimento que se registou sobretudo nas áreas urbanas.

Na Lusofonia somos (é claro!) os piores

Angola é, dos nove Estados lusófonos, o país com menor acesso a água potável “per capita”, em que apenas 44% da população a obtém facilmente, com Portugal (100%) e Brasil (97%) no pólo oposto. No que ao reino do MPLA respeita, tudo normal. Porque carga de chuva os 20 milhões de pobres precisarão de água potável? Não lhes basta terem acesso gratuito a comida… nas lixeiras acessíveis a todos os angolanos de segunda?

Num relatório do Programa Conjunto de Monitorização das Nações Unidas, elaborado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e pela Organização Mundial de Saúde (OMS), são analisadas as situações da água potável, saneamento e higiene em mais de 200 países e territórios.

O documento faz a comparação entre a evolução registada em cada um dos nove países lusófonos – Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste –, tendo também em conta o respectivo aumento da população.

No quadro desta análise é referido também o aumento da população nas zonas urbanas, o acesso a água que dista mais de 30 minutos do local de residência, água não melhorada e água proveniente da superfície, como rios e lagos, entre outras fontes.

No acesso a água potável canalizada, Cabo Verde surge em terceiro lugar entre os lusófonos (subiu de 78% para 86%), à frente de São Tomé e Príncipe (de 67% para 80%), Timor-Leste (não havia dados disponíveis anteriores mas tem agora 0%), Guiné-Bissau (de 53% para 69%) e Moçambique (de 22% para 47%). Angola subiu de 38% para 41%, enquanto o Brasil passou dos 94% para 97% e Portugal de 99% para 100%.

O relatório sublinha que os dados são susceptíveis de alguma “relatividade”, tendo em conta o tamanho dos países, o total da população e o grau de desenvolvimento de cada um deles.

À excepção de Portugal e do Brasil, todos os restantes países lusófonos, em maior ou menor escala, ainda têm bolsas da população que só conseguem obter água a mais de 30 minutos do local de residência.

O estudo dá ainda conta da relação entre os dados estatísticos e a evolução da população urbana nos nove Estados lusófonos, sempre em crescendo, com o Brasil a “liderar” esta tabela, com os habitantes citadinos a subirem, em 15 anos, de 81% para 86%.

Cabo Verde é o segundo país lusófono com maior crescimento da população urbana (aumentou de 53% para 66%), seguido por São Tomé e Príncipe (de 53% para 65%), Portugal (de 56% para 63%), Guiné-Bissau (de 37% para 49%), Angola (de 32% para 44%), Guiné Equatorial (de 39% para 40%), Timor-Leste (de 24% para 33%) e Moçambique (de 29% para 32%).

Folha 8 com Lusa

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